FORÇA ESPECIAL (2003)
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FORÇA ESPECIAL (2003)



Até o começo deste nosso século 21, o cineasta israelense Isaac Florentine era apenas "o cara que dirigia episódios dos Power Rangers". Tudo bem, ele já estava no mercado do cinema há algum tempo, tendo atuado como coreógrafo de cenas de luta em filmes como "American Cyborg - O Exterminador de Aço", e como diretor de aventuras com astros do segundo escalão, de Oliver Gruner e Gary Daniels a Dolph Lundgren.

Mas ainda não era considerado um sinônimo de ação barata e de qualidade, como é hoje; nem tinha um séquito tão grande de admiradores.


Dois filmes marcaram o ponto de virada na carreira de Florentine: "U.S. Seals 2", de 2001, e "Special Forces", de 2003, lançado no Brasil como FORÇA ESPECIAL, ambos produzidos pela barateira Nu Image. Vendo esses filmes, fica fácil de entender porque Isaac Florentine é, hoje, um dos nomes mais respeitados do cinema de ação independente.

Tanto "U.S. Seals 2" quanto FORÇA ESPECIAL são produções norte-americanas rodadas em pequenos países europeus para baratear custos. Mas o espectador desavisado juraria estar vendo uma aventura feita em Hong-Kong, ou pelo menos comandada por um diretor oriental, e não por um sujeitinho mirrado vindo de Israel.


Já virou clichê dizer que ocidental não sabe filmar cena de luta. É só ver o que fizeram com Jackie Chan e Jet Li quando eles foram "importados" para os Estados Unidos: não bastou colocá-los em filmes cada vez mais estúpidos, mas também era preciso estragar o talento deles para cenas de ação, filmando lutas quase incompreensíveis de tão picotadas e tremidas.

Pois Isaac Florentine é a exceção à regra. Ele próprio treina artes marciais desde os 13 anos de idade, e não apenas sabe filmar as lutas direitinho - com planos mais abertos e câmera fixa -, como também tem plena noção da importância de uma coreografia decente. Não é só gravar detalhes caóticos e jogar a bomba nas mãos do editor; com Florentine na direção, os atores precisam treinar exaustivamente as coreografias (aqui elaboradas por Akihiro Noguchi) para que o resultado final convença o espectador.


E FORÇA ESPECIAL é exatamente assim. Digo mais: era o filmaço que eu esperava que "Os Mercenários", do Stallone, fosse. Inclusive a trama dos dois filmes é bem parecida, com um batalhão de soldados encarando uma difícil missão de resgate num pequeno país oprimido por um governo militar.

Mas se Stallone rendeu-se a todas essas porqueiras que eu citei anteriormente - câmera epilética, edição de videoclipe que não permite sequer entender o que se passa -, Florentine fez exatamente o contrário, entregando um filme eficiente, bem dirigido, com a dose correta de pancadaria, tiros e explosões, sem perder tempo com frescurada.


O resultado é que você assiste a esta obra que custou 2,5 milhões de dólares e acha que custou 10 vezes isso, enquanto ao ver "Os Mercenários" é impossível acreditar que os caras tenham torrado 82 milhões (!!!) num filme tão mal-feito!

(E se ultimamente parece que vivo malhando "Os Mercenários", é simplesmente porque considero o filme do Stallone, junto com "Machete", dois belíssimos exemplos de como cagar um projeto quase perfeito!)


Voltando a FORÇA ESPECIAL: o roteiro de David N. White é o retrato da simplicidade. Começa mostrando uma ação do grupo das "Special Forces" no Líbano, quando eles invadem um campo de treinamento de terroristas do Hezbollah para resgatar um soldado ianque aprisionado e que está sendo "interrogado" na base do sopapo.

Sem sutilezas, o filme apresenta cada um dos soldados-heróis com legendas que informam seu nome. O pelotão é liderado por um veterano casca-grossa, o Major Don Harding (Marshall R. Teague), que não fica apenas gritando ordens, mas também põe as mãos (e pés) na massa.


Bem, depois da ação no Líbano, o filme nos transporta sem escalas para a "Muldônia, ex-República Soviética", país que eu acredito ser fictício - pelo menos nunca tinha ouvido falar sobre ele, e nem achei nada sobre no Google; além disso, as filmagens aconteceram na Lituânia.

Enfim, "Muldônia" é um daqueles pequenos países europeus sob regime ditatorial que os norte-americanos adoram representar em filmes de ação, especialmente depois que a antiga inimiga União Soviética sumiu do mapa.

Ali, uma vila inteira é exterminada pelo cruel General Hasib Rafendek (Eli Danker, cuja cara realmente dá medo). Só que uma jornalista norte-americana (Daniella Deutscher) estava por perto e registrou todo o massacre. Ela acaba sendo aprisionada pelo ditador, que pretende trocá-la por prisioneiros de guerra.


Entretanto, como todos sabemos, "os Estados Unidos não negociam com terroristas". E lá se vão os bravos soldados da Força Especial para uma difícil missão de resgate, em que precisam enfrentar, literalmente, todo o exército da Muldônia!

Sorte que eles contarão com uma ajudinha especial de Talbot (Scott Adkins), um espião inglês especialista em artes marciais que pretende vingar a morte do parceiro.


Se eu precisasse resumir as qualidades de FORÇA ESPECIAL em apenas três palavras (e felizmente não preciso, mas vamos fingir que sim), eu usaria essas: Florentine, Teague e Adkins.

Nosso diretor já foi suficientemente bem apresentado e não precisa de maiores referências. Já nosso astro Teague é um ator de segundo para terceiro escalão que já apareceu em blockbusters ("Armageddon", "A Rocha"), em filmes do Chuck Norris e em produções de quinta categoria.

Seu papel mais memorável foi enfrentando Patrick Swayze em "Matador de Aluguel", ainda bem jovem - ele era o capanga de Ben Gazarra, que tinha o pescoço dilacerado por Swayze com um único golpe! Aqui, Teague demonstra suas habilidades em artes marciais numa luta final das boas com o grande vilão.


Mas a grande estrela de FORÇA ESPECIAL é o inglês Adkins, que, apesar de "coadjuvante", rouba o filme. Enquanto antigas promessas como Jason Statham vem fazendo filmes cada vez piores e mais convencionais, Scott Adkins é o único astro de ação da modernidade cuja filmografia eu tenho interesse em acompanhar.

Fã de Bruce Lee e Van Damme, o ator treina judô, taekwondo e kickboxer desde moleque, portanto tem gabarito para fazer suas próprias cenas de luta, sem recorrer a dublês. Ele começou sua carreira em produções como "O Medalhão" (com Jackie Chan) e "Máscara Negra 2".


Mais recentemente, após vários papéis de coadjuvante ou de vilão em produções dinheirudas ("A Pantera Cor-de-Rosa", "O Ultimato Bourne"), Adkins vem galgando os degraus para sair da "classe B" para o estrelato - o que pode acontecer em breve, já que ele está no elenco de "Os Mercenários 2".

FORÇA ESPECIAL marca sua primeira parceria com Florentine. Ele apareceu em todos os filmes do diretor desde então, no que se revelou uma dobradinha bem-sucedida. Inclusive teve a honra de dar uns catiripapos no ídolo Van Damme em "Operação Fronteira", e depois estrelou o divertidíssimo "Ninja".


Aqui, Adkins mostra os seus talentos com punhos e pernas em diferentes cenas ao longo do filme, e também ganha sua própria longa e violenta luta final contra o braço direito do vilão, numa pancadaria editada em paralelo ao confronto entre o protagonista Teague e o "último chefão".

Dá gosto de ver o cara lutar. Inclusive ele lembra Van Damme nos bons tempos de "Cyborg - O Dragão do Futuro", mas é muito melhor ator. Espero que a parceria Florentine-Adkins mantenha-se firme ainda por um bom tempo.


É interessante ressaltar que um outro diferencial de FORÇA ESPECIAL para "Os Mercenários", além da qualidade superior de direção e edição aqui, é que os heróis liderados pelo Major Harding enfrentam situações de vida ou morte e não raramente acabam levando a pior, mostrando-se muito mais "descartáveis" do que os "expendables" do Stallone - o que não deixa de ser irônico.

Óbvio que a coisa seria mais interessante se os heróis fossem interpretados por atores mais conhecidos (algo que "Os Mercenários" tinha e não soube aproveitar). Tem até uma cena em que um dos "good guys" é metralhado pelas costas em câmera lenta, estilo "Platoon"!


Também é curioso o fato de que os soldados desse filme REALMENTE parecem soldados. Ao invés de sair correndo e atirando contra tudo que se mexe, como é frequente nos filmes de ação, os caras parecem bem treinados e seguem estratégias e ordens do seu comandante, o que dá um ar um pouco mais verossímil às cenas de combate.

Talvez ajude o fato de um dos heróis ser interpretado por Tim Abell, um cara que serviu no Exército e que já trabalhou dando assessoria em filmes que representam a vida militar, como o drama sobre o Vietnã "Fomos Heróis".


Em entrevistas, o diretor Florentine declarou que seu filme aborda polêmicos temas atuais, como o conflito entre bósnios e croatas e os genocídios em países dos Balcãs, onde aconteceram e acontecem extermínios em nome da "limpeza étnica".

Mas convém não dar muita bola para os discursos do cineasta, pois FORÇA ESPECIAL não passa de um belo filme de ação casca-grossa que não perde muito tempo com sociologia ou discursos engajados. Pelo contrário, o negócio é tão clichê que os vilões, todos feiosos, aparecem surrando idosos e crianças, e sempre com cigarros na boca, enquanto os heróis são bonitões, simpáticos, hiper-patrióticos e exemplos de honra e virtude.


O resultado é absurdamente competente, ainda mais considerando a mixaria que o filme custou e a quantidade de pancadarias, tiroteios e explosões ao longo dos 90 minutos de duração. A contagem de cadáveres chega a umas três centenas, lembrando o estrago que John Rambo fez na Birmânia em "Rambo 4".

Por isso, sabendo que o orçamento mal chegou a 3 milhões de dólares, fico só imaginando o que Isaac Florentine e seu chapa Scott Adkins fariam com metade do orçamento de um blockbuster nas mãos.

E é uma pena que uma coisa dessas continue apenas na imaginação, e que um filme como "Os Mercenários 2", o veículo perfeito para Florentine demonstrar sua técnica, caia nas mãos de um cabeça-de-bagre como Simon West - e com um orçamento de 100 milhões para desperdiçar.

Mundo injusto...

Trailer de FORÇA ESPECIAL



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Special Forces (2003, EUA)
Direção: Isaac Florentine
Elenco: Marshall R. Teague, Scott Adkins, Tim Abell,
Danny Lee Clark, Troy Mittleider, Daniella Deutscher,
Terence J. Rotolo e Eli Danker.



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