O tal do "24 Horas" brasileiro
Filmes Legais

O tal do "24 Horas" brasileiro



Eu queria muito poder dizer aos meus nobres leitores que SEGURANÇA NACIONAL é o filmaço de ação made in Brasil que eu estou esperando há anos (até porque o trailer era promissor). Queria muito, também, que ele se tornasse um estrondoso sucesso de bilheteria no boca-a-boca, à la "Bezerra de Menezes", o que certamente levaria mais diretores, produtores e roteiristas a investir no gênero aqui no país.

Mas não, SEGURANÇA NACIONAL não é um filmaço, muito menos um bom filme de ação. Com todos os seus defeitos, o "Besouro", por exemplo, é bem melhor.

E não, não vai ser um estrondoso sucesso de bilheteria. Pelo menos a sessão que eu vi, em plena tarde de sábado na Avenida Paulista, tinha apenas três pessoas além de mim...

Antes de mais nada, queria mandar um tapão na orelha para todos os críticos desinformados que escreveram que SEGURANÇA NACIONAL é uma das primeiras tentativas de se fazer cinema de ação no Brasil. Obviamente estes sujeitos nunca ouviram falar em Tony Vieira, Rubens Prado ou mesmo Afonso Brazza, nem sabem que existe até um filme de kickboxing feito no país, "A Gaiola da Morte". Ou então eles consideram "cinema brasileiro" apenas o que saiu da Retomada para cá, visão típica de criticozinho arrogante e ignorante.

Enfim...


SEGURANÇA NACIONAL, segundo informam vários sites, começou a ser produzido em 2006 e foi finalizado apenas agora, a um custo estimado em R$ 5 milhões. Vendo o filme, dá para entender a demora na conclusão: é uma produção relativamente barata que deve ter enfrentado muitos problemas, principalmente na realização das cenas de ação. Os efeitos dos tiros, por exemplo, nunca convencem, seja na sonoplastia (o som dos disparos é muito baixinho), seja nos efeitos digitais do clarão dos disparos das armas (qual é o problema com balas de festim?).

Nestes quatro anos em que a produção vinha sendo finalizada, bem que alguém poderia ter dado uma boa olhada no material para perceber a quantidade de equívocos que viriam a se tornar o filme que agora chega aos cinemas, e quem sabe tentar corrigir alguns deles, ou ao menos cortar as diversas cenas que estão sobrando.

Pois se como filme de ação SEGURANÇA NACIONAL deixa a desejar, ele certamente faz rir mais que muita comédia. Principalmente pelo exagerado tom ufanista. Não tenho nada contra a bandeira do Brasil nos uniformes dos soldados ou tremulando ao vento. Afinal, isso é comum em qualquer filme norte-americano de quinta categoria. Mas depois da décima-oitava cena da bandeira verde-amarela tremulando em câmera lenta, a coisa começa a ficar xarope. E não é só: até o Hino Nacional foi incluído na trilha sonora (!!!) numa cena sem qualquer razão de existir!


O roteiro de Bruno Fantini, Daniel Ortiz e do diretor Roberto Carminati (vindo das novelas da Globo) não esconde sua grande inspiração: a série de TV "24 Horas". Thiago Lacerda interpreta Marcos Rocha, um agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que é obviamente calcado no modelo Jack Bauer, embora menos truculento. Já Milton Gonçalves é o presidente negro do Brasil, à la Barack Obama e à la presidente Palmer, de "24 Horas".

A trama de SEGURANÇA NACIONAL se passa em 2004 e tem a ver com o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) e com a Lei do Abate, ferramentas que concederam ao Governo Brasileiro poderes para vigiar a principal entrada de aviões de narcotraficantes no país. Um deles, Hector Gazca (interpretado pelo mexicano Joaquín Cosio), resolve enfrentar o governo para desativar o Sivam, promovendo do seqüestro de políticos brasileiros à ameaça com bombas nucleares - planos sempre frustrados por Marcos, que é o nosso Ethan Hunt, da série "Missão Impossível".

Até há um bom filme em SEGURANÇA NACIONAL, e a própria trama não é das piores, tentando fugir dos clichês do gênero. Terroristas no Brasil? Uau, isso sim é novo! O início do filme - que mostra uma ação do exército contra traficantes no coração da Amazônia - também é muito bom e promissor, e mesmo os créditos iniciais com caracteres "tridimensionais" têm seu charme.


Mas a partir daí é um festival de equívocos que qualquer roteirista saberia contornar facilmente, e não sei porque TRÊS não conseguiram! Por exemplo, por que o vilão Gazca fica apelando para planos cada vez mais mirabolantes para derrubar o Sivam ao invés de simplesmente encontrar uma rota alternativa?

Outra bobagem descomunal é o fato de o super-agente Marcos namorar Fernanda (Viviane Victorette), uma garota que não sabe que seu amado é agente da Abin. Ao mesmo tempo, nosso herói não sabe que sua amada é filha da diretora da Abin (!!!!), interpretada de maneira caricatural por Ângela Vieira. Ou seja, se o super-agente não sabe nem que sua sogra é a sua própria patroa, temos um sinal evidente de que a Inteligência Brasileira vai muito mal das pernas...

Os TRÊS (ênfase) roteiristas também não conseguem contornar a enxurrada de clichês, como o bandidão malvado que passa o filme inteiro matando seus comparsas quando nervoso, mas nunca consegue matar o herói, e no final apela para o velho plano de seqüestrar a namorada do mocinho para se vingar. Mas o uso do Código Morse foi uma bela sacada, ainda que meio inverossímil no contexto todo da situação.


Além dos defeitos técnicos nas cenas de tiroteio, SEGURANÇA NACIONAL tem lutas frouxas e uma trilha sonora absurda repleta de musiquinhas pop-românticas, que tocam nos momentos mais inadequados. E o personagem do presidente é uma comédia: numa cena, ele visita uma escola infantil e, ao ver seus seguranças tentando conter o avanço dos alunos, faz questão de impedi-los e de abraçar cada uma das criancinhas, só para mostrar como é um bom sujeito.

E se SEGURANÇA NACIONAL não funciona como filme de ação, como comédia involuntária, pelo menos, agrada. Afinal, o que pensar de um "terrorista" que decide explodir o Palácio do Governo de Santa Catarina (Estado que colaborou financeiramente com a produção, é claro...) ao invés do Palácio do Planalto? É bem possível que, daqui uns 20 anos, os netos do "Filmes Para Doidos" estarão fazendo piadinhas desse filme como eu faço com as produções da Boca do Lixo...

Agora, verdade seja dita: mesmo com todos seus incontáveis defeitos, SEGURANÇA NACIONAL tem algumas qualidades que certos críticos preferiram ignorar, como as ótimas cenas aéreas envolvendo caças do exército (acho que isso nunca foi feito no cinema brasileiro; aliás, queria ver o que o Tony Vieira faria com estes recursos) e uma perseguição automobilística ladeira abaixo que inclui diversas explosões no percurso, provavelmente o ponto alto do longa.


Isso sem contar que a imagem de não uma, mas duas explosões nucleares NO BRASIL é aquele tipo de coisa que a gente não está acostumado a ver no cinema nacional!

O galã de novelas Thiago Lacerda não está de todo mal como mocinho. No começo é até engraçado ouvi-lo dizer frases pomposas como "A base inimiga foi neutralizada", ou "Afirmativo", mas depois ele não faz feio. Infelizmente, faltam-lhe cenas de ação numa produção que se perde num bla-bla-bla quase interminável.

Divertidíssimo, o elenco bizarro da película é um show à parte: além de todos os já elencados, aparecem também Aílton Graça (!!!) como parceiro do herói (numa cena, o "negão de tirar o chapéu" encara um avião em decolagem apenas com uma moto e um revólver!); Gracindo Jr. como senador corrupto e até Sônia Lima (sim, aquela antiga jurada do Show de Calouros!!!) e a ex-dançarina do Tcham Sheila Mello! É tanta cara conhecida em papéis "diferentes" que quase parece um "Machete" tupiniquim!

Mas infelizmente parece que faltou grana e recursos técnicos para que as lutas e tiroteios não parecessem tão apressadas e mal-coreografadas. Ou talvez brasileiro não saiba filmar cenas de ação sem uma ajudinha dos gringos (como aconteceu em "Tropa de Elite" e "Besouro"). Feitas por conta própria, as perseguições de carro, por exemplo, parecem saídas de novelas - como visto recentemente também no intragável "Salve Geral".

Algo que certamente merece maior atenção do próximo corajoso interessado em fazer um filme brasileiro de ação - quem sabe uma nova aventura do agente Marcos Rocha que passe a borracha nessa primeira.


Confesso, porém, que foi uma experiência divertida entrar num cinema de shopping, entre exibições de "Homem de Ferro 2" e do péssimo remake de "A Hora do Pesadelo", para ver um filme brasileiro de ação. Me imaginei de volta aos anos 70/80, entrando numa sala de cinema de rua para ver um longa do Tony Vieira na tela grande. Quem sabe, SEGURANÇA NACIONAL seria um sucesso popular naqueles tempos de cinema de rua com preços populares. E talvez agora vire hit nos camelôs, entre as novas produções B do Steven Seagal e do Dolph Lundgren. É esperar para ver...

Triste foi abrir a Folha da sexta-feira, data de estréia nacional do longa, e ver o filme sendo destruído em meia-dúzia de linhas, enquanto na mesma edição o péssimo "Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo", um dos piores filmes brasileiros que eu já vi na vida, era tratado com ares de obra-prima da cinematografia nacional.

E o que esperar de críticos-malas que ainda vivem à sombra de Glauber Rocha, aquele super-mala falecido há quase 30 anos e que condenava/odiava o sistema de produção comercial e o cinema de gênero, que combatia o cinema popular das chanchadas (talvez porque qualquer chanchada meia-boca tenha dado mais bilheteria do que toda a filmografia dele...)?

Enquanto esses críticos pedantes continuarem "no poder", obras "populares" como SEGURANÇA NACIONAL serão sempre condenadas como algo pior do que a pedofilia ("Filme de ação no Brasil? NÃO!!!!"). Ao mesmo tempo, filmezinhos cult tipo "Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo" e "Os Famosos e os Duendes da Morte" ganham deslumbradas resenhas de página inteira, quando não a capa dos cadernos de cultura. Afinal, filme brasileiro, para a crítica brasileira, precisa ser tratado de sociologia ou filme de arte, e não diversão. Quanto menos voltado para as massas, melhor.

Não sei vocês, mas entre estes citados eu ainda fico com o Jack Bauer brasileiro. Mesmo com todos os seus defeitos, porque pelo menos ele me fez rir - e não sair do cinema rosnando de raiva por excesso de pretensão artística, como é comum quando vou encarar certas produções nacionais...




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