Eu nunca curti muito o Superman como personagem de quadrinhos (ele é certinho, bonzinho e perfeito demais), mas confesso que gosto das adaptações do personagem para o cinema feitas entre as décadas de 70-80. Menos, claro, aquela pavorosa produção feita a toque de caixa pela Cannon, "Superman 4 - Em Busca da Paz" (1987), que matou o personagem no cinema (estrago que nem Bryan Singer conseguiu corrigir naquele pavoroso "Superman Returns"). "Superman 3" (1983) também não é lá essas coisas, mas pra mim é cult movie, acho que pelo clima trash que domina o filme do começo ao fim.
Foi, portanto, com muita curiosidade que li sobre um projeto de 2006 chamado SUPERMAN REDEEMED (em bom português, "Superman Redimido"; ou, se preferir, "Superman - A Redenção"). Algum fã dos mesmos filmes do Superman dos anos 70-80 resolveu que iria tentar amenizar a ruindade de "Superman 3" e "Superman 4", utilizando as maravilhas da tecnologia moderna para ripar os DVDs das duas seqüências e editar as (poucas) cenas boas, mandando direto pra lixeira as (muitas) bobagens destes dois filmes.
Para resolver alguns problemas aqui e ali, o paciente e criativo sujeito pegou também umas partes de "Superman 2" (1980), inclusive uma das cenas excluídas deste filme filmadas por Richard Donner, que mostrava uma criativa fuga de Luthor da cadeia. E assim, resumindo dois filmes que duravam 3h30min para míseros 90 minutos, criou este fan film chamado SUPERMAN REDEEMED. Alguém bem que podia fazer um fan film de no máximo duas horas editando os três novos (e intragáveis) "Star Wars" dirigidos por George Lucas, né?
E não é que funciona? O tal fã (que assina a "reedição" com o pseudônimo "A Digital Man", talvez para escapar de problemas com direitos autorais) apagou sem dó nem piedade tudo o que não funcionava nos dois filmes e deixou somente as cenas boas ou razoáveis, milagrosamente fazendo com que as duas tramas completamente diferentes (Superman enfrenta supercomputador em "Superman 3" e o Homem Nuclear em "Superman 4") conseguissem ficar razoavelmente interessantes quando resumidas em 1h30min.
Claro que ainda está longe da perfeição, e ainda tem algumas coisas sobrando, mas SUPERMAN REDEEMED com certeza é bem melhor que os dois filmes supracitados vistos separadamente. O sujeito fez até uma capinha para a sua versão, onde colocou "Você vai acreditar que uma lenda possa ser salva", ironizando a clássica frase "Você vai acreditar que um homem possa voar", que estava no cartaz da primeira aventura do herói.
Primeiro, vamos aos cortes: A Digital Man excluiu (bendito seja!!!) TODAS as cenas com Richard Pryor interpretando Gus Gorman em "Superman 3" e sumiu com qualquer vestígio do "novo vilão" Ross Webster (Robert Vaughn), aquele almofadinha sem graça que substituía Lex Luthor de forma desastrosa no terceiro filme. Nem sinal de supercomputador no fan film também: as únicas cenas que o "re-editor" aproveitou desta seqüência foram a da subtrama mostrando o retorno de Superman/Clark Kent para Smallville e seu reencontro com o amor da juventude, Lana Lang (Annette O'Toole), personagem que sumiu misteriosamente em "Superman 4".
Superman vs. Clark Kent
Também foi aproveitada a clássica cena em que o Superman Malvado (efeito colateral de uma nova forma de kriptonita criada pelo supercomputador) lutava contra seu alter ego, Clark Kent, num ferro-velho - provavelmente a melhor parte do terceiro filme. E outros pequenos pedacinhos aqui e ali.
De "Superman 4", SUPERMAN REDEEMED aproveita parte da trama do garotinho que escreve para o Superman pedindo o desarmamento e todo o lance da criação do Homem Nuclear (Mark Pillow, em seu único filme) por Lex Luthor.
Em compensação, o fan film deleta toda aquela bobajada de o jornal Planeta Diário ter sido adquirido por novos proprietários (entre eles Lacy Warfield, interpretada por Mariel Hemingway, que foi totalmente apagada na nova edição) e reduz ao mínimo a participação do intragável sobrinho de Luthor, Lenny Luthor (Jon Cryer), que na edição original era uma espécie de Jar Jar Binks ainda mais insuportável, sempre fazendo piadinhas sem graça com o seu tio - outra invenção de roteiristas idiotas que não sabem o que fazer com personagens de quadrinhos.
Na ordem da nova edição, a história fica mais ou menos assim: após aqueles créditos tradicionais com os nomes dos atores voando no espaço, ao som da inesquecível trilha de John Williams, e do aviso de que este é um fan film feito a partir de "dois filmes imperfeitos", SUPERMAN REDEEMED mostra Clark Kent convencendo Perry White (Jackie Cooper), seu chefe no Planeta Diário, a liberá-lo para fazer uma reportagem sobre o encontro de ex-alunos do colégio de Smallville.
Ele segue para sua cidade-natal acompanhado do fotógrafo Jimmy Olsen (Marc McClure), salva a cidade de um incêndio num laboratório químico no caminho e finalmente chega ao tal baile, onde reencontra a ex-amada Lana. Todas estas cenas são de "Superman 3".
Paralelamente, reencontramos Ottis (Ned Beatty), que originalmente não apareceu nas partes 3 e 4, mas retorna numa das cenas excluídas de "Superman 2" dirigidas por Richard Donner. Esta parte mostra Luthor fugindo da cadeia, auxiliado pela srta. Teschmacher (Valerie Perrine), e deixando o pobre gordinho para trás.
Em seguida, aliado ao sobrinho Lenny (a srta. Teschmacher infelizmente desaparece da edição, já que não havia cenas dela em "Superman 4"...), Luthor rouba um fio de cabelo do Superman do museu de Metrópolis, e usa o material genético do cabelo para criar um clone do Superman (todas estas cenas são do quarto filme).
Superman vs. Homem Nuclear
Quando volta de Smalville, Clark descobre que há uma ameaça terrorista na Torre Eiffel, e que sua amada Lois Lane (Margot Kidder) foi escalada para cobrir o evento, e está em apuros. Ele resolve o problema arrancando o elevador da torre em que está a bomba e lançando o dito cujo no espaço, em cenas de "Superman 2".
O atentado inicia um debate sobre o perigo das armas nucleares, quando voltam as cenas de "Superman 4", mostrando o garoto Jeremy (Damian McLawhorn) escrevendo para o Superman e pedindo sua ajuda para deter a ameaça de uma guerra atômica. O herói começa, então, uma cruzada contra a corrida armamentista, "roubando" ogivas nucleares dos Estados Unidos e da (extinta) União Soviética para explodi-las no núcleo do Sol.
Só que um destes mísseis tem o material genético do Superman, alterado por Luthor. Ao ser arremessado contra o Sol, ele dá origem ao terrível Homem Nuclear (com uma roupinha digna de Parada Gay), um "super-capanga" que Luthor usa contra o herói. Até então, continuam as cenas mais razoáveis de "Superman 4" (pelo menos a maior parte do CGI bagaceiro e dos efeitos toscos da Cannon foram apagados desta versão), até que o Homem Nuclear fere Superman no pescoço.
Então, aparentemente em virtude do ferimento, o herói fica malvado (quando voltam as cenas de "Superman 3"), fazendo coisas "horríveis" como desentortar a Torre de Pisa e apagar a tocha olímpica. O conflito interior do herói acaba na clássica luta de Superman versus Superman no ferro velho, e então voltam as cenas de "Superman 4" para mostrar o duelo final com o Homem Nuclear.
SUPERMAN REDEEMED faz um favor ao espectador ao poupá-lo de rever personagens insuportáveis como Gus Gorman e Lenny Luthor e ao eliminar a maioria das cenas de ação chinfrins de "Superman 3" e "Superman 4" (tipo o herói contra os mísseis no terceiro filme e salvando a menina de um tornado no quarto).
Cenas pavorosas como a do supercomputador transformando uma perua em robô sem mais nem menos, em "Superman 3", ou o Homem Nuclear levando Lacy para um passeio sem proteção no espaço em "Superman 4" (sem que a moça percebesse qualquer sinal de falta no vácuo) também foram direto para a lixeira.
Tiveram o bom senso de apagar ISSO!
O novo editor também demonstra um sensível e elogiável respeito à série, coisa de fã mesmo, ao resgatar personagens que os produtores destas duas seqüências excluíram sem qualquer explicação (Luthor do terceiro filme, Ottis e srta. Teschmacher de ambos); teve espaço até para um "off" de Marlon Brando, como o pai do Superman, em uma das cenas.
Enfim, o tal do "Digital Man" passou a borracha no que não prestava e deixou o que dava para engolir, criando uma trama razoavelmente coerente e, quem diria, divertida. Ficou algum furinho aqui e ali, e em diversos momentos parece mais uma colcha de retalhos de "melhores momentos" do que um filme propriamente dito, mas ainda assim é melhor que "Superman 3" e "Superman 4". Não que isso queira dizer alguma coisa...
Muitas vezes eu vi filmes que me deixaram pensando em como eu faria diferente, ou como mudaria alguma coisinha que não funcionava bem. Esta é a graça destes fan films: ver que existem, no mundo, sujeitos que pensam como você, mas são desocupados e dominam as ferramentas de edição de vídeos para criar uma nova edição apagando o que consideram errado na primeira.
E é por isso que eu gostaria muito de ver alguém "corrigindo" os novos "Star Wars", apagando o personagem chato de Samuel L. Jackson em "Duro de Matar - A Vingança", mesclando cenas boas de vários filmes razoáveis do James Bond numa aventura única ou ainda transformando metade das seqüências de "Sexta-feira 13" num filme só.
ão apenas alguns exemplos do que o universo dos fan filmes permitem, e aí está SUPERMAN REDEEMED para comprovar que esse tipo de brincadeira pode resultar num passatempo divertido - e, ironicamente, muito melhor que o "produto oficial".
*************************************************************** Superman Redeemed (1983/1987/2006, EUA) Direção: Richard Lester e Sidney J. Furie Reedição: A Digital Man Elenco: Christopher Reeve, Gene Hackman, Margot Kidder, Annette O'Toole, Jon Cryer, Jackie Cooper e Marc McClure.
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