1968: TUNNEL RATS (2008)
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1968: TUNNEL RATS (2008)



Já virou clichê escrever que o alemão Uwe Boll é um dos mais medíocres cineastas atualmente em atividade (se é que dá pra considerar cinema as porcarias que ele "escreve" e "dirige"). Mas esta generalização às vezes se transforma numa injustiça; afinal, o pobre sujeito virou sinônimo de ruindade mesmo para quem nunca realmente viu um filme dele! E não dá para negar que alguns dos seus trabalhos são pelo menos divertidos (o primeiro "Bloodrayne", por exemplo, que ainda tem o mérito de mostrar a linda Kristanna Loken pelada, ou a comédia "Postal", que atrai justamente pelo seu extremo mau gosto).

E então chegamos a 1968: TUNNEL RATS, um dos novos filmes do hiperativo Boll, que só neste ano de 2009 deve lançar mais três obras ("Far Cry", "Stoic" e "Rampage") e já está filmando outras duas ("The Storm" e "Darfur"), isso tudo mesmo com a quantidade absurda de críticas que seu trabalho recebe, e apesar de seus filmes jamais terem dado qualquer retorno financeiro em bilheteria - queria saber como o sujeito ainda consegue encontrar financiadores para as suas maluquices...


TUNNEL RATS é diferente dos filmes que Boll vinha fazendo até então, já que parte de uma história original de Dan Clarke transformada em roteiro do próprio diretor, mas sem inspiração em nenhum videogame, como a maior parte de suas obras anteriores. Aqui ironicamente fizeram o caminho inverso: foi o filme que depois se transformou em jogo de videogame!

Também é um dos primeiros trabalhos do diretor sem grandes astros ou nomes conhecidos no elenco, depois que nosso amigo desperdiçou gente como Ben Kingsley, Jason Statham e Burt Reynolds em suas produções anteriores. Aqui, para dar uma idéia, o nome mais conhecido é o ex-astro dos anos 80 Michael Paré, o que obviamente não quer dizer grande coisa. O orçamento foi de míseros 8 milhões de dólares e, reza a lenda, a estréia foi num único cinema de Los Angeles (!!!).


A surpresa é que, dependendo do seu estado de espírito, e com alguma boa vontade, este drama de guerra é bem divertido, e até, acredite se quiser, interessante. Talvez seja preciso um idiota como o Boll para conseguir fazer um filme cínico sobre a idiotice da guerra, neste caso a Guerra do Vietnã. Claro que não é nada que chegue aos pés de um "Apocalypse Now" ou "O Franco-Atirador", mas é louvável a maneira como o filme foge do tradicional estereótipo de "heróis americanos" vitimados pelos "malvados vietcongues". Para Boll, não há heróis nem vilões, vencedores ou perdedores - apenas vítimas.

O clima é tão pessimista que lembrei de alguns ótimos filmes italianos sobre o tema (como "Apocalypse 2/The Last Hunter", do Antonio Margheritti), que uniam extrema violência com uma mensagem anti-belicista, o contrário do que se via nas produções norte-americanas sobre o conflito - especialmente os "clássicos" produzidos e dirigidos por David A. Prior, como "Batalha no Campo do Inferno" e "Zona de Ataque", onde um ou dois heróicos soldados norte-americanos chacinavam pelotões inteiros de vietcongues (vai saber como é que os Estados Unidos não ganharam a guerra...).


E você realmente percebe que o homem está aprendendo a fazer filmes já nos créditos de abertura, em que helicópteros carregados de sacos-de-cadáver sobrevoam a imensidão da selva (as filmagens foram na África do Sul) ao som da música "In the Year 2525", de Zager & Evans.

TUNNEL RATS enfoca um grupo de soldados que têm como missão se infiltrar nos apertados túneis subterrâneos onde os inimigos vietcongues vivem, se escondem e preparam armadilhas e emboscadas para os rivais. Assim, são "ratos de túnel", como o título já diz, sob o comando do fanático tenente Vic Hollowborn (Paré), um personagem que parece saído de "Apocalypse Now", e que tem como atividades rotineiras enforcar prisioneiros de guerra ou desafiar soldados que discutem suas ordens para lutas de boxe (e vai entender como é que o sujeito tem luvas de boxe em plena selva!!!).


Os primeiros 20 minutos, que tentam apresentar um pouco mais da vida pregressa, dos dramas e dos medos dos jovens recrutas, é de longe a pior parte. É Boll tentando criar seu próprio "Platoon" ou "Nascido Para Matar", obviamente sem conseguir. Até que, lá pelas tantas, um dos personagens faz um discurso que parece ler o pensamento do próprio espectador: "Nada dessas merdas interessa, onde você esteve, de onde você é... Agora você está no Vietnã, e só interessa o que você faz no campo de batalha!".

É então que o filme começa a mostrar ao que veio, a partir do momento em que o pelotão entra em um túnel recém-descoberto nas cercanias do seu acampamento. É quando o clima tosco de "Platoon" vai para o espaço e a história se transforma numa versão bélica de "Abismo do Medo", com os pobres soldadinhos se arrastando por túneis escuros e cada vez mais apertados, e sendo despachados violentamente pelo inimigo escondido na escuridão.


Claro que, para curtir o filme, é preciso ignorar o fato de o roteiro de Boll ser HORRÍVEL. O desenvolvimento dos personagens é mínimo, e, quando existe, é constrangedor (tipo o negro que sonha em abrir uma lanchonete fast food quando voltar para os EUA, e passa as noites mandando beijos para a Lua para a sua namorada!!!!); o fio narrativo é inexistente, com as cenas e as mortes se sucedendo meio sem razão; personagens desaparecem sem explicação da história até que seja conveniente trazê-los de volta, e tudo acaba meio sem propósito, como se nunca tivesse existido, de fato, uma trama a seguir, deixando o espectador com aquela sensação de "Tá, e daí?".

Mesmo assim, algumas coisas realmente me agradaram em TUNNEL RATS para fazer com que eu esquecesse que estava vendo um filme sem roteiro. Uma delas é que o diretor-roteirista brinca com as expectativas do espectador, surpreendendo-nos inúmeras vezes ao longo da trama. Para começar, não há protagonistas principais: todos os recrutas ganham mais ou menos o mesmo destaque, e você acaba nem lembrando os nomes da maioria deles. Também não há espaço para heroísmos individuais à la "Rambo", frases de efeito ou acrobacias pirotécnicas.


Melhor: Boll faz com que um dos seus personagens passe o filme inteiro sobrevivendo a todo tipo de dificuldade no interior dos túneis, apenas para chegar à superfície e ser estupidamente abatido por fogo amigo! Também engana o público ao fazer o soldado metido a machão, que parece o grande herói da trama, morrer por primeiro (e de forma imbecil também), e ao mesmo tempo mantém vivo até a conclusão o recruta banana e covarde, que todos passam o filme inteiro dizendo que não vai durar muito tempo.

Para quem tem saudade daquelas produções bagaceiras e hiperviolentas feitas pelos italianos, TUNNEL RATS também é um deleite, primando pelo exagero: de soldados eviscerados por baionetas a espinha arrancada em enforcamento, o filme traz todo um catálogo de barbaridades. Uma das grandes influências de Boll parece ter sido "O Resgate do Soldado Ryan", já que há desde cenas com vietcongues esfaqueando impiedosamente inimigos desarmados até um soldado que é fanático religioso.


Pode-se até criticar o ritmo lento da narrativa, já que as cenas dos soldados engatinhando nos túneis escuros são repetidas à exaustão até deixar o próprio espectador sem fôlego. Mas elas funcionam para criar um clima de claustrofobia (é terrível imaginar-se naquela situação, com pouco espaço para se mexer e ainda sendo atacado pelos inimigos vindos de todos os lados), e ainda ajudam a criar uma história sobre a Guerra do Vietnã narrada de maneira original, até porque você fica se questionando sobre a idiotice daquilo - por que os caras não tacam umas 30 granadas e explodem os túneis ao invés de obedecer as ordens de seus superiores para rastejar lá embaixo? Há um momento altamente bizarro em que um soldado fica bloqueado no túnel após matar um vietcongue, e precisa esquartejar o cadáver pedaço por pedaço para liberar a passagem!

No final, quando um soldado norte-americano morre lado a lado com um "inimigo" vietcongue, o espectador até releva diversas bobagens que viu durante o filme para admirar a coragem do diretor. Longe de ser aquela historinha de ação e guerra que eu esperava, TUNNEL RATS traz até uma mensagem altamente crítica sobre a estupidez do conflito e sobre a futilidade da guerra. É isso mesmo, amiguinhos: Boll está tentando passar uma mensagem!

E, quem diria, consegue fazer isso de maneira muito mais contundente do que muito suposto clássico sobre o Vietnã que existe por aí...

Trailer de 1968: TUNNEL RATS


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1968: Tunnel Rats (2008, Canadá/Alemanha)
Direção: Uwe Boll
Elenco: Michael Paré, Nate Parker, Wilson
Bethel, Brandon Fobbs, Jane Le, Rocky
Marquette e Erik Eidem.



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