WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! (1986)
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WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! (1986)



Minha infância e pré-adolescência foi na década de 80. À época, eu estava muito ocupado me divertindo para entender os graves problemas daquele período, como a hiperinflação (que fazia os preços mudarem de um dia para o outro, às vezes até no mesmo dia) ou a lenta abertura da Ditadura para a Democracia, com o movimento Diretas Já!

Mas mesmo não sabendo direito o que era a Guerra Fria (entre Estados Unidos e União Sovitética), eu sabia que vivíamos tempos paranóicos e terríveis, em que a qualquer momento um dos lados podia apertar um botão vermelho e explodir o mundo inteiro, inclusive quem, como eu, não tinha nada a ver com a história (e imagine o que faz esse medo na cabeça de uma CRIANÇA, principalmente depois que vi o chocante "O Dia Seguinte" na Globo).


Hoje a gente olha para trás e respira aliviado, até dá risada daquela tenebrosa corrida armamentista que parece tão distante (embora as bombas nucleares ainda estejam estocadas por aí).

E uma das melhores maneiras de lembrar/rir do medo da Terceira Guerra Mundial é uma obscura comédia inglesa que quase ninguém viu, mas eu considero uma das mais geniais dos anos 80, e uma verdadeira síntese do que foi aquela década: WHOOPS - APOCALYPSE JÁ!

O título original (apenas "Whoops Apocalypse!", algo como "Opa, Apocalipse!") já ironiza a iminência de uma guerra nuclear por qualquer bobagem, dependendo do humor de quem estava com o dedo no botão vermelho - medo muito comum na época em que o filme foi feito.


Lançado em VHS no Brasil pela saudosa Hipervídeo, WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! pode ser descrito como uma caótica mistura de "Dr. Fantástico", do Kubrick, com o humor do grupo inglês Monty Python.

Se Stanley Kubrick já tinha feito piada com a Guerra Fria e com o medo da bomba lá em 1964, a comédia de Tom Bussmann (quem?) atualiza esse mesmo medo para a caótica década de 80, a famigerada Era Reagan/Thatcher, oscilando entre inteligente sátira política e humor nonsense.

O filme começa quando Santa Maya, uma pequena (e fictícia) colônia britânica na América Central, é invadida pelo (igualmente fictício) país vizinho, Maguadora, num golpe militar encabeçado pelo terrível general Mosquera (Herbert Lom).


O caso faz referência a um triste episódio verídico: a Guerra das Malvinas, em 1982, quando Argentina e Inglaterra disputaram no tiro o domínio das ilhas de mesmo nome. Os hermanos, claro, se deram mal, num capítulo ainda traumático de sua história (se você visitar a Argentina, verá várias placas dizendo "As Malvinas são argentinas" espalhadas pela estradas!).

A invasão logo se transforma num delicado incidente internacional, que põe em rota de colisão os líderes das principais nações. O primeiro-ministro inglês, Sir Mortimer Chris (Peter Cook), quer aproveitar sua enorme popularidade para bombardear Maguadora e recuperar a colônia para a Inglaterra. O político é tão popular que basta passar em frente a uma janela, em qualquer momento do filme, para ser ovacionado pelo povo!

Por outro lado, os Estados Unidos tentam fazer papel de mediador do conflito sem a necessidade de uma guerra. Entra em cena a vice-presidente Barbara Adams (Loretta Swit), uma boçal que assumiu o comando da nação depois da morte do titular, que era ex-palhaço de circo (numa brincadeira com o passado de ator do presidente norte-americano da época, Ronald Reagan).


Só que, para complicar a situação, o terrorista internacional Lacrobat (Michael Richards, o Cosmo Kramer do seriado "Seinfeld") sabota todas as tentativas de negociar a paz, levando os países a um conflito que pode ser o estopim para a Terceira Guerra Mundial. Principalmente quando os russos entram na jogada com uma base de mísseis secreta, e a princesa inglesa Wendy (uma gozação com a então ingênua princesa Diana) é sequestrada por Lacrobat e Maguadora leva a culpa!

WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! é um filme que vi ainda garoto, e obviamente não entendi direito toda a parte da sátira política, mas mesmo assim curti pelo seu humor negríssimo, do tipo "Seria cômico se não fosse trágico".


Acompanhe: a trama também envolve um almirante inglês durão, mas homossexual (Ian Richardson), que é a peça-chave para o final brilhante, uma das conclusões mais absurdas e surpreendentes da história do cinema - daquelas em que você se pega olhando para os créditos finais subindo e pensa: "Puta que o pariu!".

Outra alfinetada política vai para o ex-presidente norte-americano Richard Nixon (na época, ainda vivo), satirizado no filme através do personagem do ex-presidente Jack "Mate os Comunistas" Preston (Murray Hamilton), que é procurado na cadeia (!!!) pela sua sucessora em busca de conselhos políticos.


Quem viveu nos anos 80 certamente vai achar o filme muito mais engraçado. Herbert Lom, por exemplo, faz uma caricatura daqueles generais das repúblicas das bananas, que estavam sempre nas capas dos jornais por darem um golpe de estado por semana.

Numa cena hilária, ele se reúne com sua cúpula e todos na sala usam enormes óculos escuros, até a imagem de uma santa num pedestal, brincando com a imagem desses ditadores sul-americanos (como Pinochet e até o nosso Costa e Silva), que sempre apareciam em público com enormes óculos escuros e caras de buldogue.


Mas quem rouba a cena é Peter Cook como o dócil primeiro-ministro que, na metade do filme, subitamente enlouquece, mas é tão popular que suas ordens continuam sendo inquestionavelmente seguidas pelo povo - mesmo quando ele sugere combater o desemprego atirando 10 mil pessoas empregadas de um penhasco para liberar suas vagas nas empresas! O personagem parece uma versão inglesa do general Jack Ripper, de "Dr. Fantástico".

Lá pelas tantas, com a ajuda da CIA, seus aliados políticos tentam matá-lo num atentado mirabolante envolvendo ácido na banheira, mas só conseguem corroer sua mão (que ele pôs na água para testar a temperatura). Pois o enlouquecido primeiro-ministro até fica feliz em substituir a mão perdida por um gancho de pirata (!!!), e começa a crucificar seus conselheiros em praça pública!


Entre os hilários momentos "não-políticos" de WHOOPS - APOCALYPSE JÁ!, o auge da loucura é quando os líderes mundiais descobrem que a princesa sequestrada está sendo mantida refém num museu de cera. Uma unidade do exército inglês é enviada para o resgate, e simplesmente entram no local atirando e destruindo tudo.

No final, o comandante faz a contagem de cadáveres e comemora: "Perdemos 11 homens, mas os bonecos perderam 28". A cena completa, hilária e repleta de humor negro, pode ser vista no vídeo abaixo e já dá uma idéia do tom do filme:

A invasão ao museu de cera


Outras gags visuais envolvem a presidente dos Estados Unidos, sempre acompanhada de dois seguranças brutamontes, mesmo quando está nadando ou deitada em sua cama. Os brucutus espancam todos que tentam se aproximar da presidente, incluindo uma pobre menininha que vai oferecer um ramalhete de flores à governante!

Mas é bom não falar muito mais para não estragar as surpresas. Afinal, esse é mais um daqueles filmes tão obscuros e desconhecidos que dá gosto de "descobri-los" - uma entre inúmeras pérolas perdidas e/ou esquecidas do nosso mercado de vídeo.


Pesquisando para escrever essa medíocre resenha, descobri que WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! é uma espécie de remake de um seriado de TV britânico exibido em 1982, e que tinha o mesmo nome, "Whoops Apocalypse!".

Com seis episódios de meia hora, a série também brincava com a idéia de uma Terceira Guerra Mundial, mas a história pegava ainda mais pesado (mostrando uma explosão atômica em Israel e com a participação do Irã, um dos maiores inimigos do "mundo ocidental" na época). O elenco era todo diferente, com o ex-Monty Python John Cleese interpretando o terrorista Lacrobat. Isso me deixou curioso para ver a série.


No Brasil, não lembro de WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! ter tido grande repercussão na época do seu lançamento. Só lembro das críticas do Guia de Filmes Nova Cultural (com apenas uma estrelinha, detonando a produção) e de uma surpreendente resenha positiva escrita pelo super-mala Rubens Ewald Filho, que também comparou o filme a "Dr. Fantástico".

Engraçado era ler, no verso da capinha da Hipervídeo, a escabrosa propaganda falsa: "A gloriosa direção é de Tom Bussman (sic), cuja fama como diretor de humor é notória". Tão notória que o sujeito só fez esse filme, e antes havia dirigido um único episódio de um seriado de humor lá na Inglaterra. Se isso bastou para ter uma "fama notória", o que aconteceria se Bussmann tivesse feito outro filme? Sua fama viraria "lendária"?

Embora às vezes seja mais bagunçado/caótico do que propriamente engraçado, WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! é um filme que eu recomendo com louvor, e que colocaria sem pensar duas vezes em qualquer lista das comédias imperdíveis dos anos 80.


E se parecerá mais divertido para quem viveu na época - e lembra de coisas como a Era Reagan e a Guerra das Malvinas, e personagens como Margaret Thatcher e a princesa Diana -, hoje também serve como brilhante retrato satírico de uma época de paranóia e medo nuclear, que por muito pouco não teve a mesma conclusão do filme. Acredite: não seria nada engraçado!

Encerro com uma dica: se "Dr. Fantástico" e WHOOPS - APOCALYPSE JÁ! representaram tão bem os problemas políticos e medos de suas épocas, já está mais do que na hora de alguém com muita coragem fazer uma comédia anárquica sobre esses nossos tempos atribulados (programa nuclear do Irã, ocupação do Iraque, o fiasco das "armas de destruição em massa" inexistentes).

Afinal, às vezes é melhor rir para não chorar...

Trailer de WHOOPS - APOCALYPSE JÁ!


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Whoops - Apocalypse Já! (Whoops
Apocalypse!, 1986, Inglaterra)

Direção: Tom Bussmann
Elenco: Loretta Swit, Peter Cook, Herbert Lom,
Murray Hamilton, Shane Rimmer, Ian Richardson,
Michael Richards e Rik Mayall.



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