ELITE DE ASSASSINOS (1975)
Filmes Legais

ELITE DE ASSASSINOS (1975)



(ATENÇÃO: Esta resenha tem SPOILERS!)

O norte-americano Sam Peckinpah não foi somente um dos melhores cineastas da história do cinema norte-americano, mas também um dos mais problemáticos. Brigava com atores, com produtores, com roteiristas, com colaboradores de longa data, e tudo isso enquanto filmava cenas fantásticas de ação e violência com olho clínico, entre doses cavalares de uísque ou vodka (além de tudo, era um alcoólatra irrecuperável, que morreu por complicações decorrentes do excesso de bebida).

Provavelmente, Peckinpah não foi o primeiro diretor a usar o recurso da câmera lenta para alongar as cenas de ação e dramatizar as cenas de mortes durante tiroteios. Mas, com certeza, foi um dos que melhor utilizou esta técnica, inspirando cineastas tão diferentes quanto Enzo G. Castellari e John Woo.

ELITE DE ASSASSINOS é um dos filmes menos conhecidos do mestre. Diz a lenda, inclusive, que o próprio diretor não gostava muito da obra, que continua inédita no Brasil, tanto em vídeo quanto em DVD. É aquele tipo de produção que você até sabia que existia, mas, nos tempos pré-internet, não tinha como assistir. Felizmente, para corrigir esta injustiça, o canal de TV por assinatura Telecine Cult andou reprisando o filme há alguns meses, e finalmente pude conferir este obscuro trabalho de um dos meus cineastas preferidos. O resultado: diferente do que eu esperava, mas ainda assim muito acima da média atual.

Bem, para começo de conversa, este é o "filme de ninjas" do Peckinpah. Na época, produções de artes marciais estavam em alta. ELITE DE ASSASSINOS foi feito em 1975, dois anos depois do estrondoso sucesso de bilheteria de "Operação Dragão" (estrelado por Bruce Lee), e um ano depois de um dos grandes clássicos de Peckinpah, o autoral e cruel "Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia (outra maravilha que injustamente continua inédita nas locadoras brasileiras).

Com um roteiro de artes marciais nas mãos, escrito por Marc Norman e Stirling Silliphant - a partir do livro de Robert Rostand -, Peckinpah buscou inspiração, veja só, nos próprios filmes de Bruce Lee para entrar no clima da coisa, conforme confessou em uma entrevista da época.

Porém, mais que um "filme de ninjas", ELITE DE ASSASSINOS é a tradicional história de vingança resolvida à moda antiga, história essa que o diretor adorava contar. E está centrada no relacionamento entre dois amigos de longa data e "colegas de trabalho", Mike Locken (James Caan, excelente) e George Hansen (Robert Duvall, roubando a cena sempre que aparece). Eles são espiões-mercenários que atuam para a "elite de assassinos" do título: um grupo de agentes contratados para fazer trabalhos sujos por dinheiro, principalmente para a CIA. O início do filme mostra a dupla explodindo um prédio - literalmente, já que Peckinpah filmou a detonação real de um antigo quartel do Corpo de Bombeiros de San Francisco!

Chumbo grosso e carros a mil



A próxima missão da dupla é proteger uma importante testemunha para o governo, mas é aí que Hansen se revela um traidor (provavelmente contratado por alguém que pagou mais que o atual empregador). Após explodir os miolos da testemunha, o vira-casaca atira num joelho e num cotovelo de Locken, deixando-o aleijado. Enquanto passa por cirurgias no hospital, o herói descobre que perdeu o "emprego", já que sua recuperação jamais será 100% e ninguém irá contratar um inválido para missões perigosas como as que ele realizava.

Assim, enquanto se envolve com sua enfermeira, Locken inicia uma lenta e sofrida recuperação, mostrada sem economizar tempo pela câmera do diretor - o que dá uma bela idéia do esforço hercúleo que o ex-agente precisa fazer para recuperar um mínimo da agilidade, ao contrário daqueles filmes absurdos em que os heróis se recuperam de qualquer lesão em tempo recorde.

Quando já está afiado para voltar à ativa, inclusive improvisando o uso da bengala como arma em lutas corpo a corpo, Locken é chamado para chefiar um grupo de mercenários e proteger a vida de Yuen Cheung (Mako), um rico empresário oriental que está nos EUA porque foi jurado de morte pelo vilanesco Negato Toku (Tak Kubota), líder de uma quadrilha de ninjas. Claro que a missão tem um toque pessoal: o traíra Hansen foi o assassino contratado por Toku para dar um fim em Cheung em território norte-americano, e assim Locken pode unir a satisfação da volta ao trabalho com a busca pela sua vingança pessoal.

Nestes tempos de "geração ecstasy", em que filmes de ação precisam ter um milhão de cortes por segundo e obrigatoriamente deixar o espectador com dor de cabeça no final, é sempre um alívio ver uma velha história de vingança à moda antiga, sem movimentos acrobáticos de câmera ou exageros digitais. ELITE DE ASSASSINOS é um filme lento, que não tem pressa nem queima cartuchos simplesmente pulando de uma cena de ação para outra (artifício usado pelos roteiristas que não têm história para contar). A maior parte da trama é centrada em Locken e na sua recuperação, e não na pancadaria ou nos tiroteios.

Para quem espera o velho duelo ao pôr-do-sol entre herói e vilão, o roteiro ainda revela uma surpresa incrível, que para alguns poderá soar como toque de gênio: no começo do ato final, o vilanesco Hansen é morto sem alarde nem emoção por um dos homens de Locken, e não pelo próprio herói, que fica, assim, privado de sua tão sonhada vingança pessoal - e é evidente a decepção do pobre coitado ao ver o arquiinimigo morto por outras mãos que não as suas.

Por isso, quando chega o duelo final e os ninjas finalmente entram em cena, o filme já perdeu boa parte de sua força, já que não veremos o prometido embate entre Locken e Hansen. Um contra-clichê corajoso, mas que de certa maneira também é uma armadilha, pois faz com que o espectador perca um pouco do interesse pelo filme. Até porque o cinema de ação nos acostumou, desde os primórdios, a esperar pelo velho duelo final entre bonzinho e malvado...

Metralhadoras contra ninjas!



E se o jogo de gato-e-rato entre Caan e Duvall, dois excelentes atores da velha guarda, já não fosse motivo mais do que suficiente para eu recomendar o filme, ELITE DE ASSASSINOS ainda tem Burt Young interpretando Burt Young (e ele sabe fazer outro papel?) e um jovem Bo Hopkins como atirador psicopata. E é no final que a coisa realmente fica maluca, com ninjas atacando os "heróis à moda antiga" com espadas em punho, apenas para serem implacavelmente abatidos com impiedosos tiros de Uzi dos mercenários - que não têm um pingo da "honra" dos guerreiros orientais!

Percebe-se que Peckinpah está mais contido - mais convencional, até - do que de costume. Isso tem explicação: ele foi contratado por Mike Medavoy, um dos manda-chuvas da United Artists na época. Medavoy leu o roteiro e achou que o velho Sam era a melhor escolha para levá-lo às telas, mas sabia que nenhum estúdio aceitaria trabalhar com o encrenqueiro diretor, àquela altura já totalmente queimado em Hollywood. Mas Medavoy foi teimoso: convenceu os produtores de que Peckinpah ficaria sob sua rigorosa supervisão e não aprontaria durante as filmagens. E assim aconteceu.

Com exceção de "Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia", praticamente todas as obras do diretor sofreram nas mãos dos produtores e dos estúdios, que cortavam e reeditavam seus trabalhos à revelia, ou lhe negavam mais dinheiro quando ele estourava o cronograma de filmagens. ELITE DE ASSASSINOS não fugiu à regra: o estúdio resolveu abrandar a violência para ganhar uma censura menor nos cinemas, e as cenas cortadas foram perdidas. O DVD lançado nos EUA traz esta mesma versão censurada que foi exibida pelo Telecine Cult. Uma pena.

ELITE DE ASSASSINOS é especialmente divertido e interessante porque vai na contramão de tudo que o espectador espera quando o filme começa. Não temos o duelo climático entre herói e vilão, não temos um herói que recebe uma lição de vida após vencer a situação de quase invalidez, e nem ao menos tempos grandes lances de kung-fu. O que parece é que Peckinpah está tirando onda com o sucesso que os filmes de ação de Hong-Kong faziam na época, principalmente quando os ninjas tentam lutar ao se estilo e são mortos sem piedade com tiros de metralhadora. E os heróis ainda fazem graça dos pobres ninjas: "O que são essas roupas? Mas que coisas mais ridículas!".

Longe de ser um grande filme, ELITE DE ASSASSINOS pode ser considerado uma síntese de temas que Sam Peckinpah adorava abordar em seus trabalhos, como os heróis ultrapassados que preferem resolver as coisas à moda antiga (para quê aprender artes marciais se é só dar tiros nos ninjas?), e a amizade e relação de respeito entre herói e vilão, mesmo que estejam em lados diferentes do conflito.

Quando Locken, no hospital, pergunta a si mesmo porque Hansen não lhe deu um terceiro tiro na cabeça, ao invés de apenas deixá-lo aleijado, no seu íntimo ele sabe a resposta, e o espectador também: porque no fundo eles são e continuam amigos. E é esse tipo de riqueza na construção de personagens e conflitos que infelizmente não se vê mais no cinema moderno...

Trailer de ELITE DE ASSASSINOS



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The Killer Elite (1975, EUA)
Direção: Sam Peckinpah
Elenco: James Caan, Robert Duvall, Arthur Hill,
Bo Hopkins, Mako, Burt Young, Gig Young, Tom
Clancy, Tak Kubota e Sondra Blake.



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