MISS MUERTE (1965)
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MISS MUERTE (1965)



Como vimos na resenha de "O Terrível Dr. Orloff", Jess Franco se tornou um diretor de filmes de horror por puro acidente, depois que o projeto "socialmente engajado" que ele ia começar a rodar foi proibido pelos censores espanhóis. Mesmo assim, ele saiu-se muito bem em sua estreia no gênero e acabou fazendo quatro filmes de terror entre 1961 (o ano de "Dr. Orloff") e 1965, o ano de uma pequena obra-prima chamada MISS MUERTE - o grande filme da fase clássica de Franco, aquela que começa com sua estreia no cinema, em 1959, e termina com "Necronomicon" em 1967.

Se fizermos uma analogia entre os três terrores anteriores de Jess ("O Terrível Dr. Orloff", "O Sádico Barão Von Klaus" e "El Secreto del Dr. Orloff") e os primeiros filmes de James Bond - já que as aventuras de 007 estavam sendo produzidas no mesmo período -, MISS MUERTE seria uma espécie de "007 Contra Goldfinger". Enquanto os primeiros apresentaram o repertório de personagens, vilões e truques do realizador, este novo, o "Goldfinger" do terror clássico de Franco, tornou tudo mais estilizado e divertido.


Por coincidência, como já havia acontecido com "O Terrível Dr. Oloff", MISS MUERTE foi um projeto criado no improviso por causa dos censores espanhóis - e por isso, mais uma vez, me vejo obrigado a agradecer à Censura!

À época, Franco estava prestes a filmar um roteiro chamado "Al Otro Lado del Espejo", escrito em parceria com um francês chamado Jean-Claude Carrière (que havia roteirizado "O Diário de uma Camareira", de Luis Buñuel, em 1964, e assinaria vários outros filmes dele nos anos seguintes). Esta co-produção francesa contaria a história de uma garota que, traumatizada pelo suicídio do pai, começa a matar todos os homens com quem se relaciona, motivada pelo fantasma do falecido.


O problema é que os cisudos censores espanhóis não gostaram da ideia de uma protagonista seduzindo e matando diversos homens, e sugeriram uma série de cortes e adaptações para liberar o projeto. Como essas mudanças acabariam com o filme, Franco preferiu adiar "Al Outro Lado del Espejo" (que acabaria filmando do seu jeito em 1973) para fazer outra coisa. Assim, MISS MUERTE, como "O Terrível Dr. Orloff", nasceu de uma frustração do diretor.

"MISS MUERTE não deveria existir", comentou Jess, numa entrevista de 1991. "A Censura estava pedindo mudanças nesse outro roteiro. Eles não me proibiram de filmá-lo, mas impuseram uma série de modificações. Aí eu me neguei a fazer o que queriam e disse a eles: 'Ao invés disso, vou fazer outro filme de horror. Tipo esses que vocês acham estúpidos, esses que vocês ficam rindo porque mostram castelos misteriosos e gatos pretos. Mas já que não me deixam mostrar nem um peito, então vou fazer outro desses!".


Mantendo a parceria com Jean-Claude Carrière (com quem depois escreveria também a aventura de espionagem "Cartes sur Table", de 1966), Jess resolveu fazer de MISS MUERTE uma espécie de prolongamento e/ou continuação dos temas, personagens e ideias que já tinha enfocado nos três filmes de horror anteriores.

Porque mesmo que essas suas outras obras tivessem diversas ideias à frente do seu tempo, elas ainda estavam muito presas a um conceito de passado, principalmente aqueles filmes de horror gótico que Franco cresceu assistindo. MISS MUERTE, por outro lado, moderniza esses elementos e inclui bem-vindos toques de ficção científica, surrealismo e arte moderna na mistura. O resultado é algo único.


A história começa em Holfen, uma cidadezinha dos alpes austríacos, onde o perigoso criminoso Franz Bergen (Guy Mairesse), conhecido como "O Estrangulador de Woodside", escapa de um presídio de segurança máxima na véspera de sua execução.

Numa das primeiras boas surpresas do roteiro, o assassino fugitivo ganha grande destaque nesta cena inicial, com ênfase na sua periculosidade, e tudo leva a crer que será o grande vilão da história. Mas ele logo deixa de ser uma ameaça para tornar-se a primeira vítima, antes mesmo dos créditos iniciais aparecerem! Tudo porque, em meio à fuga, Bergen busca refúgio no laboratório do misterioso Dr. Zimmer (Antonio Jiménez Escribano, que está em vários dos primeiros filmes de Franco).


Embora não seja exatamente malvado (no fundo é bem-intencionado, como todo cientista de filme de horror), Zimmer resolve usar o assassino como cobaia de uma experiência que pretende neutralizar o lado "malvado" da personalidade humana, através de agulhas enfiadas no cérebro (!!!) que emitem ondas de rádio ou coisa que o valha, e que são chamadas de "Raios-Z" pelo cientista.

A experiência funciona e o bandidão fica doce como um cordeirinho, embora transformado num escravo sem vontade própria - praticamente um autômato, que obedece cegamente as ordens do cientista que o "criou".


Feliz com os resultados, o Dr. Zimmer resolve apresentar seus estudos num Congresso de Neurologia que, por coincidência, está sendo realizado na mesma cidade, reunindo a nata dos médicos e pesquisadores desta área.

Só que seus colegas não recebem tais experiências com o mesmo entusiasmo: Zimmer é publicamente humilhado, chamado de charlatão e proibido de continuar as pesquisas. Com o choque, o cientista sofre um infarto fulminante e morre diante da junta médica; antes, porém, pede para que sua filha Irma (a argentina Mabel Karr), que também é médica, leve adiante as suas experiências "na surdina".


A partir daí, desenvolve-se uma história de vingança fora do comum: Irma decide simular a própria morte num acidente de carro (usando o cadáver de uma caroneira que ela mesma matou nos limites da cidade), e depois muda-se para o casarão da família em Hartog, na França, levando consigo o fiel escravo Bergen e a assistente Barbara (Lucía Prado), que foi igualmente lobotomizada pelos Raios-Z.

Na nova cidade, com um novo laboratório montado e pronto para o trabalho, Irma prepara sua vingança contra os três médicos que humilharam e provocaram a morte do seu pai: os doutores Vicas (Howard Vernon), Moroni (Marcelo Arroita-Jáuregui) e Kallman (Cris Huerta). Para chegar até eles e assassiná-los sem levantar suspeitas, a cientista utiliza uma sensual dançarina chamada Nadia (Estella Blain), que realiza um famoso número de dança chamado "Miss Morte" (daí o nome original do filme).


Nadia/Miss Muerte é atraída com a promessa de virar estrela em Hollywood e aprisionada por Irma. Depois de submetida ao mesmo processo com os Raios-Z, sua vontade é anulada e ela passa a obedecer as ordens da vilã - tornando-se, literalmente, a "Miss Morte" do seu número.

E como a dançarina usa longas unhas pontiagudas, que faziam parte da sua personagem no show, a cientista doida resolve adaptá-las para que se transformem em sua arma de vingança, envenenando-as com curare!


O problema é que a bela Nadia tinha um amante, o Dr. Philippe Fraser (Fernando Montés). Ele também é médico, também estava no Congresso em que o Dr. Zimmer morreu e, vejam só que coincidência, também teve um caso recente com Irma. Quando as duas mulheres de sua vida desaparecem ao mesmo tempo em que seus colegas médicos começam a morrer misteriosamente, Fraser desconfia que esses eventos possam estar conectados.

Ao mesmo tempo, uma dupla de policiais começa a investigar os acontecimentos. Eles são os inspetores Tanner e Green (abaixo), interpretados respectivamente pelo próprio Jess Franco e pelo músico francês Daniel J. White, responsável pela trilha sonora do filme, que se tornaria colaborador fiel do diretor pelas próximas três décadas!

Franco não só tem um papel de destaque como ainda funciona como alívio còmico, já que seu investigador passa o filme inteiro meio sonâmbulo: ele não consegue dormir porque sua esposa acabou de dar à luz a trigêmeos!


É curioso que os censores espanhóis que encrencaram com "Al Otro Lado del Espejo" tenham deixado MISS MUERTE passar batido, já que os temas dos filmes até que são bem parecidos. Se no roteiro recusado uma garota assombrada pelo suicídio do pai começa a seduzir e matar os homens com quem se relaciona, aqui temos Irma, a filha cientista assombrada pela morte do pai, usando uma dançarina sensual como arma de vingança para seduzir e matar os homens que julga responsáveis pelo ocorrido. Franco e Carrière mudaram as motivações, mas mantiveram a essência do roteiro recusado - e ninguém percebeu!


Mais do que uma simples história de vingança, MISS MUERTE é um incrível coquetel de referências à cultura pop, em que cada frame exala um clima de filmes B, histórias em quadrinhos ou livros de ficção barata ("pulp fiction"). Apesar de original, o roteiro não esconde sua inspiração no livro "A Noiva Estava de Preto", de Cornell Woolrich, sobre uma garota que se vinga dos homens que considera responsáveis pela morte do seu noivo.

O mesmo livro ganharia uma adaptação oficial e homônima para o cinema três anos depois (1968), dirigida por François Truffaut, e também foi uma das inspirações declaradas de Quentin Tarantino ao escrever "Kill Bill".


Cinéfilos de carteirinha, Jess e Carrière se divertiram muito ao encher o filme de citações e brincadeiras que podem até passar batidas na primeira assistida, como quando um certo "Bresson" telefona para o Dr. Zimmer para contar-lhe sobre a fuga de Bergen da cadeia. O telefonema é atendido por Irma, e, ao passar a mensagem para o pai, ela diz: "Un condamné à mort s'est échappé" (Um condenado à morte escapou). Trata-se de uma referência ao filme "Um Condenado à Morte Escapou" (no original, justamente "Un Condamné à Mort s'est Échappé"), que foi dirigido em 1956 por, adivinhem?, Robert Bresson!


MISS MUERTE também está repleto de citações aos três filmes de terror anteriores de Jess, naquele tipo de auto-referência que a molecada de hoje acha que foi o Tarantino quem inventou. Quando apresenta suas teorias no Congresso de Neurologia, por exemplo, o Dr. Zimmer diz que se inspirou no trabalho do desacreditado Dr. Orloff!

Estas mesmas teorias já haviam sido usadas por outro cientista, o Dr. Fisherman, em "El Secreto del Dr. Orloff". E Howard Vernon, que interpretou o Dr. Orloff em pessoa no filme original de 1961, reaparece aqui no papel de um outro médico - embora dessa vez, ironicamente, como vítima!


As experiências de controle do corpo e da mente para gerar "escravos zumbis" que seguem as ordens de cientistas malvados também já foram vistas antes nestes dois mesmos filmes (e voltariam a aparecer em outros posteriores, como "Cartes sur Table"). Já o fato de o assassino Franz Bergen ser transformado em escravo mudo e obediente de Zimmer e sua filha remetem diretamente a Morpho, o capanga do vilão em "O Terrível Dr. Orloff".

Além disso, a trama se passa em Hartog e Holfen, as duas cidades fictícias criadas por Jess para ambientar "O Terrível Dr. Orloff" (Hartog) e "O Sádico Barão Von Klaus" e "El Secreto del Dr. Orloff" (Holfen). E, caso você não tenha reparado, o policial que investiga os crimes em Hartog provavelmente é o mesmo Inspetor Tanner que foi interpretado por Conrado San Martín em "O Terrível Dr. Orloff", só que agora vivido pelo próprio Franco!


Até mesmo os nomes de duas das vítimas da Miss Muerte são reincidentes na obra do diretor: já existiam Kalmans em "Labios Rojos" (1960) e "O Sádico Barão Von Klaus", e Moronis em "Labios Rojos" e "La Morte Silba un Blues" (1962), além de, posteriormente, em vários outros filmes.

Novamente, também, Franco usou a piadinha do "baseado em livro de David Khune" (um dos seus pseudônimos) nos créditos iniciais, mas obviamente tal livro nunca existiu. E o detalhe de o policial interpretado por ele ter trigêmeos é visto como uma referência aos três filmes de horror que ele dirigiu entre 1961 e 1964, e que seriam os seus "filhos".


Embora ainda traga alguns elementos que remetem ao horror das antigas, tipo o velho castelo para onde Irma e sua trupe se mudam, ou o laboratório cheio de tubos de ensaio soltando fumaça, tudo em MISS MUERTE é modernoso e contemporâneo. Principalmente as aparelhagens usadas pelo Dr. Zimmer (depois herdada pela filha), que não passam de uma caricatura do que se imaginava em matéria de "alta tecnologia" na época.

Um belo exemplo é a máquina que imobiliza as cobaias com dois braços mecânicos, semelhantes a uma aranha gigante, ou ao Dr. Octopus dos gibis do Homem-Aranha. O próprio Jess criou o visual da geringonça, inspirado nas pinças dos caranguejos, e os braços mecânicos eram operados manualmente por pessoas que ficavam fora do frame, numa trucagem bem convincente.


MISS MUERTE foi o filme com maior orçamento que Jess dirigiu até então, o que é perceptível na qualidade (e principalmente na quantidade) dos cenários, nos efeitos melhorzinhos e na quantidade de personagens e de figurantes (nas cenas do congresso médico, por exemplo).

Apesar do título original em espanhol ser curto e eficiente, as cópias para o mercado externo foram rebatizadas como "O Diabólico Dr. Z" (ao lado, o belo pôster norte-americano), para seguir o estilo dos títulos estrangeiros dos outros filmes de terror do diretor, que sempre traziam o nome do grande vilão antecedido por um artigo tipo "Terrível", "Sádico" e, agora, "Diabólico".

O problema é que o "Dr. Z" (no caso, o Dr. Zimmer) mal aparece, e a verdadeira razão de ser da trama é exatamente a Miss Muerte (vai entender porque não usaram "A Diabólica Miss Muerte"!).

A trama criada por Franco e Carrière também presta tributo (mais uma vez) ao filme francês "Os Olhos Sem Rosto" (1960), de Georges Franju, que já havia inspirado "O Terrível Dr. Orloff" quatro anos antes. A exemplo do "horror cirúrgico" de Franju, aqui também há todo um repertório de imagens escabrosas que remetem a procedimentos médicos, como bisturis cortando pele (e o respectivo sangue saindo do ferimento) e agulhas sendo enfiadas no crânio e nas costas das vítimas, sem desviar a câmera ou dar um fade-in para poupar o público mais sensível - e ainda não acostumado a esse tipo de cena mais gráfica.


Porém logo fica claro que o foco do filme não é no segmento "cientista louco" prometido pelas cenas iniciais (e pelo título internacional), e sim na sensual vingadora representada por Nadia/Miss Muerte.

Ela é simplesmente uma das melhores personagens femininas já criadas por Jess Franco, e a maneira como o filme a apresenta é digna de figurar entre os grandes momentos da obra do diretor: o número de dança "moderna" envolve um cenário escuro, uma teia de aranha pintada no chão e a garota se oferecendo sensualmente para um manequim antes de "matá-lo" com suas unhas pontiagudas - depois, ela fará o mesmo com suas vítimas humanas!


Um autêntico fetiche ambulante, Nadia usa uma roupa colante da cor da pele, dando a impressão de que está sempre nua sem estar (para o horror dos temíveis censores espanhóis, que não podiam exigir o corte das suas cenas), e com o desenho de uma gigantesca aranha negra que começa na sua cintura (!!!) e se espalha pelo resto do corpo. Enfim, um visual incrível de vilã de história em quadrinhos, e que já nasceu clássico.

Nadia/Miss Muerte é interpretada pela curvelínea Estella Blain, que está fantástica no papel, representando Nadia como uma autêntica gata selvagem. Inclusive há uma cena que simboliza isso perfeitamente, quando Irma usa uma cadeira para "domá-la" como se fosse um animal selvagem no circo. Infelizmente, a carreira de Estella não deslanchou e teve um fim trágico: na virada do ano de 1981, nos primeiros minutos de 1º de janeiro de 1982, ela suicidou-se com um tiro na cabeça em uma praia francesa. Tinha 51 anos de idade.


Anda que inspirado diretamente nos outros filmes de horror do diretor, MISS MUERTE se tornaria uma referência bastante presente no que ele faria depois - e inclusive traz a primeira referência a lesbianismo (ainda que bem leve) de toda a sua filmografia.

Jess filmou uma nova versão da mesma história no posterior (e superior) "Ela Matou em Êxtase" (1970), eliminando os elementos de ficção científica e colocando Soledad Miranda como a viúva que seduz e mata os colegas do seu falecido marido médico, e que ela considera responsáveis pelo seu suicídio (inclusive Howard Vernon reaparece para tomar o troco pela segunda vez!).


Já a figura da dançarina exótica que é forçada a matar por influências externas reapareceria em vários outros filmes de Franco, como "Pesadelos Noturnos" (1970) e "Necronomicon" (1967).

Neste último, o número de dança apresentado por Janyne Reunald até reutiliza a mesma música do número da Miss Muerte aqui, que também inspirou a performance artística de Soledad Miranda com um manequim em "Vampyros Lesbos" (1970)!


Outro aspecto que se tornaria ainda mais forte nos trabalhos seguintes do diretor é o destaque para as mulheres, que aqui ganham todos os holofotes (e inclusive os dois principais créditos). Não só existe a vilã que é uma verdadeira "Dra. Orloff" (Irma, a cientista malvada), mas ainda a personagem-título, que usa o corpo como arma para matar homens bem mais fortes do que ela - numa das grandes representações do dueto sexo e morte, a partir daqui cada vez mais frequente na filmografia de Jess franco.

Todos os personagens masculinos são ou vítimas, ou figuras secundárias e desinteressantes - incluindo Fraser, o namorado de Nadia que é promovido a detetive por causa da burrice da polícia. No belíssimo final aberto, (SPOILERS) ele recebe um carinho da sua amada de unhas envenenadas, mas o filme termina subitamente, deixando a critério do espectador decidir se Miss Muerte realmente estava sendo carinhosa ou se apenas estava se preparando para arranhá-lo, somando mais uma vítima à sua lista de crimes! (FIM DOS SPOILERS)


Entre diversas curiosidades dos bastidores, a pequena participação não-creditada da atriz espanhola Ana Castor, como a caroneira que é morta por Irma no começo do filme, merece ser explicada: originalmente, Ana havia sido contratada justamente para o papel de Irma, a filha do Dr. Zimmer!

Porém, ao ler o roteiro e descobrir que teria que passar boa parte do filme com pesada maquiagem para simular o rosto deformado (porque a personagem sofre queimaduras na face quando simula a própria morte), a extremamente vaidosa atriz recusou o papel. Para se vingar, Franco colocou Mabel Karr no papel de Irma, e não só deu a Ana uma ponta sem crédito como ainda a "matou" violentamente nos 20 primeiros minutos do filme - e, a partir daqui, a carreira da coitada não foi muito mais longe.


A exemplo de "O Sádico Barão Von Klaus" e diversas outras obras do diretor que não circulam em versões completas, MISS MUERTE também tem uma cena hoje considerada perdida: a tortura do Dr. Moroni. Na versão existente, o médico aparece sendo morto (aparentemente) por gás venenoso no banco de trás de um táxi.

Só que a existência de stills e lobby cards (como este aí abaixo) que mostram Moroni amarrado e amordaçado numa cadeira, e com Miss Muerte se aproximando ameaçadoramente com um punhal na mão, levam a crer que a cena da sua morte seja mais longa, e que o médico tenha sido apenas adormecido pelo gás e então conduzido para uma sessão de tortura!

Pode até ser uma mera foto de divulgação, mas o fato de haver uma cena semelhante de tortura em "Ela Matou em Êxtase", a refilmagem disfarçada de MISS MUERTE, é outra evidência de que talvez exista mais uma cena perdida na filmografia de Jess Franco!


Independente de tal cena perdida, MISS MUERTE é, disparado, o grande trabalho da fase clássica de Franco - não apenas lindo visualmente, mas também muito mais sofisticado e moderno que os anteriores. O próprio diretor, que se referia a todos os seus trabalhos desta fase como "velharias", assumiu que é o seu filme preferido do período.

Visto hoje, ele se assume ainda mais como uma grande brincadeira de cinéfilo, uma história que se passa num universo alternativo e absurdo de cinema (ou quadrinhos, ou "pulp fiction"), com femmes fatales que matam usando longas unhas envenenadas, cientistas loucos que usam agulhas para controlar o cérebro humano e policiais bobalhões que não investigam nada.


Colaboram bastante para criar este clima a impecável direção de arte de Antonio Cortés (que já havia trabalhado no igualmente estiloso "O Sádico Barão Von Klaus") e a fotografia em preto-e-branco de Alejandro Ulloa, que só fez este filme com Jess Franco, mas deixou sua marca num dos filmes mais belos do espanhol.

MISS MUERTE é mais um daqueles trabalhos que mesmo os maiores críticos de Franco podem assistir sem medo, pois em nada lembram o que ele faria a partir dos anos 1970 - e, principalmente, das décadas de 80 em diante (sua fase mais "improvisada").

Também pode ser encarado como um "adeus" do diretor ao passado, ao clima antiquado dos seus três filmes de horror anteriores. É como se eles tivessem sido um treino para este aqui, já que tudo em MISS MUERTE parece renovado e melhorado, mais atual, futurista e original (incluindo aquelas ideias velhas que foram recicladas pelos roteiristas e ganharam uma nova roupagem).


Neste aspecto, o tão criticado diretor espanhol foi visionário, já que outros "fazedores de horror" demoraram mais alguns anos para trazer seus monstros para a modernidade.

Tipo a Hammer, que nos anos 70 colocaria Drácula em histórias contemporâneas e modernosas (como "Drácula no Mundo da Minissaia", de 1972), aposentando os velhos castelos e aquelas histórias que se passavam séculos atrás.

Ou mesmo o clássico "O Abominável Dr. Phibes" (1971), de Robert Fuest, em que Vincent Price também se vinga dos médicos que considera responsáveis pela morte da sua esposa, e com a ajuda de uma sensual ajudante chamada Vulnavia.

Jess Franco, mais uma vez, estava pensando à frente do seu tempo...


Trailer de MISS MUERTE



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Miss Muerte / The Diabolical Dr. Z
(Espanha/França, 1965)

Direção: Jess Franco
Elenco: Estella Blain, Mabel Karr, Fernando Montés,
Howard Vernon, Chris Huerta, Guy Mairesse, Lucía
Prado, Marcelo Arroita-Jáuregui e Jess Franco.



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