Ninguém deve PERDER!
Filmes Legais

Ninguém deve PERDER!



No final da sessão de estréia de NINGUÉM DEVE MORRER, novo filme (na verdade curta) do catarinense Petter Baiestorf, fui saudar o vivente e recomendei, brincando, que ele parasse de usar drogas na hora de fazer suas mirabolantes produções cinematográficas. Para meu espanto, Petter garantiu que já não usava há tempos. Ou seja, é um doido varrido por natureza! E esse seu novo trabalho, aquele tipo de brincadeira bizarra que parece ter sido feita sob efeito de entorpecentes, se encaixa como poucos no rótulo FILMES PARA DOIDOS que dá título a esse blog.

Algum tempo atrás, quando o Petter me confidenciou que estava pensando em fazer um filme de bangue-bangue, eu lhe desejei boa sorte dizendo que também tinha um roteiro em forma de homenagem ao western spaghetti, e que só não havia filmado ainda devido às dificuldades técnicas (de conseguir figurinos, armas, os efeitos para fazer os tiros...). Ele riu da minha ingenuidade dizendo que o seu seria um "faroeste diferente".

Pois a forma mais simplificada de tentar descrevê-lo é dizer que NINGUÉM DEVE MORRER é um western musical (!!!). E apesar do título e da ambientação lembrarem o clássico ciclo do western spaghetti (principalmente o filme "Meu Nome é Ninguém", de 1973, com Terence Hill), a inspiração de Baiestorf não veio dos faroestes produzidos na Itália, mas sim dos escalafobéticos e ultrajantes filmes realizados na Boca do Lixo, como "Um Pistoleiro Chamado Papaco" (1986), de Mário Vaz Filho.


Todo o filme pode ser considerado uma brincadeira cinéfila de citação-colagem-paródia. Gurcius Gewdner interpreta Ninguém, um cowboy envolvido com a produção de filmes pornográficos sobre zoofilia. Certo dia, ele se revolta contra os produtores e abandona o set sem concluir uma cena de sexo oral com um touro (!!!). Furioso, o produtor ordena que Ninguém deve morrer! Um pequeno bando de pistoleiros é reunido para a missão, que envolve os clichês do faroeste (como o ataque à namorada do "herói"), mas logo descamba para o "Baiestorfismo".

Em diversos momentos, por exemplo, a história é interrompida por números musicais que se passam "dentro da cabeça" dos personagens, quando os atores dançam e fingem cantar canções populares, acompanhados de homens travestidos como dançarinas dos cabarés de filmes de western.

Mais adiante, quando a missão do título finalmente é cumprida, o faroeste é deixado de lado para se transformar numa parábola místico-religiosa (em forma de sátira, claro), quando aparece um personagem tradicional do cinema de Baiestorf: o religioso hipócrita que cheira cocaína enquanto balbucia suas mensagens edificantes.


Para completar a balbúrdia, o filme nem ao menos tem uma conclusão, substituída por uma colagem de fotos do tornado que varreu Santa Catarina (e a região das filmagens) em 7 de setembro deste ano, quando NINGUÉM DEVE MORRER estava sendo gravado.

Este novo trabalho de Baiestorf é engraçado por ser totalmente débil mental. Ninguém deve assisti-lo esperando por uma narrativa séria. Além dos bizarros números musicais que entrecortam a história, os figurinos são propositalmente pobres; a cor do sangue que sai dos ferimentos nos personagens muda de vermelho para verde e azul; um carro suspenso em uma árvore (protesto "anti-carro" feito pelo próprio diretor no prólogo) invade o filme numa cena-chave; os cowboys fingem cavalgar cavalos invisíveis, à la Monty Python (simplesmente porque a produção não tinha cavalos para utilizar!), e quase todos os "atores" são dublados com diálogos impagáveis tirados de filmes da Boca (o já citado "Papaco" e "Fuk-Fuk à Brasileira"), e da dublagem nacional do clássico "Comando para Matar", com Schwarzenegger (de onde saíram frases tipo "Cortar a garganta de uma menina é como cortar manteiga quente" e "Ele é um gigante pra ninguém botar defeito!", entre outras).


O resultado é uma brincadeira cinéfila (como assume o próprio diretor) bastante divertida, desde que se entre no espírito da coisa. A proposta de homenagear a Boca do Lixo e seus filmes excêntricos e inacreditáveis sempre é válida.

Mas, apesar da fonte de inspiração, Petter não apela para a sacanagem que vinha como uma constante em seus últimos trabalhos ("Arrombada" e "Vadias do Sexo Sangrento"): a nova musa do diretor, Ljana Carrion, aparece travestida como um dos pistoleiros, e a única mulher em cena, Lane ABC, está sempre com roupa.

Como atração à parte, NINGUÉM DEVE MORRER reúne várias caras conhecidas da cena underground e do cinema independente brasileiro, incluindo atores já conhecidos do cinema de Baiestorf (Gurcius, Ljana, Lane, Elio Coppini, Coffin Souza, Jorge Timm) e participações especiais de Cristian Verardi, Insekto e mais uma trupe de malucos de várias partes do Brasil.


Nesses tempos inglórios em que o cinema independente brasileiro tem descambado para um experimentalismo chatíssimo, sempre resta a esperança de aguardar com ansiedade pela próxima loucura (sem efeito de drogas) de Petter Baiestorf.

ATUALIZAÇÃO (18/12/2009):
Acabo de receber a notícia de que o Baiestorf, através do Gurcius, "uplodeou" o filme no YouTube, dividido em três partes, conforme vocês podem ver abaixo. Agora sim que ninguém deve perder!!!

NINGUÉM DEVE MORRER - Parte 1



NINGUÉM DEVE MORRER - Parte 2



NINGUÉM DEVE MORRER - Final




loading...

- Guns And Guts (1974)
Eu nunca tinha ouvido falar de GUNS AND GUTS até encontrá-lo praticamente por acaso num site de compartilhamento de arquivos. Pelo título, por algumas fotos que prometiam sangue e mulher pelada e pelo diretor (o mexicano René Cardona Jr., um especialista...

- Mostra Cinema De Bordas Em Sp
Começa na terça-feira, 20 de abril, a segunda edição da Mostra Cinema de Bordas, que o Itaú Cultural promove até o domingo, 25, mais uma vez reunindo produções independentes e/ou amadoras vindas de todas as partes do Brasil, e exibindo-as em...

- Sexo ErÓtico Na Ilha Do GaviÃo (1986)
Nos anos 80, tentando combater a invasão dos filmes pornográficos made in USA, muitos diretores "populares" do cinema nacional acabaram enveredando para o X-Rated, com resultados que vão do lamentável ao muito engraçado (mas quase nunca propriamente...

- Bar Exibe Clássico Pornô Da Boca
O bar Astronete exibirá hoje "Um Pistoleiro Chamado Papaco", um dos mais hilários filmes da fase pornô da Boca do Lixo de São Paulo. Uma pena que não posso ir, pois estarei trabalhado. Daqui alguns dias, publico uma resenha dessa obra-prima. As informações...

- A Noite Dos Chupa Cabras
Seguem vários links sobre o novo longa de Rodrigo Aragão (diretor de Mangue Negro). O filme A NOITE DOS CHUPA CABRAS foi filmado no Espírito Santo e está em fase de finalização. É estrelado pelos amigos Mayra Alcarón, Joel Caetano, Cristian Verardi...



Filmes Legais








.