"...e nossos filmes explodem como dinamite!"
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"...e nossos filmes explodem como dinamite!"



Se você frequentava videolocadoras (esse negócio hoje em extinção) entre o final dos anos 1980 e a metade da década de 90, certamente deve ter retirado, em algum momento de sua vida, pelo menos uma fita cuja capinha tinha uma moldura azul com estrelinhas brancas. E, antes do filme, viu a vinheta acima, que terminava com um sonoro "Somos a América Vídeo, e nossos filmes explodem como dinamite!".

A postagem de hoje, portanto, será sobre nostalgia e saudosismo. Eu aproveitei uns dias de "ócio criativo" no começo do ano para organizar minha abandonada coleção de VHS (sim, eu ainda tenho fitas) e escanear as capinhas mais antigas, acreditando que um dia isso ainda poderá se tornar um registro da memória da Era de Ouro das videolocadoras brasileiras.

(Enviei todo o material escaneado para o blog VHS - O Último Reduto, que semanalmente divulga capinhas das fitas brasileiras.)


Durante a enfadonha operação de tirar capinhas do estojo para escanear, fiquei viajando nessas capas de moldura azul com estrelinhas brancas da América Vídeo, e resolvi dividir algumas delas com vocês, nobres leitores e queridas leitoras. Elas estão em alta resolução (cliquem nas imagens para abri-las em tamanho grande), e podem ser usadas para criar capas de DVD customizadas.

A "atração principal" das fitas da distribuidora geralmente era precedida por uma inesquecível vinheta com cenas de vários filmes ao som da música "Winner Takes It All" (de "Falcão, O Campeão dos Campeões"), interpretada por Sammy Hagar.

Um narrador com voz gutural anunciava: "América Vídeo - Onde você encontra filmes com muita energia e alta tensão! Temos as melhores produções, as estrelas mais brilhantes e a coleção mais explosiva de filmes. Oferecemos o que há de mais sensacional e eletrizante, para que você estoure a boca do balão!".


A América Vídeo foi a principal responsável por lançar no país as produções da Cannon Films. Fundada em 1967, a Cannon foi comprada pelos primos israelenses Menahem Golan e Yoram Globus em 1979.

Usando bizarras estratégias de marketing, Golan e Globus praticamente dominaram a indústria do entretenimento de baixo orçamento da década de 80, produzindo aventuras baratas com Chuck Norris, Charles Bronson, Sylvester Stallone, Jean-Claude Van Damme e outros astros menos cotados daquele momento (como Michael Dudikoff e Robert Ginty).

Entre os "clássicos" da Cannon estão a trilogia "Braddock" (estrelada por Chuck Norris), a série "American Ninja", "Stallone Cobra", "Falcão, O Campeão dos Campeões", "Mestres do Universo" (a adaptação a toque de caixa do desenho "He-Man"), "Desejo de Matar 3", "As Minas do Rei Salomão", "O Último Americano Virgem", e muitos outros.


Entretanto, apesar de ser mais cohecida justamente por esses filmes rasteiros, os planos de Golan e Globus eram outros: eles pretendiam usar a grana obtida com as produções mais baratas e "populares" para financiar "filmes de arte" realizados por grandes diretores, sonhando com uma prateleira cheia de Oscars e o respeito da crítica especializada.

Assim, entre uma aventura de Chuck Norris e outra com Charles Bronson, a Cannon financiou e/ou distribuiu obras como "Amantes", de John Cassavetes; "O Ano do Dragão", de Michael Cimino, "Nenhum Passo em Falso", de John Frankenheimer; "Piratas", de Roman Polanski; "Rei Lear", de Jean-Luc Godard; "Otelo", de Franco Zeffirelli, e por aí vai.

Só que a prateleira cheia de Oscars ficou só no sonho, e todas essas produções "artísticas" da Cannon foram retumbantes fracassos de bilheteria. O caso do "Rei Lear" do Godard foi um dos mais engraçados: consta que Golan e Globus não entendiam bulhufas do que o francês estava fazendo, mas confiavam na "marca" Godard; já o diretor enrolou a dupla e fez qualquer coisa só para embolsar o salário no final. A maior parte da crítica não engoliu e taxou o filme de "piada de mau gosto".


O auge da consagração artística da Cannon Films seria o filme holandês "O Ataque", de Fons Rademakers, que ganhou o Oscar e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro em 1987. Fora isso, nenhum dos projetos mais sérios da empresa deu maiores frutos, muito menos grana nas bilheterias.

Por volta desta época, a empresa tinha mais produções por ano do que dinheiro para bancá-las (lançou 43 filmes só em 1986!). E várias apostas equivocadas acabaram decretando a falência da produtora. Entre elas, o salário multimilionário (na época) para Stallone fazer o fracassado "Falcão"; o contrato para três filmes com o diretor Tobe Hooper - "Invasores de Marte", "Força Sinistra" e "O Massacre da Serra Elétrica 2", todos fracassos de bilheteria -, e a produção de "Superman 4" em 1987, cujo orçamento inicial de 36 milhões de dólares foi baixado para 17 milhões durante as filmagens.

Em 1988, Golan e Globus decretaram falência e cancelaram diversos projetos já anunciados, como "Mestres do Universo 2" e uma bastante comentada adaptação para o cinema de "Homem-Aranha", que seria dirigida primeiro por Tobe Hooper, depois por Joseph Zito e finalmente por Albert Pyun. Sobras dos figurinos e cenários dessas duas produções deram origem à aventura "Cyborg - O Dragão do Futuro", de Albert Pyun.


No Brasil, a América Vídeo não se limitou a distribuir apenas as produções da Cannon. Filmes baratos de ação e terror também saíram pelo selo, incluindo tralhas italianas como "Keruak - O Exterminador de Aço", de Sergio Martino, e "Escravas da Corrupção", de Bruno Mattei, além de várias obras da Full Moon, de Charles Band ("O Alien do Mal", "Dollman", "Brinquedos Diabólicos"), e até dois filmes do mestre José Mojica Marins ("Inferno Carnal" e "A Estranha Hospedaria dos Prazeres"), na época em que a febre "Coffin Joe" estava no auge e todo mundo queria faturar o seu em cima...

Mas é óbvio que as capinhas azuis com estrelinhas brancas serão eternamente lembradas pelos filmes bagaceiros de ação e pancadaria. Alguns deles tão ruins que faziam o slogan da América Vídeo soar como ironia. "Nossos filmes explodem como dinamite"? Claro, são mesmo umas bombas!!!

PS: Para saber mais sobre a trajetória da Cannon Films, suas produções e seus projetos arquivados, o lance é procurar pelo documentário "Electric Boogaloo: The Wild, Untold Story of Cannon Films", de Mark Hartley, que está rodando o circuito de festivais e será lançado oficialmente em 2015. Confira o trailer dessa pérola para saudosista nenhum botar defeito clicando aqui.




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