VIVA DJANGO! (1968)
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VIVA DJANGO! (1968)



Todos os filmes não-oficiais com o personagem Django produzidos depois do sucesso da obra de Sergio Corbucci eram aventuras independentes, com pouca ou nenhuma relação direta com o original, embora sempre emprestando um elementozinho aqui, outro ali. Para todos os efeitos, a única sequência oficial de "Django" saiu apenas duas décadas depois, em 1987 ("Django, A Volta do Vingador"), contando inclusive com o retorno de Franco Nero no papel-titulo.

Só que bem antes dela houve um "Sotto-Django" que conseguiu se aproximar bem mais do universo do personagem. Trata-se de VIVA DJANGO!, de Ferdinando Baldi, que na Itália se chama "Preparati la Bara" ("Prepare o Caixão"). Motivos não faltam para que esta seja a mais fiel das sequências bastardas do clássico de Corbucci: o filme tem o mesmo produtor (Manolo Bolognini), o mesmo diretor de fotografia (Enzo Barboni) e até um dos roteiristas de "Django", Franco Rossetti (tornando-se, assim, o único a escrever uma outra aventura do personagem além da oficial).


Além disso, por contar uma história anterior aos acontecimentos mostrados em "Django", muitos críticos e espectadores consideram VIVA DJANGO! um "prequel" do original, mostrando como o protagonista transformou-se naquele pistoleiro solitário e sanguinário encarnado por Franco Nero em 1966.

Em minha resenha sobre "Django", eu até comentei que muitas informações eram jogadas apenas por alto e nunca devidamente explicadas, como o que aconteceu à esposa assassinada do herói, ou onde ele encontrou o caixão e a metralhadora que arrastava desde o início do filme. Pois bem: apesar de ser uma produção "não-oficial", VIVA DJANGO! se preocupa em tentar explicar tudo isso, mesmo que os fatos aqui apresentados não batam 100% com aqueles que vimos no filme de Corbucci (mais sobre isso a seguir).


Vale registrar que por muito pouco o próprio Franco Nero não voltou ao seu papel mais famoso, pois tinha assinado um contrato com o produtor Bolognini para estrelar três produções. A primeira, claro, foi "Django", que ninguém imaginava que seria um sucesso tão estrondoso; a segunda foi "Adeus, Texas" (1966), um outro western também dirigido por Ferdinando Baldi (e divertidíssimo).

A terceira obra do contrato seria VIVA DJANGO!, que o produtor concebeu exatamente como um retorno de Nero ao personagem. O problema é que o agora astro recebeu uma proposta irrecusável para trabalhar em Hollywood, estrelando o épico "Camelot" (1967), de Joshua Logan, no papel de Sir Lancelot (que ele roubou de astros como Terence Stamp e Alain Delon), ao lado de um elenco de peso que incluía Richard Harris, Vanessa Redgrave (futura esposa de Nero) e David Hemmings.


É claro que entre fazer mais um western spaghetti poeirento ou estrelar uma superprodução hollywoodiana, Nero não pensou duas vezes e quebrou o contrato com Bolognini - produtor e astro só voltariam a se encontrar num set de filmagem quase dez anos depois, em "Keoma" (1976), de Enzo G. Castellari.

Com a saída do astro quando o projeto já estava encaminhado, os realizadores resolveram tocar VIVA DJANGO! do mesmo jeito, só que encontrando um sósia de Nero para o papel de Django. A opção escolhida pode parecer meio esquisita para o espectador de hoje, mas caiu como uma luva: Bolognini contratou um ator de 29 anos chamado Mario Girotti, que ficaria conhecido pelo pseudônimo americanizado de Terence Hill.


Hoje o nome do ator está associado ao personagem Trinity e às inúmeras comédias e faroestes cômicos que ele estrelou ao lado do parceiro Bud Spencer. Mas é bom lembrar que, em 1968, Terence ainda não era Trinity: sua veia cômica só começou a ser mais explorada a partir de "Trinity é o Meu Nome" (1970), de Enzo Barboni, embora o ator já tivesse feito algumas poucas comédias (como "La Feldmarescialla", de Steno, em 1967; este filme seria rebatizado "Trinity Vai à Guerra" no Brasil por causa do sucesso do personagem POSTERIOR de Terence Hill).

Mario/Terence foi chamado porque era praticamente uma cópia xerox de Franco Nero (compare as fotos abaixo), e inclusive parecia uma versão mais jovem do ator, embora na vida real Nero fosse dois anos mais jovem. Tanto que quando o ator substituto aparece vestido com roupas pretas e disparando rajadas de metralhadora nos inimigos em VIVA DJANGO!, o espectador praticamente esquece que quem está ali é Terence Hill, e não Franco Nero.


O roteiro de Ferdinando Baldi e Franco Rossetti passa-se em data ignorada antes da Guerra Civil, portanto antes dos acontecimentos mostrados em "Django". O herói ainda não é um pistoleiro errante e silencioso: no começo do filme, encontramos o jovem Django sempre falante e sorridente, bem casado com a bela Lucy (Angela Minervini) e trabalhando como guarda-costas para um ambicioso político que pretende concorrer ao Senado, David Barry (o alemão Horst Frank, que é praticamente um clone de Klaus Kinski).

Certo dia, Django é designado para ajudar na escolta de uma carruagem que transporta uma fortuna em ouro para outra cidade, e aproveita para levar a esposa na viagem. Só que o carregamento cai numa emboscada armada pela quadrilha de Lucas (George Eastman), que mata todos para roubar o ouro. Somente Django sobrevive ao ataque e, depois de enterrar Lucy e providenciar uma sepultura falsa para ele próprio, foge e passa a viver como anônimo numa pequena cidade.


Cinco anos se passam e o herói agora trabalha como carrasco na tal cidadezinha, sendo o responsável por enforcar em praça pública os ricos fazendeiros e trabalhadores honestos que foram injustamente acusados de crimes pelo próprio Lucas, agora um dos homens mais importantes da região. Só que Django está pondo em prática um ousado plano de vingança: ao invés de executar os inocentes, ele apenas simula suas mortes e depois os recruta para um pequeno exército particular.

O carrasco pretende usar seus "mortos-vivos" para desferir um ataque direto contra o bando de Lucas. Não demora para as coisas se complicarem. Especialmente porque Django nem imagina que o superior de Lucas é o próprio Senador Barry, que usou o ouro roubado anos antes para se eleger, mas não pretende desistir das atividades ilícitas.


Embora possa até ser visto como uma pré-continuação de "Django", e assim seja considerado por muita gente, VIVA DJANGO! não respeita as informações básicas sobre o personagem introduzidas no filme de Corbucci, mesmo tendo um de seus roteiristas (Rossetti) no time. Por exemplo, em "Django" o personagem dizia que sua esposa tinha sido assassinada pelo Major Jackson (Eduardo Fajardo, vilão daquele filme) enquanto ele estava "muito longe", lutando na Guerra Civil.

Aqui, por outro lado, vemos a esposa de Django ser morta por Lucas a mando do Senador Barry, mas não quando o herói está "muito longe" na guerra; pelo contrário, o herói está bem ao lado da mulher no momento em que ela é morta! E se em "Django" o protagonista está em busca do Major Jackson justamente para vingar a esposa assassinada, aqui em VIVA DJANGO! o herói já exerce sua tão sonhada vingança ao eliminar tanto Lucas quanto o mandante do crime.


O pior é que, com um pouco mais de cuidado, o filme poderia realmente passar por uma pré-continuação. Por exemplo, se o personagem de Horst Frank fosse rebatizado "Jackson", e não morresse na conclusão, o espectador poderia assumir que ele é a versão jovem do vilão interpretado por Eduardo Fajardo no filme de Corbucci, e que, com a fuga dele, Django continuou sua busca por vingança durante anos e durante a própria Guerra Civil, quando o antigo político fez carreira no exército e virou major. Não é o que acontece, infelizmente.

Além disso, VIVA DJANGO! tem uma conclusão espetacular que cita "Django" diretamente: cercado pelo Senador Barry num velho cemitério, e em desvantagem numérica diante dos mais de 20 capangas do político, Django desenterra o caixão da sua própria sepultura, aquela que usou para simular a própria morte, e tira do seu interior uma metralhadora semelhante à usada por Franco Nero em "Django", e que usa para exterminar todos os seus rivais (unindo, assim, as duas cenas mais icônicas do filme de Corbucci: o massacre com a metralhadora e o duelo final no cemitério!).


Pena que tanto o diretor Baldi quanto o roteirista Rossetti foram muito manés na última imagem do seu filme: se tivessem concluído VIVA DJANGO! mostrando o herói indo embora arrastando seu caixão com a metralhadora dentro, teriam criado um belíssimo elo com o início do "Django" original!

Mas eu duvido que o espectador da época tivesse muita familiaridade com prequels, ou que realmente se importasse com o fato de os acontecimentos mostrados aqui não baterem com as informações apresentadas no clássico de Corbucci. Provavelmente a maioria assistiu VIVA DJANGO! sem sequer se lembrar destes detalhes sobre o personagem, motivo pelo qual os próprios realizadores nem se preocuparam tanto em ligar as histórias dos dois filmes, concentrando-se na ação.


E ação é o que não falta! O falecido Ferdinando Baldi (1917-2007) era um especialista no assunto, que infelizmente morreu sem o devido reconhecimento (um outro filmaço dele já resenhado aqui no FILMES PARA DOIDOS foi "Blindman", de 1971). VIVA DJANGO! pode até não ter uma contagem de cadáveres tão alta quanto o original, mas se considerarmos que o herói aqui ainda está em início de carreira, a soma de óbitos é bastante expressiva: Django mata mais de 40 rivais, a maior parte deles com sua metralhadora!

Terence Hill está anos-luz distante do palhaço que encarnaria posteriormente, a partir de Trinity, mas protagoniza um momento muito engraçado ao ser rendido por um dos inimigos, que lhe pede para entregar o revólver segurando pela coronha. Fingindo que vai realmente dar a arma para o rival, o herói faz um rápido malabarismo e gira a pistola, disparando-a virada, direto na cara do sujeito!


Além dos tiroteios de costume, há uma cena explosiva (literalmente) em que Django enfrenta toda a quadrilha de Lucas, e que termina num confronto com o próprio Lucas dentro de um saloon em chamas. Percebe-se claramente que são os próprios atores, e não dublês, se esgueirando pelo cenário em chamas e desviando-se por muito pouco de vigas incendiadas que quase caem sobre eles!

O duelo entre Django e Lucas tem um desfecho fantástico: o herói atira no lampião que o vilão segura, incendiando-o instantaneamente. O engraçado é que, neste momento, o ator George Eastman é visivelmente substituído por um dublê, que inclusive perde a peruca ao rolar pelo chão!


Quem viu "Django" diversas vezes certamente vai identificar inúmeras referências ao original. Por exemplo: ao ser aprisionado pelos homens de Lucas, o Django de Terence Hill também tem suas mãos feridas (elas são pisoteadas pelos bandidos), embora não esmagadas tão violentamete quanto as de Franco Nero no filme de Corbucci.

VIVA DJANGO! também tem uma reviravolta um tanto forçada, quando um dos homens salvos da forca por Django, Garcia (José Torres), consegue convencer o exército secreto do herói a roubar um carregamento de ouro que também é visado pelos ladrões. Depois, o mexicano trai os colegas e os mata todos, fugindo sozinho com a fortuna e sendo caçado pelo próprio Django.


Embora seja algo que me incomode sempre que revejo o filme (pois os esforços do herói em criar um exército com condenados salvos da forca acabou resultando em... nada!), podemos interpretar esta cena como uma prévia desilusão de Django com mexicanos, o que de certa forma justificaria porque, no filme de Corbucci, o herói convence a quadrilha de mexicanos a roubar o ouro de um forte apenas para depois traí-los e roubar a fortuna (é o tal do "toma lá, dá cá"!).

A propósito, o filme também traz alguns toques "Leonianos", como a colorida vinheta animada nos créditos iniciais. Nesse caso, convém assistir a versão italiana, já que a bela sequência de créditos foi mutilada na edição norte-americana (justamente a lançada no Brasil em DVD pela Ocean), para a inclusão dos novos créditos em inglês.


Falar em bela trilha sonora num western spaghetti é redundante, mas não posso deixar de citar as duas músicas mais famosas do filme: a bela canção "You'd Better Smile", na voz de Nicola Di Bari, que toca durante os créditos iniciais, e o melancólico tema instrumental "Last Man Standing" aka "Nel Cimitero di Tucson", composto pelos irmãos Gian Piero e Gianfranco Reverberi.

Este último, que é repetido umas 15 vezes ao longo do filme (mas é tão lindo que nunca incomoda), é um dos temas mais conhecidos do gênero, e ficou ainda mais famoso ao ser sampleado pela dupla norte-americana Gnarls Barkley no hit "Crazy", em 2006. Compare as versões originais e sampleada nas janelinhas abaixo:


O original "Nel Cimitero di Tucson"



A versão sampleada, "Crazy"



Nas minhas resenhas anteriores sobre "Django Não Espera... Mata" e "10.000 Dólares para Django", eu lamentei o fato de os atores Ivan Rassimov e Gianni Garko só terem interpretado o personagem uma única vez. Porém quem REALMENTE parece ter sido talhado para personificar Django em uma longa série de filmes é Terence Hill; não só pela sua semelhança física com Franco Nero, mas principalmente porque ele não tenta inventar moda e nem moldar o personagem à sua maneira - o que vemos no filme não é Terence Hill interpretando Django, mas sim Terence Hill interpretando Franco Nero interpretando Django!

Claro que, hoje, fica difícil saber os motivos para o ator não ter sido oficializado como "o novo Django". Deve ter pesado o fato de Terence estar sendo disputado por outros diretores, como Giuseppe Colizzi ("Boot Hill") e Enzo Barboni, para interpretar seus próprios personagens, incluindo o famoso Trinity ("Trinità", no original). Uma pena, porque o ator foi, disparado, o melhor Django depois de Franco Nero, e o único que é realmente parecido com o original.


Considerando que todos os filmes com "Django" no título produzidos depois de 1966 eram ou picaretagens ou aventuras independentes, VIVA DJANGO! tem o grande mérito de ser a única aventura a manter relações bem próximas com o original de Corbucci - além de trazer o "Sub-Django" mais parecido com Franco Nero, não só visualmente, mas também no modus operandi e no uso da metralhadora. É até irônico que esta aventura não-oficial seja muito mais fiel que a continuação oficial de "Django", aquela produzida em 1987!

Portanto, VIVA DJANGO! é simplesmente obrigatório para todos os fãs do personagem e do filme de Corbucci. É uma pena que os realizadores não tenham observado alguns detalhes básicos para poder vendê-lo como prequel oficial do clássico, embora ainda seja possível vê-lo dessa maneira com alguma boa vontade.

E, sinceramente, quem apostaria que o palhaço Terence Hill, lembrado até hoje pelos seus faroestes bem-humorados e comédias-pastelão, acabaria sendo o segundo melhor Django da história do western spaghetti?


Trailer de VIVA DJANGO!



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Preparati la Bara (1968, Itália)
Direção: Ferdinando Baldi
Elenco: Terence Hill, Horst Frank, George Eastman,
José Torres, Pinuccio Ardia, Guido Lollobrigida, Barbara
Simon, Luciano Rossi e Spartaco Conversi.



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