BOOT HILL (1969)
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BOOT HILL (1969)



Esta foi a terceira vez que vi BOOT HILL, western escrito e dirigido por Giuseppe Colizzi. Mas, se considerarmos a péssima qualidade das cópias anteriores (a primeira vez foi com um VHS da velha Poletel, e a segunda com um DVD tosquíssimo e cara-de-pau da Works/London Filmes), posso dizer que somente agora eu REALMENTE vi o filme.

Se antes tive que engolir péssimas versões em fullscreen com imagem granulada e cores lavadas, que transformam a experiência de ver o filme num tormento, agora finalmente peguei uma versão em letterbox e remasterizada, lançada pela distribuidora Flashstar com uma chamada equivocada na capinha, dizendo que é "o primeiro faroeste de Terence Hill e Bud Spencer" (não é o primeiro).

Nas fotos abaixo você pode comparar o contraste: a primeira foi capturada do DVD da Works; a segunda, do DVD da Flashstar.


Aqui no Brasil, BOOT HILL ficou popularizado com o título da época do videocassete, "Trinity e a Colina dos Homens Maus" (também foi este o título usado no relançamento pela Flashstar; só a Works adotou o original em inglês). Pois esta tradução é duplamente enganosa, já que não há Trinity na história e muito menos uma "colina dos homens maus".

Ocorre que, aqui no Brasil, todo e qualquer filme estrelado por Terence Hill passou a ter o nome Trinity no título, mesmo que o personagem interpretado pelo ator seja outro totalmente diferente, como acontece nesse caso. Já a tal colina é apenas uma tradução equivocada para a expressão "Boot Hill", o apelido em inglês para cemitério, equivalente ao nosso "colina dos pés-juntos".

Embora não tenha Trinity, o filme resgata um personagem já interpretado por Terence Hill em outros dois filmes do diretor-roteirista Colizzi, o pistoleiro Cat Stevens - mesmo nome de um famoso cantor e compositor britânico, a exemplo do Django de Sergio Corbucci, cujo nome foi inspirado no músico Django Reinhardt.


No western spaghetti, Cat já tinha aparecido anteriormente em "Deus Perdoa... Eu Não!" (1967) e "Os Quatro da Ave Maria" (1968), todos também dirigidos por Giuseppe Colizzi. Não vi nenhum dos dois, mas, pelo que pesquisei, a "trilogia Cat Stevens" é formada por aventuras com pouca relação umas com as outras, além da presença de Terence e do seu parceiro habitual, Bud Spencer, cujo personagem se chama Hutch Bessy nos três filmes. O resto é tudo novo. E o nome dos personagens nem ao menos é citado em BOOT HILL.

Embora essas três parcerias entre Colizzi e os dois atores sejam westerns sérios, sem o humor ingênuo e pastelão que passaria a predominar nas aventuras posteriores da dupla Hill-Spencer, aqui já se percebem algumas deslocadas tentativas de fazer graça, como uma animada pancadaria num saloon, quando Spencer distribui seus tradicionais safanões de mão aberta e ergue vilões acima da cabeça para atirar longe.


Bem, um dos grandes problemas de BOOT HILL é a narrativa extremamente truncada, defeito que talvez se explique pela versão lançada no Brasil ser a edição norte-americana, reduzida para 87 minutos. Segundo o IMDB, existem montagens de 97 minutos (na Espanha) e de 100 minutos (na França), onde provavelmente estão as explicações e fatos que não aparecem na cópia que eu vi. O engraçado é que, antes de ficar sabendo da existência dessas versões mais longas, sempre tive a impressão que faltava algo no filme: por exemplo, uma família sitiada pelos vilões numa cabana some de cena, e há um momento confuso em que o grande vilão aparece amarrado e, na cena seguinte, já está livre, sem que tenha sido mostrado como ele se soltou!

Basicamente, a trama de BOOT HILL mostra Cat Stevens fugindo de bandidos que querem matá-lo para que ele não tome posse de uma produtiva mina de ouro, que fica numa região explorada por um poderoso vilão, Honey Fisher (Victor Buono). Fisher e seus capangas forçam os mineradores a vender suas propriedades através de ameaças e violência, e os poucos que se recusam acabam mortos. Um dos capangas do vilão é o sádico Finch (Glauco Onorato).


Logo no início, quando essa trama toda ainda não foi bem explicada (acredite, isso só acontece na meia hora final!!!), Stevens é emboscado pelos homens de Fisher numa pequena cidadezinha. Os pistoleiros querem dar um fim no herói, mas só conseguem feri-lo gravemente com um balaço no ombro. Fora de ação, ele é obrigado a se refugiar na carroça de uma trupe esfarrapada de artistas de circo, que leva seu espetáculo de cidade em cidade. Estes acabam ajudando Cat, principalmente o trapezista e ex-pistoleiro Thomas (interpretado pelo saudoso Woody Strode).

Claro que os vilões dão o troco, matando um dos trapezistas durante uma apresentação e forçando os artistas a abandonarem o circo para seguir outras profissões. Mas Stevens e Thomas procuram pelo antigo colega do herói, Hutch, que vive aposentado numa casa à beira do lago, acompanhado pelo companheiro surdo-mudo "Baby Doll" (George Eastman!!!).


Finalmente juntos, os quatro pistoleiros partem para a cidade explorada por Fisher, dispostos a transformar a vida do vilão num inferno. Recebem a ajuda dos artistas de circo, que voltam a se reunir especialmente para se vingar dos pistoleiros malvados.

A trama parece simples lendo assim, mas as informações são liberadas ao espectador somente no final, de maneira que é muito mais fácil assistir BOOT HILL tendo lido previamente um resumo da história, como este que eu vos entreguei de mão beijada.

Sinceramente, gostaria de acreditar que algumas explicações e momentos mais interessantes estejam nas versões estendidas do filme, já que esta edição de 87 minutos é bem sem graça. Tudo se encaminha para um duelo final cheio de ação entre os quatro heróis e seus amigos do circo contra os pistoleiros de Fisher. Mas, quando chega a hora do embate, este é rápido e anti-climático, sem que nem ao menos os tiroteios valham a pena.


Stevens também parece ter uma conta pessoal a acertar com Finch, o braço-direito do vilão, mas o porquê disso nunca fica bem claro na montagem cortada que assisti, e até o duelo entre os dois é extremamente brochante - sem que se saiba se cenas foram removidas ou a edição que é desleixada mesmo. A própria queda do grande bandidão Fisher é bem sem-graça, com o vilão saindo de cena como se fosse um figurante. Só pode ter coisa cortada aí...

E o restante de BOOT HILL é burocrático, com uma narrativa muito lenta, em que o personagem principal passa os primeiros 30 minutos ferido e sem fazer praticamente nada, enquanto Spencer só entra na história na segunda parte do filme - até então, Terence faz dupla com Strode. Parece até dois filmes diferentes: a primeira metade, com Terence e Strode, é bem séria, naquela linha "homens em busca de vingança", enquanto a segunda metade (já com Spencer em cena) descamba para a comédia e para o humor pastelão.


Também há um excesso de cenas mostrando os bastidores do espetáculo circense. Em vários momentos, Colizzi intercala a ação dos protagonistas com os números do circo, o que acaba comprometendo a narrativa.

Sobra a belíssima fotografia, tão comprometida no VHS e naquele DVD vagabundo da Works (em tela cheia, há momentos em que o cenário fica praticamente vazio), a linda música de Carlo Rustichelli e o fato de Terence Hill estar fazendo um papel sério. Inclusive ele lembra muito Franco Nero ao aparecer de cara suja e mal-barbeada - no anterior "Viva Django/Preparati la Bara!", dirigido por Ferdinando Baldi em 1968, o ator já havia interpretado uma versão não-oficial de Django, e era praticamente um irmão gêmeo do Franco Nero!


Pena que, como eu expliquei, BOOT HILL tem duas metades muito distintas, e não se decide entre ser western sério ou aventura engraçadinha de Hill/Spencer.

O "Dizionario del Western All'Italiana", de Marco Giusti, tem uma pista para justificar esse contraste: parece que Colizzi assumiu o filme depois que outro diretor, Romolo Guerrieri (de "Johnny Yuma"), foi despedido, mas deixou diversas cenas filmadas que tiveram que ser reaproveitadas. Acabou ficando uma coisa híbrida, cujo trailer (veja abaixo) é MUITO MELHOR que o próprio filme!


Mesmo assim, BOOT HILL é um western no mínimo diferente, que tem muitos admiradores e deve ser conhecido por quem gosta de fugir da mesmice do gênero.

Como curiosidade, quando o filme foi lançado na Alemanha, nos anos 70, e as aventuras cômicas de Trinity já eram febre por lá, o distribuidor germânico redublou todos os diálogos para inserir piadinhas e gracinhas diversas, transformando um western "quase sério" em comédia!

Para encerrar, se alguém souber alguma coisa sobre o que há de diferente nas versões mais longas, por favor use o espaço de Comentários para iluminar esse leigo autor.

Trailer de BOOT HILL


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Boot Hill/ La Collina Degli
Stivali (1969, Itália)

Direção: Giuseppe Colizzi
Elenco: Terence Hill, Woody Strode,
Bud Spencer, Lionel Stander, Victor
Buono e Luciano Rossi.



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