Filmes Legais
Uma chance para filmes boicotados - Parte 2
Gostei do retorno que teve o primeiro post desta "trilogia": além de descobrir que outros leitores do
FILMES PARA DOIDOS concordam comigo e boicotaram os mesmos filmes (tipo "O Guarda-Costas"), também serviu como pontapé inicial para que os visitantes pudessem confessar quais são os seus próprios títulos boicotados. É bom saber que você não é o único que se recusa a ver algum filme por fatores bem especificos e pessoais. Por outro lado, sempre há tempo de dar uma chance para estas obras que foram jogadas para escanteio.
Nesta segunda parte, veremos mais algumas produções recentes cujo boicote é plenamente justificável (tenho certeza que todos vocês vão concordar comigo), e outras mais antigas que eu só não vi antes por pura preguiça e fui deixando de lado até agora. Algumas se revelaram decepcionantes, como era esperado.
A elas:
Tem gente que gosta da série "A Múmia", iniciada por Stephen Sommers em 1999, que traz o bobalhão Brendan Fraser lutando contra brochantes efeitos de computação gráfica. Eu vi o original e a primeira seqüência, "O Retorno da Múmia", e sinceramente achei ambos muito ruins - trazem tudo o que há de péssimo nas aventuras recentes, do excesso de CGI à falta de seriedade (e criatividade) nos roteiros. Por mim, inclusive, o terceiro filme da série,
A MÚMIA: TUMBA DO IMPERADOR DRAGÃO (The Mummy: Tomb of the Dragon Emperor, 2008, EUA/Alemanha. Dir: Rob Cohen) ficaria boicotado para sempre. Mas quando você está na praia em um dia de chuva, qualquer porcaria que passa na TV a cabo acaba ganhando a sua atenção.
Mea culpa.
Bem, digamos apenas que os dois filmes anteriores quase ficam bons perto da bobagem que é este terceiro. O vilão agora é a múmia de um imperador chinês interpretado por Jet Li, mas ainda não consegui descobrir qual é a vantagem de ter um ator famoso na folha de pagamento e usá-lo apenas durante 10 minutos (no restante do tempo, a múmia não passa de um boneco deformado feito por computador). E se seriedade nunca foi o forte da série, esta nova aventura trata o espectador por idiota completo: ressuscitar uma múmia é a coisa mais fácil de engolir do roteiro, que traz ainda um ataque de abomináveis homens das neves (!!!), a mítica cidade de Shangri-lá (!!!), guerreiras imortais (!!!) e uma múmia que se transforma, sem explicação, num dragão de três cabeças (!!!!!!!!!!!!!!!!!!).
Tudo acaba naquela tradicional grande batalha "épica" entre bonequinhos de CGI (os soldados de terracota do vilão contra um exército de esqueletos "bonzinhos"), praticamente uma cópia xerox do final de "O Retorno da Múmia". Não há uma única piada ou cena que preste, e é uma pena ver a competente Maria Bello totalmente perdida no lugar de Rachel Weisz, que (muito sabiamente) pulou fora dessa seqüência após ter pagado mico nos dois filmes anteriores. O pior é saber que filmes como este são o mais perto que Hollywood consegue chegar, hoje, das saudosas aventuras de Indiana Jones. Salve-se quem puder!
Outra bobagem indefensável é
O VIDENTE (Next, 2007, EUA. Dir: Lee Tamahori). Esse eu já imaginava que era uma bomba, pelas resenhas da época do seu lançamento. Só não podia prever que era
TÃO RUIM! Partindo de uma premissa curiosa (baseada em conto de Philip K. Dick), o filme traz Nicolas Cage como um homem capaz de prever o futuro - mas apenas dois minutos à frente. Ele não usa seu dom para proteger a humanidade, e sim para roubar uma graninha dos cassinos ao prever o resultado dos jogos. Mas a coisa muda de figura quando o vidente começa a ser caçado por terroristas e pelo FBI, por causa de uma bomba nuclear escondida em solo americano.
Embora traga algumas curiosas brincadeiras narrativas (como cenas inteiras que se revelam apenas premonições do herói, ou o momento em que ele se divide em vários "clones", representando suas muitas visões do futuro),
"O Vidente" falha nos aspectos mais simplórios da construção de suspense e não consegue nem ao menos criar personagens parecidos com pessoa reais: os terroristas, por exemplo, parecem ter saído de uma sátira estilo "Todo Mundo em Pânico", Julianne Moore está ridícula como "agente durona" do FBI, e a ingenuidade da personagem de Jessica Biel, que dá carona e dorme com um completo estranho, é absurda.
Para piorar, o roteiro se acovarda e transforma a maior parte da trama
NUMA VISÃO do protagonista. Aí não há saco que agüente, pois este é um dos truques mais revoltantes que um realizador pode utilizar para enganar o espectador (lembrou até minha frustração por "Femme Fatale", do Brian DePalma). E Lee Tamahori mostra ser um dos piores diretores em atividade hoje em Hollywood, anos-luz distante de seus primeiros filmes, como o ótimo "O Amor e a Fúria".
O INFORMANTE (The Insider, 1999, EUA. Dir: Michael Mann) é um daqueles casos atípicos na minha lista de boicote: eu só não tinha visto antes porque esqueci da sua existência. Mas antes tarde do que nunca, e como eu estou redescobrindo a filmografia de Mann (indiscutivelmente um dos melhores cineastas contemporâneos), chegou a hora de corrigir a injustiça.
E você sabe quando um diretor é bom quando ele consegue segurar a atenção do espectador contando uma história que, originalmente, não tem nada de surpreendente ou de tenso. O filme narra a luta do produtor do programa de TV "60 Minutos" (Al Pacino) para levar ao ar a entrevista com um executivo da indústria tabagista (Russel Crowe), contando que as empresas do ramo sabem que o cigarro faz mal à saúde, embora publicamente neguem. A alta cúpula da emissora acaba vetando a entrevista por interesses comerciais, e a vida do entrevistado sofre uma brutal reviravolta.
Tudo bem que as ameaças à vida do personagem de Russel Crowe não passam de "liberdade poética" para manter o espectador antenado, mas ainda assim Mann consegue a façanha de deixar qualquer um vidrado na tela apenas com o jogo de interesses nos bastidores. É uma trama difícil, sem heroísmos individuais ou finais felizes, mas transformada em um filmaço que faz questionar o papel da imprensa no mundo contemporâneo - sua exibição devia ser obrigatória em faculdades de comunicação. Eu só incluiria uma cena final mostrando o personagem de Pacino acendendo um cigarrinho após todos os problemas enfrentados. hehehe.
Se no capítulo anterior eu falei sobre minha
"Sessão Dupla John Woo", chegou a hora de contar como foi a
"Sessão Tripla Clint Eastwood", um outro diretor cuja obra eu estou aos poucos redescobrindo, principalmente após o excelente "Gran Torino". Vi de uma vez só três filmes recentes dirigidos e estrelados pelo veterano, e que antes não tinham me chamado a atenção. O primeiro foi justamente o mais fraco:
DÍVIDA DE SANGUE (Blood Work, 2002, EUA. Dir: Clint Eastwood) traz o ator como uma versão envelhecida de seu Dirty Harry, um veterano agente do FBI chamado Terry McCaleb, que caça um serial killer obcecado por ele.
Após ter um infarto enquanto persegue o maníaco, o herói decide se aposentar e passar por um transplante de coração. Mas logo recebe a visita da irmã da doadora do órgão, que lhe pede para investigar o assassinato da moça. Sentindo-se em dívida com a "dona" do coração, McCaleb sai em busca do responsável pelo homicídio e descobre que é o mesmo serial killer que falhou em prender anos antes. E ele continua deixando uma pilha de corpos para provocar o herói.
O roteiro de Brian Helgeland começa bem, mas logo descamba para todos os clichês de "filmes de serial killers", desde o herói que encontra pistas de crimes acontecidos muito tempo antes (e que a policia, claro, nunca viu) até a tonelada de trilhas falsas seguidas pelo detetive, e que só existem para maquiar a identidade mais do que óbvia do vilão. Vale ressaltar que o serial killer se expõe tanto ao longo do filme que é um verdadeiro milagre não ter sido preso nos 15 minutos iniciais - e a revelação da sua identidade é tão inverossímil que quase provoca risadas, assim como o fato de o código do matador ser decifrado... por uma criança! Em todo caso, vale pelo talento de Clint como ator e diretor.
PODER ABSOLUTO (Absolute Power, 1997, EUA. Dir: Clint Eastwood) é melhorzinho, mas também fica aquém do seu potencial. O ponto de partida é absurdo, porém intrigante: Clint é um ladrão veterano que, numa noite de "trabalho", testemunha um assassinato cometido pelo próprio presidente dos Estados Unidos (Gene Hackman) e por dois agentes do Serviço Secreto (um deles é Scott Glenn, que quase rouba o filme). Ele foge e é caçado por homens acima de qualquer suspeita, envolvendo-se num jogo de gato e rato com o detetive que investiga o crime, interpretado por Ed Harris.
Eis um caso de filme que valeria apenas pelos atores (e se ver Clint, Hackman, Scott Glenn e Ed Harris dividindo a cena não é suficiente, tem ainda E.G. Marshall e Laura Linney). É uma pena, portanto, que o roteiro de William Goldman não aproveite a premissa interessante de um herói fora-da-lei caçado por pessoas que estão totalmente acima da lei: as situações de conflito entre eles são mínimas, e a trama logo descamba para o tradicional
"vamos machucar a filha do protagonista para dar-lhe um motivo para se vingar".
A própria relação entre os personagens de Clint e Harris é menos desenvolvida do que poderia, e isso que o filme se estende por duas horas (podiam cortar um pouco da enrolação e do drama familiar envolvendo o ladrão e sua filha para criar mais situações de suspense). Mas é outro que vale só pelo astro, divertindo-se muito como um bandido boa-pinta e esperto, sempre um passo a frente dos seus perseguidores.
O melhor da
"Sessão Tripla" acabou sendo
CRIME VERDADEIRO (True Crime, 1999, EUA. Dir: Clint Eastwood). A trama também é meio absurda, mas funciona melhor que
"Poder Absoluto": Clint é Steve Everett, um repórter encrenqueiro e mulherengo que, de última hora, é escalado para cobrir a execução de um assassino na câmara de gás. Mas Everett teima em achar que o acusado é inocente, e passa os 127 minutos do longa em busca das pistas para livrá-lo da iminente pena de morte.
A corrida contra o tempo desta vez é muito bem aproveitada pelo astro e diretor, principalmente na cena em que seu personagem é obrigado a fazer um "passeio-relâmpago" com a filha pelo zoológico para poder continuar suas investigações. Tudo bem, é difícil de engolir o fato de o protagonista descobrir fatos e pistas anos depois do crime ter acontecido, sendo que o caso foi investigado exaustivamente pela polícia. Assim, é preciso fechar um olho para a lógica e torcer para que o herói encontre as provas da inocência do acusado a tempo de impedir a execução.
"Crime Verdadeiro" também fica acima da média por mostrar com detalhes, paralelamente à investigação de Everett, a rotina de preparação do condenado para a pena de morte, sem demonizar a figura do diretor do presídio ou dos guardas responsáveis pelo trabalho ingrato. E Clint, novamente, está muito divertido como repórter durão e comedor, que aparece seduzindo moças 40 anos mais jovens do que ele. Suas cenas com James Woods, que interpreta o editor do jornal, são antológicas. Em resumo: toda a tensão e suspense que faltaram aos outros dois está neste filme, altamente recomendado para fãs do ator-diretor.
Fechamos esta segunda parte da minha lista de boicote com uma decepção:
PECADOS DE GUERRA (Casualties of War, 1989, EUA. Dir: Brian DePalma), um dos trabalhos mais fracos e convencionais de um diretor cuja obra eu normalmente venero. Não vi o filme antes porque estava de saco cheio de histórias sobre a Guerra do Vietnã (já na época em que ele foi lançado havia uma overdose de filmes sobre este conflito). Mas vê-lo hoje parece ainda pior, já que ele envelheceu ainda mais.
A história, baseada em fatos reais, traz Michael J. Fox como um soldado certinho que testemunha o estupro e execução de uma jovem vietnamita pelo seu sargento (Sean Penn) e por homens do seu batalhão. Ele tenta de várias formas salvar a vida da moça, mas falha; passa, então, a ser perseguido pelos ex-colegas, que temem que ele revele o "segredo" e leve todos à corte marcial. Apesar da situação poder render um suspense tenso, a narrativa é convencional e desprovida de emoção.
A melhor cena acaba sendo a execução da jovem estuprada, filmada por DePalma com seu requinte habitual. Mas todo o resto parece um telefilme, com personagens exageradamente burros (interpretados por atores conhecidos como John C. Reilly, Ving Rhames e John Leguizamo), cenas de guerra nada empolgantes e uma resolução anti-climática - até a música de Ennio Morricone soa burocrática e nada memorável.
Na minha opinião, está entre os trabalhos mais fracos do diretor. E é irônico ver uma atuação afetada e exagerada de Sean Penn quando a gente sabe o excelente ator que ele se tornou depois. Veredicto: um pecado de DePalma, não da guerra.
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