AEROPORTO (1970)
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AEROPORTO (1970)



Muita gente acha que é um modismo dos filmes atuais destruir o mundo com terremotos, maremotos, quedas de meteoros e outras tragédias naturais (ou nem tanto). Mas o chamado "cinema-catástrofe" na verdade é tão velho quanto o próprio cinema: algumas semanas depois do terrível naufrágio do Titanic, no longínquo ano de 1912, produtores alemães já lançavam a primeira versão cinematográfica da tragédia, "In Nacht und Eis" - ou seja, 85 anos antes de James Cameron filmar aquela sua superestimada versão do mesmo naufrágio, em 1997.

Já o norte-americano "Deluge", de 1933, mostrava Nova York sendo destruída por um maremoto 71 anos antes de Roland Emmerich fazer o mesmo em "O Dia Depois de Amanhã" (2004), com direito a cena muito parecida da Estátua da Liberdade desaparecendo em meio às ondas gigantescas! E isso só para citar dois exemplos mais conhecidos, tem muita coisa por aí para ser redescoberta.


Mas foi mesmo na década de 70 que o "cinema-catástrofe" atingiu o auge da popularidade (e lucratividade). E a maioria dos pesquisadores/historiadores do assunto concorda que isso aconteceu por causa de AEROPORTO, uma superprodução da Universal Pictures que chegou aos cinemas em 1970, e teve o então astronômico orçamento de 10 milhões de dólares.

Não seria exagero dizer que, na época em que foi feito, AEROPORTO era uma blockbuster tão caro e megalomaníaco quanto o "Titanic" de James Cameron. E, assim como este, também foi um sucesso estrondoso no mundo inteiro, faturando mais de 100 milhões de dólares só nos cinemas norte-americanos - ou, em valores atualizados,  558 milhões de dólares, tornando-o o 42º filme mais rentável de todos os tempos!


O sucesso de bilheteria comprovou que a equação "astros famosos + grande tragédia + melodrama" podia ser bem rentável. E não demorou para os grandes estúdios começarem a investir em todo tipo de superprodução nessa linha: "O Destino do Poseidon", "Inferno na Torre", "Terremoto", "O Dirigível Hindenburg", "O Enxame", e por aí vai.

O próprio AEROPORTO virou uma franquia, com três continuações que não eram exatamente continuações, mas sim recriações do mesmo "suspense aéreo" do original. Ao invés de "Parte 2" ou "Parte 3" no título, as sequências passaram a ser batizadas com o ano em que foram realizadas (!!!): "Aeroporto 75", "Aeroporto 77" e, finalmente, "Aeroporto 80 - O Concorde". Ou seja, uma década inteira explorando o eterno medo de voar, já que os quatro filmes foram produzidos entre 1970 e 79.


O mais curioso é que AEROPORTO nem foi o primeiro filme sobre aviões em perigo, embora seja lembrado assim até hoje. Nos anos 50, quando o transporte aéreo de passageiros ainda era coisa de luxo e as aeronaves bem menores, várias produções exploraram o potencial "desastroso" do meio de transporte: "No Highway in the Sky / Na Estrada do Céu" (1951), de Henry Koster, trazia James Stewart como um engenheiro da aeronáutica preocupado com uma possível tragédia durante os testes de um novo avião de transporte; "The High and the Mighty / Um Fio de Esperança" (1954), de William A. Wellman, trazia John Wayne como o co-piloto que precisa assumir o comando de um avião de passageiros com problemas mecânicos; "Zero Hour! / Entre a Vida e a Morte" (1957), de Hall Bartlett, mostrava um avião abandonado à própria sorte quando a tripulação é envenenada pela comida de bordo (o mesmo argumento seria usado anos depois na comédia "Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu!"), e "Crash Landing" (1958), de Fred F. Sears, enfocava o drama de passageiros de um velho DC-7 na iminência de um pouso de emergência em pleno oceano.


Já dez anos antes de AEROPORTO, em 1960, estreou "The Crowded Sky / Céu de Agonia", de Joseph Pevney, cuja linha narrativa é muito parecida com a deste blockbuster da Universal: um jato militar entra em rota de colisão com um avião comercial e, com a tragédia iminente, acompanhamos os dramas pessoais da tripulação e dos passageiros. Mas nenhum desses filmes anteriores chegou perto do sucesso do seu "parente" mais famoso.

Confesso aos nobres leitores do FILMES PARA DOIDOS que morro de medo de voar. A bem da verdade, só apelo para o transporte aéreo em último caso; se não há pressa para chegar ao destino, opto pelo velho e bom ônibus. Já encarei viagens de 18 horas de busão que poderiam ter sido feitas em apenas 1h30min via aérea. Mas, acredite ou não, fiquei mais tranquilo passando quase um dia inteiro na estrada do que menos de duas horas no ar.

E sim, eu sei que a probabilidade de sofrer um acidente na estrada é muito maior do que a de sofrer um acidente aéreo. Porém nada me tira da cabeça que você tem bastante chance de sobreviver a uma colisão automobilística, mas ao mesmo tempo não tem nenhuma chance de escapar caso o avião caia. Portanto, por via das dúvidas, prefiro ficar no chão, em terra firme, sempre que possível.


Por causa desse medo de avião, a série "Aeroporto" deveria ser totalmente horripilante para mim, certo? Errado! Apesar de muitos imaginarem que AEROPORTO e suas sequências são filmes sobre tragédias aéreas, as quatro obras podem ser melhor definidas como melodramas insossos, que mais comprovam a segurança do transporte aéreo do que exploram os seus riscos. Afinal, nos quatro filmes, os passageiros geralmente escapam ilesos aos maiores desastres (menos os vilões, é claro) graças à perícia dos pilotos-heróis, à assessoria das equipes de terra e à tecnologia dos aviões, que podem ser controlados até por... aeromoças?!?

Sem medo de ser injusto, eu diria que nenhum dos quatro filmes da série "Aeroporto" têm algo tão assustador quanto a cena do desastre aéreo no início de "Premonição". Essa sim me dá calafrios toda vez que revejo, e inclusive eu lembro apavorado dessa maldita cena toda vez que sou obrigado a entrar num avião!


Mas a verdade é que qualquer turbulência leve numa viagem aérea verdadeira é muito mais emocionante e assustadora do que tudo que foi mostrado nesta franquia clássica da Era de Ouro dos "Disaster Movies". Mesmo assim, resolvi enfrentar meus próprios medos e "presentear" o leitor do FILMES PARA DOIDOS com esta rápida "Maratona Aeroporto".

Serão cinco atualizações diárias com os quatro filmes da série "Aeroporto" e um quinto filme bastardo, "Concorde", que não faz parte da franquia da Universal e foi produzido na Itália (claro...) para aproveitar o lucrativo filão. Então aperte os cintos e prepare-se para a decolagem com AEROPORTO, o primeiro título da franquia e o suposto responsável pelo início da onda de cinema-catástrofe dos anos 70!


AEROPORTO começou como um best-seller escrito por Arthur Hailey, que foi publicado dois anos antes, em 1968. Foi o segundo trabalho do autor envolvendo desastre aéreo: nos anos 50, Hailey escreveu o roteiro de um telefilme para a emissora canadense CBC chamado "Flight Into Danger" (1956); no ano seguinte, este mesmo roteiro virou o longa "Zero Hour!", que eu citei lá atrás, e em 1958 foi publicado como livro chamado "Flight Into Danger: Runway Zero-Eight".

"Aeroporto", o romance, era um calhamaço de quase 500 páginas sobre os dramas pessoais e profissionais vividos pelos profissionais que trabalham no Lincoln International Airport, um aeroporto fictício de Chicago. A adaptação para o cinema foi feita pelo também diretor George Seaton, e você percebe a dificuldade que foi condensar as 500 páginas em pouco mais de duas horas pela quantidade de personagens e acontecimentos vistos na tela.


Como no livro, o personagem central de AEROPORTO é o diretor de operações do Lincoln International Airport, Mel Bakersfeld (interpretado por Burt Lancaster). Mel precisa lidar com uma cacetada de problemas ao mesmo tempo: uma grande nevasca, a pior em muitos anos, está dificultando as operações no aeroporto; um avião que pousava ficou atolado na neve, obstruindo a principal pista de aterrissagem e exigindo sua retirada imediata; moradores de uma área próxima protestam por causa do barulho das decolagens; uma velhinha golpista (Helen Hayes) está voando sem pagar; sua esposa (Dana Wynter), negligenciada por causa do excesso de trabalho, ameaça pedir divórcio, e sua assistente Tanya (Jean Seberg), por quem ele é secretamente apaixonado, está prestes a pedir transferência para San Francisco.

Quando parece que a coisa não pode piorar, nosso herói recebe uma notícia bombástica, nesse caso literalmente: o voo da fictícia Trans Global Airlines, que acabou de sair do aeroporto com destino a Roma, leva como passageiro um psicótico, Guerrero (Van Heflin), que pretende explodir o avião com uma bomba durante a travessia do Atlântico, eliminando assim os vestígios da sabotagem para que sua esposa ganhe os milhões do seguro de vida que ele fez na véspera da viagem!


No interior do desafortunado voo, a tripulação já tem seus próprios problemas ALÉM da ameaça de bomba. Afinal, uma das regras de ouro do cinema-catástrofe dos anos 70 era colocar o máximo possível de personagens secundários com dramas pessoais a desenvolver, e por isso o co-piloto interpretado por Dean Martin (!!!) está dividido entre a esposa (que é irmã de Mel!!!) e a amante aeromoça grávida (Jacqueline Bisset), a quem ele pediu que faça um aborto, numa época em que o tema ainda era tabu (ou MAIS tabu).

E é claro que, embora os tripulantes tentem resolver o problema da bomba pacificamente, a dita cuja acabará indo pelos ares, abrindo um rombo na fuselagem da aeronave e provocando sua despressurização. A aeromoça amante do co-piloto fica gravemente ferida e a tripulação precisa voltar a Chicago para um pouso de emergência... mas apenas se Mel conseguir liberar a pista obstruída por aquele outro avião atolado! Sentiu o drama?


Confesso que só fui assistir AEROPORTO agora, mais de 40 anos depois do seu lançamento, e fiquei bastante frustrado com o pouco tempo que a história se passa no fatídico voo. Isso porque o foco da trama, como acontecia no livro de Hailey, fica mais no pessoal que trabalha em terra, no aeroporto, principalmente Mel, que precisa lidar de uma única vez e rapidamente com todos os problemas do filme, e ainda garantir o pouso em segurança da aeronave ameaçada.

Bem, justiça seja feita: o nome do filme é AEROPORTO, e não "Avião"! Isso justifica o fato de a trama ficar mais concentrada na equipe de terra do que no ar. Para o leitor ter uma ideia, o avião só decola depois que já passaram-se 50 minutos de filme, e as cenas de "tensão aérea" mal somam meia hora dos 137 minutos de projeção!


Assim, a maior parte da ação transcorre no aeroporto, cujas cenas foram filmadas no Minneapolis-Saint Paul International Airport, em Minnesota. E uma grande qualidade do filme é a forma como ele detalha o trabalho dos pilotos e das equipes de emergência - exemplo: a cena em que uma mensagem cifrada é transmitida pelos alto-falantes do aeroporto para reunir todos os agentes de segurança sem provocar pânico generalizado.

Nos filmes seguintes da série, as histórias dariam muito mais destaque à ameaça no interior do próprio avião, e como ela afeta tripulação e passageiros, situando-se por menos tempo no aeroporto em si. Ao optar pelo contrário disso, AEROPORTO mal pode ser considerado um "filme-catástrofe", já que sequer há uma grande tragédia e praticamente ninguém morre (além do sujeito que detona a bomba e vai para os ares junto com ela).


Eu até diria que o filme que iniciou a Era de Ouro do Cinema-Catástrofe é mais melodrama do que cinema-catástrofe! E considerando que os episódios posteriores vão direto ao assunto, e seus aviões geralmente decolam e se dão mal ainda nos primeiros 20 minutos, AEROPORTO é o título que eu menos gosto da quadrilogia, num daqueles casos raros de "sequências melhores que o original".

Mas não me interprete mal: analisando friamente todos eles são muito ruins, com a diferença de que os três posteriores são mais divertidos, mais puxados para o tom de "aventura absurda", e sem tanta enrolação quanto esse aqui. Em alguns momentos, o filme força tanto a barra no dramalhão que fica a impressão de estarmos assistindo uma novela mexicana, e os dramas pessoais dos personagens nem são tão emocionantes assim.

E se parece que o roteiro já tem situações e personagens demais, saiba que a adaptação deu até uma resumida no livro de Arthur Hailey: um irmão de Mel que trabalha como controlador de tráfego aéreo, e que tinha grande participação na história do livro, felizmente foi limado do filme!


Se AEROPORTO tem seus méritos pela maneira realista como apresenta as operações num aeroporto, por outro lado fica difícil levar a sério uma história que tem uma velhinha larápia cujo hobby é voar de graça e um piloto de avião sério e heróico interpretado pelo lendário "Dino" Martin, geralmente associado a personagens bonachões como Matt Helm, ou a suas parcerias com Jerry Lewis, além de ser popularmente associado ao alcoolismo. Portanto, quem confiaria num avião pilotado por Dean Martin?

Além disso, é completamente impossível levar a sério o personagem do psicótico com a bomba, já que fica claro desde que o sujeito entra no avião que ele vai aprontar alguma - sempre suando, sempre nervoso, com olhos esbugalhados e segurando contra o peito uma maleta de mão contendo a bomba. Quer dizer, o sujeito é tão suspeito que é um verdadeiro milagre que tenha conseguido ENTRAR NO AVIÃO em primeiro lugar, quem dirá ficar incógnito entre os demais passageiros!


E o que dizer do fato de haver três médicos a bordo do avião para cuidar dos feridos (com direito a maletas contendo injeções de adrenalina, como se todo médico viajasse preparado para salvar pessoas da morte), ou do dano bastante limitado provocado pela explosão da bomba a bordo?

Outro problema grave é que AEROPORTO parece querer abraçar o mundo, com muita história para contar e muitas intrigas secundárias que pouco ou nada acrescentam. Se só a situação do avião ameaçado pela bomba já seria suficiente para um filme do gênero, por que perder tanto tempo com a outra aeronave emperrada na pista, com os protestos dos moradores vizinhos e com a esposa do protagonista pedindo o divórcio? Essas situações todas só emperram a trama, fazendo com que a bomba no avião acabe se tornando o menor dos problemas do protagonista.


Para "ganhar tempo" com tantas situações para desenvolver, o diretor Seaton usou e abusou de um recurso que ainda era relativamente novo na época, mas hoje já virou clichê: o chamado "split screen", que consiste em dividir a tela para mostrar ao mesmo tempo personagens que estão em lugares diferentes, durante ligações telefônicas ou transmissões de rádio.

Isso rende alguns momentos visualmente curiosos, como quando Mel liga para casa e fala com a esposa e as filhas, cada uma em seu pequeno "quadrinho" de split screen; ou na já citada cena em que os agentes de segurança do aeroporto são alertados via auto-falante.

Obviamente, um recurso como esse só funciona na versão original do filme, com formato de tela em widescreen. Por isso, quando AEROPORTO foi exibido na TV e a imagem teve que ser adaptada para "tela cheia" (com cortes nas laterais para que tudo coubesse na tela da televisão, sem as famigeradas faixas pretas), muitas dessas cenas em split screen foram "desmanchadas" e transformadas no tradicional "plano e contraplano".


Dos quatro filmes da série oficial, AEROPORTO é o mais "sério" e realista, e talvez por isso mesmo eu ache mais fraco em comparação com o divertidíssimo fator trash das continuações. Além disso, o roteiro não se decide: ora é ultra-moralista (o único a morrer é o psicótico que leva a bomba ao avião, e o piloto interpretado por Dino logo se convence que é melhor assumir o bebê da amante a obrigá-la a fazer aborto), ora é extremamente hipócrita, passando a mensagem de que todos os problemas de um homem podem ser resolvidos caso ele abandone sua esposa e fique com uma garota mais nova (dois dos personagens principais fazem isso e têm direito a um "final feliz" longe das esposas megeras!).

Mesmo assim, AEROPORTO chegou a enganar os críticos na época do seu lançamento, ganhando muitas resenhas favoráveis, e foi indicado (pasmem) a 10 Oscars: Melhor Filme, Roteiro Adaptado, Trilha Sonora, Som, Edição, Figurino, Fotografia, Direção de Arte e Atriz Coadjuvante, com duas indicações (para Maureen Stapleton e Helen Hayes).


Ao contrário da rapa que aquele outro filme-catástrofe, "Titanic", faria em 1997, AEROPORTO faturou apenas uma das estatuetas, a de Melhor Coadjuvante para Helen Hayes, mas Maureen pôde se conformar com um Globo de Ouro pela sua performance (e nem deveria, pois, como a esposa do homem da bomba, sua atuação é exagerada e quase constrangedora).

Já a veterana Helen Hayes (abaixo), que estava com 70 anos na ocasião, interpreta uma espécie de alívio cômico (a velhinha trambiqueira) num filme que pretendia ser sério e tenso. Ela vinha dos tempos do cinema mudo (seu primeiro filme é de 1917!!!), e já tinha ganhado outro Oscar, esse como Melhor Atriz, em 1931, graças à sua atuação em "The Sin of Madelon Claudet". Falecida em 1993 (sendo que fez filmes até 1985!), Helen foi a primeira de diversos veteranos e veteranas que apareceriam nos filmes posteriores da franquia.


Entre as demais caras conhecidas do elenco, além vale destacar ainda as presenças de Barry Nelson (o primeiro ator a interpretar 007, na versão televisiva de "Cassino Royale"), como o piloto do avião ameaçado pela bomba, e de George Kennedy como o mecânico Joe Patroni, o encarregado de "desencalhar" o avião que está obstruindo a pista de pouso do aeroporto.

Por sinal, coube a Kennedy a "honra" de ser o único ator a participar dos quatro filmes oficiais da série, já que Patroni voltou nas continuações, e em uma delas foi até absurdamente promovido de mecânico a piloto (!!!).


Essa receita de unir astros da época e de outrora provou ser uma das razões do sucesso de AEROPORTO, e a partir de então todo filme-catástrofe digno dessa categoria buscaria juntar elencos milionários e cheios de nomes conhecidos, inclusive o pessoal da antiga que já não conseguia mais trabalho e tinha neste subgênero o seu "canto de cisne".

AEROPORTO também lançou uma regra que se repetiria em todas as continuações: os astros que lamentam ter feito parte da bagaça. Aqui, a honra coube ao respeitado Burt Lancaster. Embora sua interpretação seja convincente, o astro declarou o seguinte em entrevista da época: "Não sei porque 'Aeroporto' foi indicado a tantos Oscars. É o maior lixo já produzido!"


No livro "Against Type: The Biography of Burt Lancaster", o escritor Gary Fishgall lembra que o astro vivia tempos difíceis na época das filmagens, pois estava se divorciando da esposa Norma Anderson (com quem era casado desde 1946 e tinha cinco filhos), e ainda participava ativamente dos protestos anti-Guerra do Vietnã.

Entrevistado por Fishgall para o livro, o produtor de AEROPORTO, Ross Hunter, lembrou como foi sua relação com Lancaster: "Ele era muito profissional, mas acho que não tinha o menor interesse no filme, e isso me incomodava, porque eu nunca tinha trabalhado com pessoas que faziam um filme sem gostar dele. Burt foi o único integrante do elenco que nunca disse 'obrigado', não foi à festa no final das filmagens e nunca fez nada para promover o filme. Eu até pensei comigo mesmo: 'Você é um idiota, devia ter contratado outro ator!'".


Ironicamente, o sucesso comercial da produção rendeu tanto a Lancaster quanto ao seu colega de elenco Dean Martin uma fortuna considerável. Acontece que ambos foram espertinhos e colocaram cláusulas em seus contratos assegurando, além do salário habitual, o direito de receber 10% da bilheteria caso o filme fosse um sucesso.

E considerando que AEROPORTO está na lista das 50 produções mais lucrativas da história, ambos faturaram uma bela grana - Dino costumava dizer que ganhou 7 milhões de dólares ALÉM do seu cachê normal. Que barbada, hein?


O grande problema de ver AEROPORTO hoje é que ele foi tão avacalhado no hilário "Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu!" (1980), de Jim Abrahams e David e Jerry Zucker, que fica muito difícil levá-lo a sério. Por exemplo: todo o plot do maluco querendo explodir a bomba no avião para que sua família ganhe o dinheiro do seguro virou piada na continuação "Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu 2!" (1982), repetindo até diálogos e ângulos de câmera!

Embora não tenha nada de comédia, AEROPORTO acaba se tornando involuntariamente engraçado graças aos muitos diálogos pretensiosos ou sem-noção entre os personagens. Num deles, a velhinha vigarista exalta as qualidades como violinista do seu falecido marido: "Ele era tão bom que tocava a Valsa do Minuto em 58 segundos". Em outro, dois técnicos de aviação discutem sobre um procedimento arriscado: "O livro de instruções diz que isso é impossível", queixa-se o primeiro, e o segundo retruca "Bem, um 707 pode fazer qualquer coisa, menos ler!".


E o que dizer da resposta engraçadinha do piloto em um momento que deveria ser tenso: "Se o avião se partir no meio, eu espero que você tenha oito milhões para pagar por ele!". Essas bobagens ajudam a transformar o filme numa espécie de comédia fanfarrona, e fico imaginando se alguém algum dia levou o filme a sério.

Tecnicamente, pelo menos, o filme faz jus ao seu orçamento milionário: as cenas de nevasca são impressionantes pelo realismo, e isso que a produção teve que apelar para neve artificial quando o clima não ajudou na hora de gravar as externas. Consta que algumas dessas cenas de nevasca foram filmadas por Henry Hathaway, o diretor de "Bravura Indômita", como um favor para o produtor Hunter, e sem ganhar crédito.


Várias cópias de AEROPORTO foram produzidas desde então, a maioria abaixo da crítica e sem repetir o mesmo sucesso. No final da década de 1990, houve até uma tentativa de resgatar o climão da série com a trilogia "Turbulência" (o original é de 1997, e as duas continuações horríveis de 1999 e 2001).

Claro que os efeitos especiais são melhores e permitem criar cenas bem mais tensas do que aquelas produzidas nos anos 70, e o elenco desses novos filmes também mistura atores famosos com outros conhecidos (Ray Liotta, Lauren Holly, Jennifer Beals, Tom Berenger, Gabrielle Anwar, Rutger Hauer, Joe Mantegna e Craig Sheffer foram alguns dos que pagaram mico nessa trilogia). Mas não deu muito certo, e sequer chegou perto do estrondoso sucesso de bilheteria de AEROPORTO e suas continuações.


Por fim, numa daquelas ironias estilo "A vida imita a arte", o mesmo avião que nas telas resistiu a uma explosão e a uma aterrissagem difícil foi personagem principal de um grande desastre aéreo da vida real... e aqui no Brasil! Acontece que a mesma aeronave usada em AEROPORTO (um Boeing 707 de prefixo PT-TCS, pertencente à empresa Flying Tiger Line) tinha sido adquirida pela extinta Transbrasil para o transporte de cargas na rota São Paulo-Manaus.

Em 21 de março de 1989, o então rebatizado Voo Transbrasil 801 caiu durante o pouso no  Aeroporto de Guarulhos, atingindo a favela do Jardim Ipanema, a cerca de três quilômetros da pista. A aeronave não levava passageiros, mas estava carregada com 26 toneladas de equipamentos eletrônicos provenientes da Zona Franca de Manaus. O combustível explodiu com a queda, destruindo o famoso avião de AEROPORTO e matando os seus três tripulantes e mais 22 pessoas em terra, além de deixar centenas de feridos.

É nessas horas que faz falta um Burt Lancaster ou Dean Martin para salvar o dia...


Trailer de AEROPORTO



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Airport (1970, EUA)
Direção: George Seaton
Elenco: Burt Lancaster, Dean Martin, Jean Seberg,
Helen Hayes, Jacqueline Bisset, George Kennedy,
Van Heflin, Barry Nelson e Maureen Stapleton.



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