O MASSACRE DOS BARBYS (1996)
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O MASSACRE DOS BARBYS (1996)



A década de 1990 não foi das melhores para Jess Franco.

Por aqueles anos, vários dos seus antigos colaboradores começaram a morrer, incluindo seu ator-fetiche Howard Vernon, seu antigo produtor Karl Heinz Mannchen e os compositores Daniel J. White e Bruno Nicolai.

Houve também uma mudança de mercado: se antes os filmes classe Z que ele vinha dirigindo encontravam espaço em pequenos cinemas de bairro, a partir dos anos 90 essas obras não conseguiam mais exibição e começaram a sair direto em vídeo (algumas mal foram distribuídas fora da Europa).

Para piorar, na virada das décadas, Franco quebrou o pau com seus financiadores mais antigos (os irmãos Marius e Daniel Lesoeur, da produtora francesa Eurociné), durante a pós-produção do insosso drama de guerra "La Chute des Aigles / Fall of the Eagles" (1990), que se tornaria seu último trabalho para a empresa - e um dos mais fracos, apesar do curioso elenco que reunia Christopher Lee e Mark Hamill!

Assim, depois de mais dois filmes rodados a muito custo na Espanha e co-produzidos pelo próprio diretor, um deles nunca finalizado e nunca lançado ("La Jungla del Miedo", de 1994, inspirado no conto "O Escaravelho de Ouro", de Edgar Allan Poe), a carreira de Jess teve um hiato de dois anos sem trabalhar, entre 1994 e 1996 - algo inacreditável para alguém que, nos bons tempos, fazia de cinco a oito filmes POR ANO.

Parecia que o velho Jess Franco, então com 66 anos de idade, estava destinado a uma aposentadoria forçada...


É nesse ponto que entra na história uma banda punk espanhola chamada The Killer Barbies, fundada em 1994 (coincidentemente o ano em que Jess parou de filmar) por Silvia Superstar (Silvia García Pintos, na certidão de batismo) e Billy King (nome verdadeiro: Antonio Domínguez), respectivamente vocalista e baterista do grupo.

Seguindo uma proposta pouco original que já vinha sendo desenvolvida por bandas bem mais famosas (como Misfits e White Zombie), a The Killer Barbies se inspirava no cinema de horror classe B e na cultura trash dos filmes da Troma e de John Waters para fazer seus figurinos e músicas - que têm títulos como "They Come From Mars", "Family is Chainsaw" e "I Wanna Live in Tromaville".


Não se sabe exatamente como Jess Franco tomou conhecimento da existência da The Killer Barbies, já que ele não me parece um sujeito que teria afinidade com a cena punk independente espanhola da década de noventa.

Seja como for, o diretor ouviu o primeiro CD da banda ("Dressed to Kiss", 1995) e resolveu que iria encaixá-los no projeto que estava preparando justamente para sair da aposentadoria. Assim nasceu KILLER BARBYS, rebatizado O MASSACRE DOS BARBYS no Brasil. O nome da banda foi alterado apenas no título, de "Barbies" para "Barbys", para evitar problemas judiciais com a Mattel, a empresa fabricante da famosa boneca.


O roteiro que o próprio Franco já vinha preparando não tinha nada a ver com bandas de punk rock: era sobre turistas que erravam o caminho e iam parar no tradicional castelo sinistro. Quando a The Killer Barbies entrou na jogada, Jess adaptou a trama para encaixar a própria banda no lugar dos anônimos turistas.

Assim, os Barbies ganharam uma distinção normalmente reservada a bandas e cantores bem conhecidos (para citar alguns exemplos: Beatles, Kiss, Ramones, Roberto Carlos, Alice Cooper ou Spice Girls), que é a de estrelar um filme próprio "interpretando" eles mesmos!


Acabou sendo um bom negócio para ambos. Jess Franco conseguiu voltar ao mercado, pois a participação de uma banda razoavelmente conhecida na Espanha e países vizinhos atraiu um novo público que não estava interessado nas presepadas que ele vinha filmando nos últimos tempos.

Para os Barbies, foi não só a oportunidade de fazer um filme com um diretor cult que admiravam, mas ainda uma incrível auto-promoção, já que a banda aparece no palco e "atuando", e suas músicas tocam o filme inteiro. Uma delas, "Love Killer", chega a repetir cinco vezes, pelo menos enquanto eu ainda estava contando!


O MASSACRE DOS BARBYS começa com um show da banda, que aparece com dois de seus integrantes reais (Silvia e Billy) e outros três fictícios, o baixista Mario (Charlie S. Chaplin, que, segundo a lenda, seria parente distante de Charles Chaplin), o guitarrista Rafa (Carlos Subterfuge) e a go go dancer Sharon (Angie Barea).

A vocalista gracinha aparece cantando apenas de biquíni, e a banda toca duas músicas bem curtinhas (punk rock, sabe como é...), sendo que uma delas é a tal "Love Killer". Prepare-se para decorar a letra ("I love you / I love you / I gonna kill you tonight!") antes da metade do filme, de tanto que ela vai tocar pela próxima meia hora...


Depois do show, o grupo cai na estrada, em sua van personalizada, rumo a uma cidade próxima, onde farão apresentação no dia seguinte. Porém, como O MASSACRE DOS BARBYS é um filme de horror, é claro que os músicos vão pegar um atalho suspeito no meio da madrugada e acabar numa estrada deserta, onde eventualmente a van apresentará problemas.

É quando aparece um homem bem vestido e solícito chamado Arkan (o veterano Aldo Sambrell), que oferece comida e um teto para os Barbies (ou "Barbys") passarem a noite enquanto esperam a chegada do mecânico no dia seguinte.


A maior parte da banda aceita o convite - eles podem se declarar fãs de horror, mas pelo jeito não aprenderam nada nos filmes que viram! -, enquanto dois deles, Rafa e Sharon, preferem ficar na van transando sem parar.

Arkan leva os músicos restantes até um casarão típico de filme de terror, com muita neblina do lado de fora e diversos objetos de cena bem suspeitos do lado de dentro (incluindo quadros antigos e sinistros). Ali mora a misteriosa Condessa Von Fledermaus (palavra alemã para "morcego"), que, segundo Arkan, é uma mulher muito doente e vive acamada.


Pelo restante da noite, os músicos ficarão zanzando pelo interior do casarão falando e fazendo idiotices, enquanto Arkan e um excêntrico aliado, Baltasar (o ator-diretor cult Santiago Segura, de "O Dia da Besta" e da série "Torrente"), planejam o anunciado "Massacre dos Barbys" do título em português.

Acontece que a tal Condessa Von Fledermaus descobriu o segredo para a vida e juventude eternas: uma mistura de sangue e esperma retirados direto da fonte! E adivinhe quem serão os próximos "doadores"?


O resultado desta autêntica brincadeira musical é bastante irregular: O MASSACRE DOS BARBYS tem mais cara de ser um grande videoclipão ou music video em que alguém resolveu colocar uma história para enrolar entre uma música e outra - como se você pegasse o famoso clipe "Thriller", do Michael Jackson, e filmasse uma hora adicional com personagens fazendo e falando bobagem antes da música começar.

Sendo Jess Franco um grande fã de música, e ele mesmo um músico (tocava piano e trompete semi-profissionalmente), é bem vagabunda a forma como o som da The Killer Barbies é aproveitado no filme. Embora a própria banda apareça como protagonistas, raramente eles são vistos cantando ou tocando; a música simplesmente toca no fundo das cenas, de maneira repetitiva e sem muito critério.


Como se fosse um autêntico videoclipe, há um distanciamento muito grande (talvez proposital, talvez não) entre a banda e tudo que acontece com eles. Jess não parece muito inspirado e simplesmente vai jogando na tela os elementos e clichês mais diversos (vampirismo, vida eterna, slasher movies, casarão sinistro, canibalismo, direção de arte bizarra e até anões!), torcendo para o conjunto dar certo no final.

Mas não dá tão certo assim, já que não há um mínimo de tensão ou suspense, e o filme demora uma eternidade para começar a engrenar. Sem saber o que fazer com seus protagonistas, Franco precisa enrolar do jeito que dá: a interação entre os Barbies é mínima, e deles com os outros personagens menor ainda. Por isso, o espectador não consegue criar qualquer vínculo com os personagens ou se importar com o que vê. E há erros infantis dignos de Ed Wood, tipo noite que vira dia e vice-versa.


Chega um ponto em que O MASSACRE DOS BARBYS começa a se tornar arrastado e realmente estúpido. Por exemplo, há uma cena em que o casal que trepa na van é espionado por Baltasar e seus anões, mas eles não fazem nada além de espiar. Aí os namorados resolvem sair da van e caminhar até o casarão para encontrar os amigos. Finalmente, o mesmo casal volta para a van (de onde só saiu para esticar a história) e RECOMEÇA A TREPAR, quando finalmente são atacados e mortos por Baltasar e Arkan! É mole?

Aliás, considerando que o grande plano dos vilões é matar os jovens desde o começo para alimentar a Condessa, demora uma eternidade para que algo nesse sentido finalmente aconteça, pois Arkan prefere deixar os protagonistas à vontade para zanzar pela casarão, tomar banho, dormir, mexer na mobília, e até os convida para jantar! Mata logo enquanto eles estão separados, caramba!


Jess nunca foi considerado um cineasta "gore", e tem pouquíssimos filmes realmente sangrentos/violentos no seu currículo ("Jack The Ripper", "Bloody Moon" e "Sem Face" são os principais representantes da categoria).

O MASSACRE DOS BARBYS felizmente traz uma boa dose de violência explícita e efeitos de maquiagem, com cabeças cortadas, cérebros arrancados e corpos pendurados em ganchos de carne. Nem todos os efeitos são convincentes, mas já é alguma coisa.


Na época do lançamento de "Arraste-me para o Inferno" (2009), de Sam Raimi, muito foi dito sobre uma cena em que a fantasma é atingida na cabeça por uma bigorna, e como isso remetia ao clima absurdo dos desenhos animados. Houve até quem chamasse Raimi de "gênio" por causa da cena, embora eu ache o filme bem meia-boca.

Pois O MASSACRE DOS BARBYS já traz uma brincadeira semelhante com o universo dos desenhos animados mais de dez anos antes de Raimi e sua bigorna, que é quando Billy King mata um dos vilões atropelando-o com... um rolo compressor?!? E não me pergunte onde foi que o sujeito encontrou um rolo compressor, o que importa é que Franco mostra até o cadáver achatado e ensanguentado da vítima depois do atropelamento, como se fosse uma versão da Troma para um desenho dos Looney Tunes!


Além da violência, Jess não perde a oportunidade de pelar a mulherada. Só a estrelinha Silvia Superstar aparentemente não quis fazer cenas de nudez - o que é irônico, já que ela posa o tempo todo de liberal e sex symbol. Mas o diretor compensa colocando-a sempre com as roupas mais curtas possíveis, e ela também passa toda a metade final correndo pra lá e pra lá apenas de calcinha vermelha e blusa cortada em cima do umbigo.

As outras duas mulheres do elenco não regulam: a go go dancer interpretada por Angie Barea inclusive protagoniza uma das grandes cenas do filme, quando é perseguida por Baltasar e Arkan e precisa correr completamente pelada pela floresta, vestindo apenas botas prateadas!


A grande surpresa é a nudez da terceira representante feminina de O MASSACRE DOS BARBYS, que é a própria Condessa Von Fledermaus, interpretada por... Mariangela Giordano! Caso não tenha caído a ficha, Mariangela é uma veterana atriz italiana que já havia mostrado o corpão em clássicos do cine-podreira dos anos 70-80 como "Patrick Vive Ancora", de Mario Landi, e principalmente "Burial Ground", de Andrea Bianchi, em que protagoniza uma famosíssima cena em que tem o seio arrancado a dentadas pelo próprio filho zumbificado!

À época das filmagens, a atriz já estava com 59 anos. Porém, sem nenhuma frescura, Mariangela comprova que continua em forma e aparece peladona frente e verso, dando um banho nas duas "molequinhas" com quem divide os créditos. Se a tal poção da juventude eterna utilizada pela Condessa do filme realmente existe, então Mariangela Giordano certamente a conhece!


No fim, O MASSACRE DOS BARBYS passa longe de ser um grande filme (e mesmo de um memorável), mas acho que vale simplesmente por reunir tanta gente boa e diferente num mesmo projeto - Franco, os Barbies, Sambrell, Santiago Segura e, claro, a deusa Mariangela Giordano. Definitivamente, não é o tipo de coisa que se vê todos os dias.

Também é legal ver os músicos entrando no espírito da coisa, se sujando de sangue falso e até aparecendo com pouca roupa. Isso me lembrou a hilária participação da banda punk Offspring em "A Mão Assassina" (1999), quando o vocalista Dexter Holland tem seu escalpo arrancado pela dita cuja.


Apesar de ter recebido um lançamento limitado nos cinemas (foi o último filme de Franco na telona até 2013 e "Al Pereira Vs. the Alligator Ladies"), o resultado não chegou a dar o esperado upgrade na carreira de Jess. Inclusive este foi um dos últimos filmes que ele rodou em película, junto com o posterior "Tender Flesh", de 1997.

A partir de 1998, Franco começaria a sua fase mais fraquinha (que durou até sua morte, em 2013), quando gravou mais de 20 filmes em vídeo digital, com produção paupérrima, para lançamento direto em DVD. Pouco ou nada de bom saiu dali, e o diretor abandonou a narrativa convencional para entregar-se a produções mais experimentais e pouco memoráveis.


Jess e os Barbies voltariam a trabalhar juntos nessa fase negra, em "Killer Barbys vs. Dracula", filmado em 2002. Se O MASSACRE DOS BARBYS já tinha cara de music video, este segundo trabalho assume-se como um: simplesmente mostra cenas de um show da banda enquanto um ator vestido como Drácula fica zanzando pelo cenário. Sem contar que todas as cenas foram filmadas de dia e depois "escurecidas" através de um efeito digital vagabundo. O único mérito de "Killer Barbys vs. Dracula" é trazer no elenco outro veterano do cinema italiano, Peter Martell (nome de batismo: Pietro Martellanza), que era astro nos tempos do western spaghetti e estava completamente esquecido. Ele faleceu em 2010.


Embora passe longe de ser um filme bom, O MASSACRE DOS BARBYS é, provavelmente, o último trabalho assistível de Jess Franco, antes da sua prolixa fase experimental e de bombas tipo "Lust for Frankenstein" (1998) e "Dr. Wong's Virtual Hell" (1999). Visto com pouca ou nenhuma expectativa, pode divertir e até surpreender.

Se não pela história cheia de clichês e lugares comuns, pelo menos pela presença da The Killer Barbies, sua vocalista gracinha e seu "punk rock pop" divertido e grudento. É realmente muito difícil não sair cantarolando "Love Killer" depois das inúmeras vezes que a música toca, e o refrão "I love you / I love you / I gonna kill you tonight!" acaba sendo mais memorável que o próprio filme!

PS: Lina Romay, esposa e musa do diretor, assina a edição.


Trailer de O MASSACRE DOS BARBYS



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Killer Barbys (1996, Espanha)
Direção: Jess Franco
Elenco: The Killer Barbies, Aldo Sambrell, Santiago
Segura, Mariangela Giordano, Pepa López, Alberto
Martínez, Carlos Subterfuge e Angie Barea.



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