THE LAST HUNTER (1980)
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THE LAST HUNTER (1980)



Existem duas formas de ver THE LAST HUNTER, do italiano Antonio Margheritti.

A primeira forma é como filme de ação casca-grossa sobre o Vietnã, com o bônus de trazer tanto sangue e mutilações on-screen que até parece filme de horror - veja bem, isso décadas antes de Sylvester Stallone chutar o pau da barraca com o violentíssimo "Rambo 4"!

A segunda forma é como um incrível filme "anti-guerra" sobre a estupidez de confrontos como o do Vietnã, repleto de ação, sim, mas também momentos alegóricos que refletem a loucura bélica.


E eu sou tão cara-de-pau que não tenho vergonha de colocar THE LAST HUNTER como um dos melhores filmes sobre o Vietnã já feitos, numa mesma lista com os clássicos "O Franco-Atirador" e "Apocalypse Now", e várias posições acima de obras consagradas (e, na minha opinião, superestimadas) como "Platoon" e "Pecados de Guerra".

THE LAST HUNTER saiu no Brasil, nos primórdios do VHS, com um título no mínimo esquisito: "Apocalypse 2".

Era, claro, uma tentativa de linkar o filme com o clássico do Coppola, "Apocalypse Now", com o qual THE LAST HUNTER até tem algumas semelhanças.


Outra grande fonte de inspiração foi "O Franco Atirador", de Michael Cimino. Não por acaso, o título italiano original do filme de Margheritti era "Cacciatore 2" (O Franco-Atirador 2), posteriormente trocado para "L'Ultimo Cacciatore" (O Último Caçador) para escapar de problemas com direitos autorais.

De Coppola, o roteiro de Dardano Sacchetti "emprestou" a narrativa episódica, em que o personagem principal, tal qual um Martin Sheen macarrônico, recebe uma missão secreta, mas passa o filme inteiro às voltas com outros problemas e experiências traumáticas, até finalmente chegar ao seu objetivo, no final, transformado num bagaço, meio vivo, meio morto.


"Apocalypse Now" também influenciou o personagem do Major Cash (John Steiner), um militar maluco e filosófico muito parecido com o Major Kurtz de Marlon Brando.

Já de Cimino, THE LAST HUNTER tirou todo o foco "War is hell" e, principalmente, as cenas cruéis de violência e de tortura perpetradas pelos vietcongues contra os inimigos ianques.

(Sem contar que um figurante com faixa amarrada na testa parece um clone do personagem de Christopher Walken em "O Franco-Atirador"!)


Margheritti, um ótimo diretor que infelizmente só começou a ser reconhecido depois de morrer, filmou sua sangrenta aventura de guerra nas Filipinas. Reconhecendo suas inspirações, usou o mesmo local em que Coppola filmara "Apocalypse Now" anos antes.

O início é num bordel de Saigon, e lembra muito o clima de "O Franco-Atirador". Ali, encontramos nosso protagonista, o capitão Henry Morris (o saudoso David Warbeck, brilhante), ao lado de um amigo transtornado que balbucia doideiras, visivelmente afetado pela guerra.

Após uma discussão estúpida, o amigo louco dá um tiro na fuça de outro soldado e explode os próprios miolos - uma cena realista, com direito ao clarão do disparo dentro da boca do sujeito, anos antes de cena parecida em "Clube da Luta".


Morris nem tem muito tempo para assimilar a tragédia, pois os vietcongues atacam, explodindo um campo de pouso ao lado do bordel (ataque mostrado através das cenas com miniaturas que Margheritti adorava filmar). O próprio puteiro vai para os ares, e o herói é o único sobrevivente.

Afetado pelo incidente, o capitão resolve voluntariar-se para uma missão suicida, cujo alvo só ficamos sabendo na cena final - explodir uma estação pirata de rádio que vem transmitindo mensagens pacifistas aos soldados norte-americanos, convencendo-os a parar de lutar uma guerra "já perdida".

Para realizar sua missão, ele recebe a escolta de um grupo formado pelo sargento George Washington (Tony King, que interpretou um personagem de mesmo nome no clássico "Os Caçadores de Atlântida"), pelo cubano Carlos (Bobby Rhodes, de "Demons"), pelo soldado Stinker Smith (Edoardo Margheriti, filho do diretor) e por uma correspondente de guerra, Jane Foster (Tisa Farrow, de "Zombie").


Durante o restante do filme, o grupo percorrerá a selva enfrentando todo tipo de perigos e adversidades, de bebês-bomba a soldados americanos convencidos a enfrentar seus próprios colegas pela tal rádio pirata; de armadilhas mortais espalhadas pela selva a cobras venenosas; de ataques-surpresa do inimigo ao insano Major Cash.

Apesar de soar drasticamente "anti-guerra", THE LAST HUNTER não foi feito como tal. Segundo o filho de Antonio, Edoardo, que além de ator foi assistente do diretor, o objetivo do pai não era fazer uma história política ou contrária à Guerra do Vietnã, mas apenas um filme divertido.


E divertido o filme é, sem sombra de dúvidas. Principalmente a seqüência toda que se passa na base-caverna do insano Major Cash, onde foi montado até um bar com danceteria e fliperama para os soldados - tão enlouquecidos, pela guerra, pelo isolamento e pelo consumo de drogas, que consideram a coisa mais normal do mundo estuprar a pobre correspondente de guerra!

Cash, que é uma mistura do Major Kurtz com o personagem de Robert Duvall em "Apocalypse Now", passa os momentos de folga ouvindo uma trilha sonora de tiroteios e explosões que sai de alto-falantes em seus aposentos. No auge da loucura, ele manda um de seus soldados enfrentar todo um batalhão inimigo somente para pegar um coco no meio da selva - "brincadeira" que aparentemente já havia sido feita outras vezes, pois o tempo do sujeito é cronometrado para ver se ele conseguirá "bater seu recorde". Ver o pobre soldado desviando de tiros e explosões para pegar o coco lembra bastante a cena do surfe entre bombas no filme de Coppola.


Porém THE LAST HUNTER se caracteriza mesmo é pelo fator exploitation. A violência é forte e sempre presente. Margheritti faz questão de mostrar a fragilidade dos corpos dos soldados ao rasgá-los em pedaços, jogando na cara do espectador o resultado insano de uma guerra estúpida.

No cardápio de mutilações, há de tudo um pouco: tiro no olho, cadáver decomposto com as tripas pra fora, sujeito rasgado no meio por uma armadilha, pessoas em chamas, fraturas expostas e membros decepados, tudo representado com uma crueza impactante. O realismo das feridas e mutilações é garantido pela presença de Massimo Giustini na equipe de efeitos especiais - o mesmo responsável pela maquiagem realista de "Cannibal Holocaust".


Porém a cena mais incômoda do filme, que remete ao realismo brutal de "O Franco-Atirador", mostra Morris sendo aprisionado pelos vietcongues numa cela parcialmente submersa num rio imundo, onde os prisioneiros são atacados por ratos famintos. Seu colega de cela é um outro soldado com o rosto parcialmente devorado pelos roedores, e o próprio herói é ferido com golpe de baioneta para que o sangue possa atrair os animais.

É preciso dar um desconto para a conclusão absurda, em que revela-se que a responsável pelas mensagens "subversivas" é uma pessoa ligada ao passado do próprio Morris (muita coincidência para ser verdade). Mas é coisa típica da italianada, que não consegue falar sério o tempo todo e precisa jogar alguma bobagem nos filmes.


Além de todos os pontos positivos já elencados, eu não posso deixar de mencionar que THE LAST HUNTER traz um anti-herói imperfeito e com ações moralmente condenáveis. Embora numa primeira assistida o espectador simpatize com o Capitão Morris e seu heroísmo inabalável (principalmente por causa do ator gente-boa), é pensando no filme e na trama, depois, que você começa a perceber como o "herói" de David Warbeck é, na verdade, um canalha, daquele tipo que leva seus homens à morte por uma missão imbecil e que só pensa em seguir suas ordens, não importa quem tenha que matar (afinal, "missão dada é missão cumprida", como vimos em "Tropa de Elite").

Logo no começo, por exemplo, Morris aponta sua arma para um piloto do helicóptero, forçando-o a arriscar-se sobrevoando uma área de bombardeio. Durante um ataque-surpresa dos vietcongues a uma base norte-americana, ele só pensa em salvar o próprio pescoço, abandonando seus homens ao próprio destino. E a própria missão do "herói" não tem nada de heróica, pois representa a vitória do militarismo cego sobre o pacifismo!


Por essas e por outras é que sempre coloco THE LAST HUNTER na minha lista de obras-primas sobre a Guerra do Vietnã, e não tenho vergonha de compará-lo aos clássicos consagrados pela crítica, como Coppola e Cimino (certos críticos certamente teriam um treco ao ver Margheritti sendo citado na mesma frase que esses dois).

Sem contar que, como eu escrevi no começo, THE LAST HUNTER também funciona apenas como filme de ação casca-grossa sobre o Vietnã, com uma contagem de cadáveres tão alta que pode brigar de igual para igual com "Top Gang 2" pelo título de "filme mais violento de todos os tempos"!


PS 1: Este é o último trabalho do diretor de fotografia Riccardo Pallottini, que morreu num acidente de helicóptero durante as filmagens. Pallottini trabalhava com Margheritti desde os anos 60, e também fez filmes conhecidos de outros diretores, como "Matador Implacável", de Luigi Cozzi, e "Blindman", de Ferdinando Baldi.

PS 2: Cenas aéreas e de explosões foram reaproveitadas por Margheritti em seus dois filmes posteriores, "Tiger Joe - Escapando do Inferno" (1982) e "Tornado" (1983), que alguns consideram ser uma espécie de trilogia do diretor sobre a Guerra do Vietnã. O picareta Bruno Mattei também reaproveitou estas cenas (provavelmente sem pedir autorização) em seu clone de Rambo "Strike Commando - Comando de Ataque", de 1987.

Trailer de THE LAST HUNTER



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Apocalypse 2 (The Last Hunter / L'Ultimo
Cacciatore, 1980, Itália)

Direção: Antonio Margheritti (aka Anthony M. Dawson)
Elenco: David Warbeck, Tisa Farrow, Bobby Rhodes,
Tony King, Margit Evelyn Newton, John Steiner,
Massimo Vanni e Edoardo Margheritti.



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