Uma chance para filmes boicotados - Final
Filmes Legais

Uma chance para filmes boicotados - Final



Depois de duas semanas de folga (voltando a São Paulo, colocando as coisas em dia...), retorno às atualizações do FILMES PARA DOIDOS e ao prometido último capítulo da minha saga de sangue, suor e lágrimas desenterrando filmes outrora boicotados por motivos diversos.

Nesta terceira e última leva, deixarei minhas impressões sobre filmes mais antigos que eu nunca tive coragem de ver antes, sobre um novo cujas críticas me assustaram, e também sobre dois popularíssimos filmes nacionais que, mea culpa, eu nunca tive interesse nenhum em assistir - pelo menos não na íntegra.

E reitero o convite para que os nobres visitantes que comentam nos posts deixem também as suas próprias listas de filmes boicotados. É sempre interessante saber quais são as obras que os outros se recusam a assistir pelos motivos mais diversos.

Continuemos...



Vamos começar chutando cachorro morto: TUBARÃO 4 - A VINGANÇA (Jaws 87 - The Revenge, 1987, EUA. Dir: Joseph Sargent) é tão ruim quanto eu sempre ouvi dizer/li que era, se não mais. E olha que eu gosto até do "Tubarão 3-D"! Percebe-se claramente que os produtores estão espremendo o bagaço de um produto já esgotado, e que não há a mínima história para contar, mas mesmo assim o filme e o roteiro têm um clima pomposo e egocêntrico de tragédia grega - percebe-se claramente que TODOS estão levando a coisa mais a sério do que deveriam. E talvez justamente por isso "Tubarão 4" seja no mínimo engraçado! É tanta pretensão, seriedade e bons atores (como Michael Caine) pagando mico em papéis atrozes que não tem como não rir da desgraça alheia!

O roteiro de Michael De Guzman (quem?) traz de volta boa parte dos personagens do original. Roy Scheider não quis reprisar o papel que fez nas partes 1 e 2, por isso o roteirista matou seu personagem, mas resgatou a esposa, agora viúva (Lorraine Gary), colocando-a no papel de protagonista, junto com seus filhos. Provavelmente sob efeito de drogas, De Guzman também meteu no balaio um tubarão inteligente (WTF???) que quer se vingar da família Brody por ter matado seus colegas tubarões nos outros filmes da série. Não é invenção: durante o filme inteiro, o tal tubarão pensante faz de tudo para atacar APENAS os integrantes da família, inclusive segue-os quando eles vão viajar!!!

Bem, se você conseguiu segurar o riso na parte do tubarão inteligente, certamente não vai conseguir fazê-lo em cenas como a do tubarão atacando um avião (acredite se quiser), ou naquela em que Michael Caine cai na água e em três segundos já aparece sequinho. Mais perdido que cego em tiroteio, o diretor-produtor Sargent ainda fez um milhão de mudanças no filme após fiasquentas exibições-teste, inclusive deixando vivo o personagem de Mario Van Peebles na cena final - embora vejamos claramente o tubarão abocanhando e mastigando o sujeito minutos antes, pois originalmente ele deveria morrer!!! Enfim, mais uma daquelas pérolas para ver bêbado ou chapado, e que em breve deve ganhar uma merecida resenha mais longa aqui no FILMES PARA DOIDOS (acredite, esse se encaixa perfeitamente na descrição!).



Outro boicotado com louvor era ZOOLANDER (idem, 2001, EUA. Dir: Ben Stiller). O roteiro desta sátira ao mundo da moda já anunciava uma daquelas comédias bem estúpidas, com "piadas" que parecem divertir apenas os atores e produtores, tipo os filmes recentes do Will Ferrell (alguém REALMENTE viu alguma graça em "Os Aloprados"?). Bem, tarde de chuva na praia, nada melhor passando na TV a cabo, resolvo dar uma chance ao besteirol do Stiller apenas para comprovar o que eu já previa: as risadas surgem mais pelo constrangimento de se estar vendo uma coisa tão estúpida do que pelas piadas serem realmente engraçadas.

Não vou ser injusto, há algumas tiradas até divertidas sobre a estupidez dos modelos - todos com Q.I. inferior ao dos "Debi & Lóide". Uma delas mostra Owen Wilson espatifando um computador cheio de arquivos confidenciais e depois questionando: "Ué, mas onde estão os arquivos?". Sim, este é o nível das piadas... O roteiro também não se decide entre o besteirol ou o humor negro, mas alguns dos melhores momentos se encaixam nesta segunda categoria, como quando descobrimos que modelos estúpidos vêm sendo usados em crimes políticos há séculos, inclusive no assassinato de Abraham Lincoln!

No fim, o que realmente acaba mantendo a atenção até o final é o batalhão interminável de celebridades em participações especiais: Donald Trump, Christian Slater, Cuba Gooding Jr., Natalie Portman, Lenny Kravitz, Gwen Stefani, Winona Rider, Paris Hilton, David Bowie, David Duchovny, Jon Voight, Milla Jovovich, Claudia Schiffer, Stephen Dorff, Billy Zane e outros que pipocam na tela por um segundo, estilo "piscou, perdeu", e que acabam se tornando a grande atração de uma comédia pouco inspirada (como acontecia em filmes tipo "Quem Não Corre, Voa", outro desfile de celebridades).



CONSPIRAÇÃO TEQUILA (Tequila Sunrise, 1988, EUA. Dir: Robert Towne) não estava exatamente na minha lista de boicotados; apenas nunca tive curiosidade de vê-lo antes. Aproveitando aquela já famosa promoção na videolocadora da minha cidade, coloquei-o na pilha de DVDs por curiosidade, só para constatar que não perdi nada não tendo visto o filme antes.

Policial bem feitinho, com história bem amarradinha, mas não passa disso. É curioso ver Mel Gibson e Kurt Russell ainda novinhos e lado a lado num mesmo filme, ainda mais considerando que Kurt depois cairia para o segundo escalão, enquanto Mel virou super-astro e diretor influente, Para melhorar a coisa, eles interpretam personagens que são amigos, mas estão em lados opostos da lei (um é policial, o outro traficante de drogas), tipo as histórias que o John Woo adora filmar.

Fora isso, não há absolutamente nada de novo na trama ou no filme, nada de muito emocionante, intrigante ou novo acontece, e a melhor coisa é uma cena de sexo, ousadinha até, entre Mel Gibson e uma jovem e linda Michelle Pfeiffer. O resto é pura rotina e você esquece no momento em que tira o DVD do aparelho. Em tempo: não existe nenhuma "Conspiração Tequila" na história: ocorre que "tequila sunrise" é o nome de um drink, e o tradutor nacional não achou título mais interessante lá atrás nos anos 80...



Foram tantos comentários metendo o pau nos supostos ufanismo e revanchismo de O REINO (The Kingdom, 2007, EUA/Alemanha. Dir: Peter Berg) que eu quase o mantive mais um tempinho na lista de boicote, temendo por um novo "Falcão Negro em Perigo" (eca!). Mas não é para tanto, a não ser que você seja uma daquelas pessoas sensíveis que vê propaganda patriótica por toda parte.

Não que o filme de Berg não tenha a sua cota de "personagens americanos durões que querem salvar o mundo custe o que custar". Porém, ao tratar de um grupo de agentes do FBI que vai ao Oriente Médio investigar um sangrento atentado terrorista, "O Reino" parece mais interessado em narrar uma história de vingança pelas próprias mãos, tendo o conflito no Iraque como pano de fundo, do que propriamente ser uma história ufanista e patriótica sobre a guerra e sobre americanos querendo salvar o mundo, como aquele filmeco do Ridley Scott.

E mesmo que o filme inteiro esteja envolto com um ar de "seriedade" e um visual lembrando documentários, eu consegui desligar o cérebro e apreciá-lo como uma daquelas aventuras de guerra violentas e desmioladas, tipo "Comando 10 de Navarone" ou "Selvagens Cães de Guerra", em que há mais compromisso com a ação do que com a realidade. Se o que você espera é vilões árabes, tiroteios barulhentos, explosões e muita violência, o filme funciona perfeitamente; mas se o que você quer é ver um novo "Apocalyse Now", fique longe!

Mas eu diria que é injusto rebaixá-lo a propaganda ufanista/patriótica, ainda mais considerando que o personagem mais interessante, heróico e simpático do filme é um oficial ÁRABE, e não os personagens centrais norte-americanos...



Por último, mas não menos importante, os dois clássicos do cinema nacional que eu boicotei desde sempre. O primeiro foi DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS (idem, 1976, Brasil. Dir: Bruno Barreto). Bem, o que dizer da maior bilheteria do cinema nacional de todos os tempos? Vou começar com uma única palavra: decepção.

Não, na verdade o filme até é bom, divertido e tudo mais. O problema é que nestes 30 anos de vida eu fui levado a acreditar que era bem diferente do que aquilo que na realidade se apresenta. Pelo título e pelas cenas famosas que eu conhecia, imaginei que o filme inteiro tratava da relação entre Dona Flor, seu novo marido e o primeiro esposo falecido, Vadinho, cujo fantasma aparece o tempo inteiro pelado. Afinal, não é disso que deveria se tratar uma obra chamada "Dona Flor e Seus Dois Maridos"?

Entendam, portanto, a minha decepção: o filme começa mostrando a morte de Vadinho, e depois temos uma hora (cronometrada) de flashback, mostrando a difícil relação de amor e ódio entre o falecido e Dona Flor. Aí vai mais meia hora de enrolação envolvendo o casamento da moça com seu novo marido, e quando você vê já passou 1h35min. Mas peraí, cadê o "Dona Flor e Seus Dois Maridos"?

Poisé, eis que nos últimos 25 minutos o fantasma peladão de Vadinho finalmente aparece para justificar o título. E quem, como eu, esperava que essa fosse a situação central do filme, provavelmente também vai ficar surpreso com o pouco tempo de desenvolvimento do episódio sobrenatural. Pouco tempo e pouca graça, inclusive. Seria melhor se tivessem limado uns 50 minutos da primeira parte, colocando o fantasma mais presente na trama, pois do jeito que está a situação dos "dois maridos" parece mais amostra grátis do que situação central.

No fim, Sônia Braga linda e peladona vale a olhada, bem como os cenários de cartão-postal e algumas poucas cenas engraçadas lá e cá. Mas é pouco, muito pouco, para o que eu esperava da "maior bilheteria do cinema nacional de todos os tempos". Resumindo: decepção total e título enganoso! Um daqueles que se deve assistir com expectativa zero para não quebrar a cara!



Já no caso de DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL (idem, 1963, Brasil. Dir: Glauber Rocha), o filme estava na minha lista de "Não vi, não gostei", como toda a obra de Glauber Rocha (o único que eu realmente vi do começo ao fim foi "Terra em Transe", que achei muito chato). É claro que eu conhecia algumas cenas mais famosas de "Deus e o Diabo...", e sabia do que se tratava o filme, mas sempre achei que era algo muito xarope para vê-lo por inteiro.

Mordi a língua: sim, é uma obra "difícil" e meio pretensiosa demais às vezes, MUITO silenciosa e reflexiva em outros momentos, mas um ótimo filme, certamente até acima do que eu esperava. Claro, é preciso fechar um olho para o excesso de alegorias, para o ritmo "introspectivo" e para as pretensões do Glauber (que eu continuo achando um chato de marca maior). Mas como ficar indiferente frente a cenas como a de Geraldo del Rey caminhando de joelhos e com uma pedra enorme na cabeça, enquanto "paga penitência" ao fanático religioso que segue obsessivamente?

E tem o saudoso Maurício do Valle em seu grande momento cinematográfico, o pistoleiro "matador de cangaceiros" Antônio das Mortes. E tem Othon Bastos excelente como Corisco, o único sobrevivente do bando de Lampião. E tem um punhado de cenas fortes e ao mesmo tempo lindas, fotografadas de maneira magistral.

Definitivamente, não é filme para todos os públicos, e nem era esta a sua proposta; definitivamente, também, é chato e pretensioso, mas não dá para negar que é um daqueles filmes obrigatórios, aos quais ninguém consegue ficar indiferente. Uma obra que não pode e nem deve ser definida nestas minhas poucas (e porcas) linhas, e que deve ser vista com os próprios olhos.

Ah, também tirei da lista de boicote (mais cedo do que eu esperava; culpa da minha mãe!) o tão comentado AVATAR, mas este vai ganhar seu post à parte. Adianto apenas que gostei do filme mais do que eu imaginava, mas que de "bom" não passa, e até agora estou tentando encontrar a "revolução do cinema" na interminável aventura dos Smurfs super-desenvolvidos...



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