VIVER E MORRER EM LOS ANGELES (1985)
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VIVER E MORRER EM LOS ANGELES (1985)



A primeira vez que vi VIVER E MORRER EM LOS ANGELES foi num dos muitos Corujões da Globo que encarei durante os anos 90 - aquela triste fase pré-baixação de filme, quando você precisava ficar acordado até as três da matina para gravar os filmes que gostava. Eu não lembro a quantidade de cortes que a emissora fez no filme (mas tenho certeza que algumas cenas não foram exibidas), e nem lembro como era a voz dos dubladores dos personagens principais. Tudo que lembro é que foi um daqueles casos raros de amor à primeira vista.

Por muito tempo, inclusive, eu considerei esta obra-prima do diretor William Friedkin (dispensa apresentações, não é?) o último filme policial realmente perfeito. Claro, isso foi antes de maravilhas como "Fogo Contra Fogo", do Michael Mann, mas lembro que demorou um bom tempo para surgir algum outro policial contemporâneo que me deixasse tão hipnotizado quanto VIVER E MORRER EM LOS ANGELES. E se você é um daqueles pobres mortais que ainda não viu o filme, obviamente sem saber o que está perdendo, convido-o a ir direto ao fim desta resenha e assistir ao trailer. Será amor à primeira vista também, eu garanto.


Como revi o filme recentemente, resolvi escrever aqui umas porcas linhas, sem nenhuma tentativa de esgotar o assunto ou de fazer justiça à qualidade dessa maravilha, mas apenas para motivar aqueles que não conhecem ou nunca viram, e também para deixar quem já viu com vontade de rever.

Após uma introdução absurda e tosca que até hoje estou tentando entender como é que Friedkin filmou e ainda deixou na edição (envolvendo a segurança do presidente e um terrorista que se explode com uma bomba, algo que parece saído de um filme ruim do Steven Seagal), a trama principal de VIVER E MORRER EM LOS ANGELES finalmente começa, sem perder muito tempo com bla-bla-bla ou apresentações desnecessárias dos personagens.

Sabemos apenas que Richard Chance (interpretado por William Petersen) é um agente do Serviço Secreto especializado em caçar falsificadores de dólares, e Rick Masters (Willem Dafoe, magnífico no papel) é um artista plástico que usa seus dotes justamente para falsificar grandes somas de verdinhas. Perceba que eu não identifiquei nenhum deles como "herói" ou "vilão"; mais tarde você entenderá o porquê.


Os caminhos de Chance e Master entram em rota de colisão quando o falsificador mata Jim Hart (Michael Greene), parceiro de longa data e único amigo do agente. O pobre defunto estava a apenas três dias da aposentadoria. Chance, é claro, prepara-se para a vingança e promete pegar Masters custe o que custar. Entretanto, seus superiores, para tentar mantê-lo na linha, designam um novo parceiro careta e certinho, John Vukovich (John Pankow), para acompanhá-lo no caso. O resto do filme mostra a dupla encarando tudo e todos para colocar as mãos no falsificador.

A idéia principal, na verdade, é bastante simples (a típica historinha de vingança e do policial obcecado caçando o vilão que não deixa provas). O que transforma VIVER E MORRER EM LOS ANGELES num daqueles clássicos únicos, que nunca envelhecem ou perdem o pique, é exatamente o desenvolvimento da narrativa. Após perceberem que nada conseguirão do "jeito tradicional", com suas tocaias e investigações dentro da lei, Chance e Vukovich vão cavando fundo a própria cova ao bolarem armações cada vez mais mirabolantes para tentar prender Masters.


Sabe no filme "Miami Vice", do Michael Mann, em que uma situação vai levando a outra, e a outra e a mais outra, e o que parecia simples lá no começo acaba se tornando um problema impossível de solucionar? Pois é mais ou menos assim o roteiro assinado por Friedkin e Gerald Petievich, que é apenas ligeiramente inspirado no livro deste último.

Acompanhe: Chance e Vukovich começam o filme prendendo Carl Cody (um jovem John Turturro), que é o "distribuidor" das notas falsas de Masters. Masters, por sua vez, tenta matar o "ex-funcionário" na prisão para que ele não dê com a língua nos dentes. O plano falha e Cody continua vivo. Chance vê aí uma chance de ouro para conseguir o testemunho contra Masters, liberta Cody para negociar um acordo, mas o bandido acaba fugindo, fazendo com que o policial volte ao ponto de partida!

Finalmente, sem mais recursos para usar contra o falsificador, Chance resolve negociar 30 mil dólares em notas falsas com o próprio Masters, para prendê-lo com a boca na botija. Mas seus superiores não liberam a grana. Assim, ele resolve esquecer que é policial e roubar um contrabandista de diamantes que está chegando à cidade, sem saber que o sujeito na verdade é um agente disfarçado do FBI! E assim a coisa vai se complicando mais e mais ao ponto de o espectador se perguntar onde tudo aquilo vai parar.


Por isso que o mais interessante de VIVER E MORRER EM LOS ANGELES é a caracterização do seu protagonista e do seu antagonista. Chance e Masters têm absolutamente tudo em comum, e, mesmo que isso tenha virado clichê em incontáveis policiais posteriores, poucas vezes a linha entre "polícia e ladrão" foi tão tênue.

Chance é aquele tipo de policial que gosta de viver perigosamente (inclusive pratica base jump, saltando de pontes altíssimas apenas com um cabo amarrado a uma das pernas), sabe que vai morrer antes de se aposentar e vive uma relação de (pouco) amor e (muito) ódio com sua informante, Ruth (Darlanne Fluegel, linda), a quem vive ameaçando colocar na cadeia, caso não obtenha as informações que precisa.


Masters, por outro lado, é um artista conceituado e ricaço que parece trabalhar com dinheiro falso apenas porque é proibido (compartilhando com Chance o amor pelo perigo), que vive queimando as próprias telas por não achá-las perfeitas o suficiente (como são perfeitas as suas falsificações, por exemplo), e tem um caso de amor moderninho (com pouquíssimo amor) com uma dançarina, Bianca (Debra Feuer, linda também), que costuma dividir na cama com uma outra garota.


Quando você percebe que ambos têm mais em comum do que deveriam, e que Chance está tão obcecado em pegar Masters que não medirá esforços (mesmo tendo que agir fora da lei), percebe também a beleza dúbia da história que Friedkin está contando: um filme onde o herói não é nada bonzinho e o vilão parece mais inteligente, mais "correto" e está sempre um passo a frente do seu perseguidor. O crítico norte-americano Roger Ebert descreveu isso de maneira perfeita: "Não é uma história sobre policiais e ladrões, mas sobre dois sistemas de fazer negócio, e como um deles precisa encontrar uma forma de mudar a si próprio para derrotar o outro".

Enfim, é um jogo de gato e rato incrível, como o cinema policial poucas vezes mostrou. E com uma reviravolta final tão surpreendente, inesperada e CORAJOSA que lembro de ter ficado boquiaberto quando "aquilo" aconteceu. É a cereja do bolo e o toque de mestre de Friedkin, uma reviravolta quase cortada pelos produtores furiosos (que ordenaram a filmagem de um absurdo "final feliz" para a trama), mas que felizmente ficou na montagem final. Sem ela, o filme perderia uns 80% do seu impacto.


Eu adoro boa parte dos filmes de William Friedkin (outros, como "A Árvore da Maldição" e "Jade", acho bem fraquinhos), e um dos aspectos mais positivos dos seus policiais é o realismo das tramas, situações e protagonistas. Em VIVER E MORRER EM LOS ANGELES não é diferente: Petersen e Pankow interpretam dois agentes à beira do colapso (por causa do estresse) de maneira bastante convincente. A fantástica trilha da banda Wang Chung ajuda a criar um clima pulsante e desesperador, como se o filme nunca parasse de martelar a cabeça do espectador.

Sempre achei uma grande injustiça o fato de Petersen (hoje no seriado "CSI") não ter se transformado num grande astro da sua geração, e sua interpretação neste filme é argumento mais do que suficiente para corroborar minha teoria (somado ao posterior Will Graham que ele interpretou em "Manhunter", de Michael Mann, outro "herói" bastante imperfeito). Mas Dafoe também está ótimo como um vilão ameaçador e que põe a mão na massa, ao invés de ficar em casa dando ordens pelo telefone, como é comum nesse tipo de história.


E apesar de ser mais lembrado por "O Exorcista", o fato é que Friedkin parece ter nascido para dirigir policiais. VIVER E MORRER EM LOS ANGELES não deve nada ao clássico "Operação França", que o diretor filmou nos anos 70.

Na verdade, tem uma cena de perseguição de automóveis que praticamente deixa na poeira aquela ótima seqüência em que Gene Hackman perseguia o metrô em "Operação França". Aqui, Chance e seu parceiro fogem de velozes perseguidores armados entrando na contramão numa auto-estrada - um cena tão perigosa, ainda mais por ter sido feita na era pré-CGI, que parece até uma completa loucura.



Ainda não está convencido a ver o filme? Então saiba que os 116 minutos de VIVER E MORRER EM LOS ANGELES foram cuidadosamente elaborados por um cineasta que é digno desse nome. Algumas cenas poderiam ser impressas e emolduradas como quadros, de tão lindas.

E o filme todo valeria apenas pelo belíssimo momento em que o personagem de Dafoe falsifica cédulas de 20 dólares. Toda a produção das notas falsas é mostrada DIDATICAMENTE pela câmera de Friedkin (ele teve como "consultor" um falsificador verdadeiro!), ao som frenético da trilha sonora. Um momento antológico e inesquecível, perfeito casamento de montagem e música, além de uma aula para quem realmente quiser falsificar cédulas. De tão boa, a cena merece figurar aqui no blog, e você pode vê-la na íntegra abaixo.

Como fazer 200 dólares por segundo


VIVER E MORRER EM LOS ANGELES ainda tem cenas bastante violentas de lutas corporais e tiroteios. O diretor parece ter fetiche por sangrentos balaços no rosto (aqui tem até tiro de espingarda na cabeça à queima-roupa!), mas pode esperar também por tiro no saco e uma pessoa sendo queimada viva, só para mostrar como, no mundo do crime, "os fracos não têm vez".


Bem, eu poderia ficar aqui até amanhã falando da maravilha que é este filme injustamente desprezado pela crítica (e pela maioria do público também), mas prefiro terminar por aqui, com medo de falar demais e acabar estragando algumas das muitas surpresas que Friedkin reserva ao espectador de primeira viagem.

Porém ressalto que este é talvez o penúltimo filme policial perfeito (ainda estou hipnotizado e não consigo lembrar com certeza, mas acho que o último foi mesmo o "Fogo Contra Fogo"), e com certeza um dos meus filmes favoritos de todos os tempos.

E como não gostar de uma obra em que um policial fala para uma mulher "O Tio Sam não liga para as suas despesas. Se quer pão, vá transar com o padeiro!", e o tal sujeito ainda deveria ser O HERÓI DO FILME??? Ah, bons tempos politicamente incorretos aqueles em que tínhamos personagens como Richard Chance...

Trailer de VIVER E MORRER EM LOS ANGELES


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To Live and To Die in L.A. (1985, EUA)
Direção: William Friedkin
Elenco: William Petersen, Willem Dafoe,
John Pankow, Debra Feuer, Darlanne
Fluegel e Dean Stockwell.



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